Apesar das aparentes vantagens de esconder a fiação sob a via, ninguém quer pagar a conta.| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

A Companhia Paranaense de Energia (Copel) e empresas de telefonia e tevê por assinatura agora têm prazo de até seis anos para substituir suas redes aéreas de cabos e fios por instalações subterrâneas na Zona Central de Curitiba. Sancionada em janeiro pelo Executivo, a Lei 14.593/15 deve entrar em vigor em meados de abril. No entanto, a medida ainda encontra resistência entre empresários.

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Outras cidades

Além de Curitiba, cidades como São Paulo, Rio, Belo Horizonte e Fortaleza aprovaram leis que obrigam o enterramento de fios. Em São Paulo, a lei tem dez anos, mas somente no mês passado ela foi regulamentada. A concessionária AES Eletropaulo defende o enterramento, mas lembra que o custo é um entrave. Pesquisa feita em 2012 pelo Datafolha revelou que 66% dos entrevistados preferem não ter o serviço de enterramento caso ele gere custo adicional.

Apesar de reconhecer as vantagens do sistema subterrâneo – em comparação à rede aérea em vias de fluxo intenso e exposta a árvores, vento e chuva –, as companhias consideram alto o custo para substituir um sistema pelo outro. A construção de uma rede subterrânea é 10 vezes mais cara que uma rede aérea equivalente.

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Município não tem como dividir custos, alega secretário

Para o secretário de Governo de Curitiba, Ricardo Mac Donald Ghisi, a lei “é razoável” e o município não tem como dividir o custo das obras. “Não temos condições de arcar com as despesas. Nenhum município tem”, afirmou ao ser questionado sobre o projeto de lei proposto pelo Fórum de Cabeamento Subterrâneo, em que a cidade assume ao menos 30% da despesa.

Contudo, o secretário admite levar em consideração o custo/benefício da obra. “Se em determinado ponto o Executivo achar que fica muito caro para uma densidade baixa de pedestres e de automóveis, por exemplo, então haverá um laudo técnico contrário. Não adianta a gente querer ‘afundar tudo’ com uma lei. Mas é preciso começar o processo. Uma rua sem fiação, com arborização, é outra vida.”

O secretário alega ainda que, desde 2013, a atual gestão tenta organizar a confusão de fios e cabos nas ruas de Curitiba.

Sem a divisão desses custos entre poder público e setor privado, o coordenador do Fórum de Cabeamento Subterrâneo e Redes Compactas, Helio Bampi, acredita que a lei seja “inexequível”. “Nos causou surpresa [a sanção da lei] neste formato. Havíamos alertado que o custo era inviável para as empresas, que era preciso diluir os investimentos entre todos. Vamos fazer uma carta de apelo ao prefeito para que a lei seja revogada.”

Encabeçado pela Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep) e com participação da Copel e de empresários do setor de telefonia, o Fórum se debruçou sobre o tema ao longo do ano passado, provocado pela apresentação de um projeto de lei estadual protocolado na Assembleia Legislativa. A matéria, porém, não vingou. “A proposta que surgiu lá era enterrar os fios em todas as cidades do estado com mais de 100 mil habitantes. Achamos inviável. Mas concluímos que havia necessidade de construir uma regra federal”, explica Bampi.

Paisagem

Professor do mestrado de Gestão Urbana da PUCPR, Clovis Ultramari diz que o cabeamento subterrâneo faz parte de uma longa lista de coisas importantes para o ambiente urbano que nunca foram implementadas. “Há agora uma necessidade e uma possibilidade de se avançar em relação àquilo que antes se considerava supérfluo, e que na realidade nunca foi. A melhoria da paisagem, com o enterramento de cabos, é um bom exemplo.”

Um projeto de lei costurado pelo Fórum chegou ao Congresso Nacional em 2014, protocolado pelo então deputado Reinhold Stephanes (PSD-PR). O texto foi apensado a outro projeto mais antigo, e com conteúdo semelhante, do deputado Eduardo da Fonte (PP-PE). Não há previsão de quando o assunto entrará na pauta. Outros três textos sobre o tema tramitam na Casa.

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Plano Diretor

Um trecho da proposta de reforma do Plano Diretor de Curitiba é dedicado ao cabeamento subterrâneo. Entre as diretrizes para uso do espaço público, o texto prevê “elaborar um Plano de Zoneamento Subterrâneo, de modo a mapear, ordenar, classificar e disciplinar a infraestrutura de serviços” e “pactuar junto às concessionárias [...] programas contemplando prazos e condições para a substituição gradual das redes de distribuição aérea pelo sistema subterrâneo”.

O mesmo projeto de lei desenhado pelo Fórum foi sugerido pela Copel à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), quando o órgão realizou uma consulta pública sobre o tema. A Copel informou apenas que “está analisando os termos da lei municipal conforme as diretrizes regulatórias impostas pela Aneel.”

Operadoras

Aneel não quer impacto na tarifa

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) destaca que somente investimentos “prudentes” podem ser considerados nos processos de revisão tarifária. “A adoção extensiva de sistemas subterrâneos pode onerar de forma significativa as tarifas cobradas dos consumidores indo de encontro ao conceito de modicidade tarifária”, informou a agência em nota. Neste caso, diz a Aneel, a Copel deve atender a legislação municipal “desde que haja viabilidade técnica e o município arque com os custos associados.”

Pressionada pelo surgimento de leis municipais nos últimos 10 anos, a Aneel promoveu uma consulta pública sobre cabeamento subterrâneo entre novembro de 2014 e janeiro de 2015. Durante a consulta, a agência recebeu 16 contribuições, incluindo a da Copel, que defende o projeto de lei do Fórum de Cabeamento Subterrâneo.

Agora, a Aneel prepara uma audiência pública sobre o tema para o segundo semestre. O objetivo é preparar uma proposta federal para facilitar a adoção das redes subterrâneas pelos municípios.

Sobre a lei municipal, a Telefônica Vivo informou que “já analisa as mudanças para adequação da infraestrutura à nova lei de Curitiba”. A Oi sugeriu que a reportagem procurasse o Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal. Este, porém, não quis se manifestar. A Claro e a Embratel só informaram que cumprem as leis municipais nos locais onde atuam. A TIM informou que, na região central, “sua infraestrutura de cabeamento já é subterrânea, denotando alinhamento à nova lei”. A GVT diz que “os custos de implantação ainda não estão totalmente definidos”, mas que trabalhará para atender as normas. Já a Net informou que “está avaliando o que a nova lei determina e seus impactos”.

“Tem anos que a gente discute isso”, reclama vereador

Autor da lei curitibana, o vereador Pedro Paulo (PT) reclama da resistência do empresariado. “Faz anos que a gente discute enterramento de fios. Se não houver cobrança, as empresas não farão o serviço. É uma lei para induzir o investimento”, afirma o parlamentar.

Para ele, o alto investimento na construção do sistema subterrâneo compensaria a médio e longo prazo, com a redução dos gastos com manutenção. “Quanto a Copel gasta hoje para consertar uma fiação caída? E quando um poste é derrubado? Ela está o tempo todo consertando coisas. O custo maior da rede subterrânea é inicial, mas a manutenção depois tem um valor insignificante”, argumenta.

O petista também enfatiza a necessidade de regulamentação, já que a instalação das redes subterrâneas deve partir de uma operação conjunta: “Imagina se cada operadora for fazer seu próprio buraco? O Município tem que definir ainda de que forma as obras serão feitas”.

De acordo com a lei municipal, já está definida a competência do Município para produzir os laudos técnicos sobre o subsolo, que pode apresentar restrições arqueológicas, por exemplo. Também cabe ao Município fazer um projeto de revitalização das calçadas.

Receita

Um possível “aluguel” para uso do subsolo não é tratado na lei. Hoje, operadoras de telecomunicações pagam à Copel pelo uso dos postes. A companhia paranaense apenas compartilha sua infraestrutura com as empresas, mas são elas as responsáveis pela instalação e manutenção dos seus cabos. Segundo a Copel, hoje existem 239 contratos de compartilhamento de postes com empresas de telecomunicações em todo Paraná. Somente na rede de distribuição de Curitiba, são 150 mil postes.

Questionada sobre a fonte de receita, a Copel informou que o custo médio por poste fica entre 3 e 4 reais. “No entanto, é importante esclarecer que a regulação do setor elétrico determina que 90% da receita com compartilhamento seja revertida em prol da redução das tarifas por ocasião dos reajustes tarifários”, informou a companhia paranaense.

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Rede central foi feita nos anos 70 e 80

Uma rede subterrânea de energia elétrica já está instalada no “miolo” da região central de Curitiba. A Copel lembra que um grande programa de enterramento de redes teve início na década de 1970, sendo concluída nos anos 1980.

Essa região abrange uma área aproximada de 1 km² entre as ruas Augusto Stellfeld, Visconde de Nacar, André de Barros e João Negrão. Mais recentemente, também foram enterrados fios nas ruas Barão do Serro Azul e Comendador Araújo.

Estrangulada

Professor e consultor técnico do Sindicato das Empresas de Eletricidade, Gás, Água, Obras e Serviços do Estado do Paraná (Sineltepar), Celso Tsukamoto diz que a rede central no subsolo na região central de Curitiba está “estrangulada”.

“A capacidade dos cabos subterrâneos já está esgotada ali. Quando foi construído o Shopping Itália, em cima da rede subterrânea, precisou fazer uma obra enorme para aumentar o sistema, porque era um novo grande consumidor”, avalia.

Para Tsukamoto, apesar da manutenção barata de um sistema subterrâneo, qualquer necessidade de expansão de redes no subsolo será sempre um alto investimento. “Ela exige uma manutenção menor sim, mas, em termos de ampliação, é mais complicado”, reforça.

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