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Valdir Antônio Webber e os discos que embalaram sua mocidade: Cascavel recém-nascida | Christian Rizzi/Gazeta do Povo
Valdir Antônio Webber e os discos que embalaram sua mocidade: Cascavel recém-nascida| Foto: Christian Rizzi/Gazeta do Povo

Memórias

Eduviges, entre roupas engomadas e jagunços

A catarinense Eduviges Nojekovski Nhepes desbravou Cascavel de um jeito próprio. Ao longo de seus 82 anos, a veterana assumiu vários papéis. Foi mãe, agricultora, auxiliar de limpeza, lavadeira, vendedora de enxoval e empresária. Pelas mãos dela passaram a enxada usada na roça, a vassoura no escritório e as roupas engomadas de juízes lavadas nas minas próximas ao Lago Municipal. "Eu lavava 30 dúzias de roupa por dia, roupa de cama, mesa, dos juízes e promotores", lembra.

Eduviges chegou em Cascavel em 1949 e de cara comprou dois ‘lotinhos’ do estado. Como a família não tinha dinheiro para construir, ela e o marido, ajudante de pedreiro na época, conseguiram um empréstimo generoso de um amigo.

Dos episódios da época da fundação da cidade, lembra da presença dos jagunços, motivada pela disputa de terras entre colonos e grileiros que culminou com a Revolta dos Colonos nas regiões Oeste e Sudoeste, em 1957. Na época o marido tinha uma "bodeguinha". Ela e o marido criavam porco, faziam chorizo e linguiça, enquanto os grileiros circulavam pelo lugar e frequentavam o bar. "Os grileiros comiam, bebiam e tomavam uma pinguinha. E diziam. Vocês querem receber em dinheiro ou bala? E meu velho falava. Não custa nada", conta.

Nas andanças pela mata, Eduviges encontrou de tudo. Foi obrigada a enfrentar uma cobra cascavel e um certo dia achou um carretel de fuzil. "Era tiro por todo lado de tanta bala perdida", diz.

A pioneira mora em uma casa da madeira, uma das poucas que restaram na área central da cidade. E se orgulha de Cascavel. " A gente sofreu, mas graças a um bom Deus venci e criei os filhos sem pedir esmola".

  • A pioneira em sua casa: desde sua chegada Eduviges Nhepes viveu tantas fases quanto Cascavel

O advogado Valdir Antônio Webber chegou em Cascavel ainda menino, aos 13 anos. Era 1952, um ano após o município ter sido emancipado. Comunicativo e descontraído, Webber logo se enturmou e conseguiu emprego. Foi trabalhar como sonoplasta no primeiro veículo de comunicação de massa de Cascavel, como ele mesmo intitula: um serviço de alto-falante.

VÍDEO: Assista ao vídeo com depoimento dos pioneiros de Cascavel

Apelidado de ‘cornetões’, os alto-falantes funcionavam entre o entardecer e as 22 horas, na Praça Getúlio Vargas, e eram a principal diversão e passatempo do povoado, no qual não havia nem sinal de energia elétrica. Notícias do Repórter Esso – captadas por um rádio de ondas curtas – comerciais, anúncios de aniversário e música, muita música, animavam o então povoado de Cascavel. As canções Meu Primeiro Amor e Índia, da dupla Cascatinha e Inhana, eram as mais tocadas. "Na época eu colocava a bolacha preta (o disco de vinil) para rodar", lembra Webber.

O serviço tinha a função de entreter e divertir moradores e trabalhadores envolvidos no projeto da Comissão de Estradas de Rodagem 1 (CER-1), responsável pela implantação da rodovia BR-35. Batizada de "Estratégica", mais tarde a via passou a ser conhecida como BR-277, a primeira ligação rodoviária entre o Oeste do estado e Curitiba. O traçado da rodovia cortava o então vilarejo de Cascavel.

Após a saga nos cornetões, Webber foi trabalhar em um banco cooperativo. Passou por todos os departamentos. Com o tempo, o estabelecimento foi liquidado e ele perdeu o emprego. Mas isso não foi problema na vida do pioneiro que chegou a Cascavel com a ânsia de continuar os estudos iniciados na cidade catarinense de Videira. "O caipirinha colocou as trouxinhas nas costas e se mandou para a capital", recorda. Webber morou por 12 anos, de onde voltou com o diploma de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e onde conheceu a mulher da sua vida.

Ao voltar à cidade, atuou como advogado, foi assessor jurídico da prefeitura e agente da Previdência Social. Hoje, aos 73 anos, Valdir lembra como se fosse ontem os principais ciclos de Cascavel. Da época da erva-mate, recorda o embarque de fardos que saíam da cidade aos portos brasileiros, em direção à Argentina e à Europa. Também faz menção aos operários da erva-mate – brasileiros, argentinos e paraguaios – submetidos ao que define como ‘trabalho escravo’. "O sujeito trabalhava, trabalhava e sempre ficava devendo para a firma".

Já no ciclo da madeira, Webber conheceu as primeiras duas serrarias de Cascavel. Pertenciam ao então governador Moisés Lupion. As madeiras, de primeiríssima qualidade, saíam de Cascavel para o mundo. "Devemos ter móveis e artefatos de madeira do pinheiro de Cascavel entre os italianos, suíços".

Quando acabou o ciclo da madeira, anunciava-se o fim de Cascavel, conta o pioneiro. O pavor tomou conta do município, até que a soja apareceu para trazer de volta a esperança da população. "Quando Cascavel parecia que ia acabar porque não tinha mais madeira, aconteceu o boom da soja. A soja foi efetivamente a salvação da lavoura".

Os pioneiros e as "máquinas devoradoras de matas"

O quintal da casa do empresário Dércio Galafassi, 77 anos, na área central de Cascavel, é o retrato da cidade na época da colonização. Pinheiro de araucária, cedro e canafístulas dão o tom do povoado cascavelense na década de 1950. "Eu até deixei uns carreiros para simbolizar que quando os desbravadores chegaram eles precisavam percorrer picadas para chegar onde queriam", conta.

A madeira era o ‘ouro’ de Cascavel na colonização. A cidade chegou a ter mais de 150 serrarias e fornecia toras para o Brasil e o mundo. Tudo era aproveitado, porém, aos poucos, a floresta passou a ser dizimada pela ação das máquinas devoradoras da mata, lembra Galafassi. "A gauchada e os catarinenses chegaram com as máquinas devoradoras de mata".

O ciclo da madeira marcou a vida de Galafassi. Gaúcho de São Francisco de Paula, ele é filho do pioneiro Florêncio Galafassi, que foi diretor da Industrial Madereira, empresa referência na exploração e exportação de madeira na região.

O pai de Galafassi chegou em Cascavel em 1948 de uma forma inusitada. Ele aterrissou de avião onde hoje é a Avenida Brasil. Depois daquele episódio, não largou mais a cidade e trouxe a família inteira.

Dércio pisou em Cascavel em 1950, quando tinha 15 anos. O pai foi buscá-lo de jipe no aeroporto de Foz do Iguaçu. A BR-277 ainda não existia e o percurso foi feito via picada Benjamin, conhecida como Rota de Guarapuava, conta o pioneiro.

A estrada, a única via de acesso a Cascavel, margeava o Parque Nacional do Iguaçu. "Quando chegamos eu fiz a última pergunta para meu pai. Falta muito para chegar em Cascavel? Ele disse ‘aquilo lá é Cascavel’. Mas não se via nada, era só pó", lembra.

Ao longo da história de Cascavel, Galafassi foi meio campo da equipe do Tuiti e vereador . Na atual residência, exibe uma biblioteca com jornais antigos, livros e a máquina Remington comprada com um financiamento feito do Banco Agrícola do Vale do Piquiri.

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Vida e Cidadania | 3:07

O advogado Valdir Antônio Webber era sonoplasta da principal atração de Cascavel no início da década de 50, os alto-falantes. Conhecidos como "cornetões", funcionavam entre o entardecer e às 22 horas, na Praça Getúlio Vargas.

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