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| Foto: Jonathan Campos/ Gazeta do Povo

CORRUPÇÃO

O projeto de lei que regulamenta a situação das ONGs e dos governos tem a proposta de tentar evitar uma série de situações envolvendo entidades privadas e órgãos públicos. Em 2011, três ministros do governo Dilma Rousseff caíram por causa de escândalos envolvendo organizações não-governamentais. Relembre esses casos:

• Orlando Silva

O então ministro dos Esportes foi afastado do ministério depois de uma série de denúncias em que ele foi acusado de participar de um esquema de desvio de recursos que eram repassados a ONGs conveniadas ao programa Segundo Tempo, de incentivo à prática de esportes entre jovens.

• Pedro Novais

O ex-ministro do Turismo se envolveu em um escândalo na qual sua administração na época teria assinado contratos de R$ 52,2 milhões com o Instituto Brasileiro de Hospedagem (IBH), uma ONG que se dedicava a ensinar profissionais a distância. O maior contrato, de R$ 25,5 milhões, foi apresentado e aprovado em meia hora. Novais, que já havia se envolvido em outros escândalos, também foi afastado do ministério.

• Pedro Lupi

Ex-ministro do Trabalho foi exonerado após uma série de denúncias. Uma delas acusava assessores de seu ministério de cobrar propinas de organizações não-governamentais. O órgão contratava as entidades para capacitar profissionais e depois cobrava 5% a 10% do valor do contrato para resolver "pendências" que o próprio ministério criava.

O Projeto de Lei que regulamenta as relações entre organizações não-governamentais (ONGs) e órgãos do governo faz uma série de exigências para tornar o planejamento e as execuções dos projetos da sociedade civil mais transparentes. Aprovada no dia 2 de julho na Câmara dos Deputados, a proposta agora segue para sanção presidencial. Caso seja de fato sancionada, os antigos contratos vão continuar valendo até que seus prazos expirem. Depois, terão de se adequar às novas regras.

Para o doutor em Direito Fernando Borges Mânica, professor de Direito Admi­­nistrativo da Universida­­de Positivo e autor do livro Terceiro Setor e Imunidade Tributária, entre outros, a nova lei tem avanços importantes, mas pode dificultar a liberdade organizacional das ONGs. "É uma lei de caráter nacional que vai disciplinar de modo claro esses modelos de ajuste que estão sendo criados, mas o problema é que ela repete em muito a regulação que existia no decreto dos convênios", explica. Veja trechos da entrevista:

Por que esse projeto de lei é importante?

Desde a década de 1950, a maior parte das relações entre o Estado brasileiro e o terceiro setor foi firmada por meio de convênios, uma modalidade criada para celebrar a união entre duas instituições públicas. Então, essa disciplina é historicamente adequada nas relações público-privadas. Mas a lei não muda de modo importante a racionalidade do convênio. Porque o decreto dos convênios, o 6170/2007, recebeu várias alterações ao longo dos anos e muitas delas se tornaram leis. O grande avanço do projeto, então, é que ele é aplicável à união, estados e municípios. É uma lei de caráter nacional, que vai disciplinar de modo claro esses modelos de ajuste que estão sendo criados, mas o problema é que ela repete em muito a regulação que existia no decreto dos convênios.

Como serão essas novas relações?

Você pode encontrar o nome "Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil" para essa lei, e na verdade não é bem isso. O que ela faz é disciplinar especificamente um modelo de ajuste entre a sociedade civil e o poder público. Ela cria dois novos modelos de ajuste que substituem os convênios, que serão extintos. Os convênios existirão, a partir dessa lei, só para público-público, e as relações público-privadas vão existir sob o nome de termo de colaboração, quando a iniciativa é do poder público, e termo de fomento, quando a entidade procura a Federação.

O projeto estipula uma série de exigências para as ONGs. Isso pode impedir novos casos de corrupção?

Um dos objetivos da lei é enfrentar um cenário de criminalização das ONGs e, para isso, ela exige maior transparência tanto do poder público quanto da entidade parceira. A lei exige que cada parceria, antes de ser celebrada, seja justificada pelo administrador público. Do lado do poder público, essas duas exigências são importantes: a publicização do planejamento e o planejamento das parcerias que ele vai celebrar, que justifica porque ela é vantajosa para o poder público. Isso vai ajudar a ONG a se planejar e possibilitar que desvios sejam mais facilmente detectados. Mas a lei, em si, não pode, de fato, impedir a corrupção. O que pode acabar com isso é a mentalidade do poder público. Muitos governantes celebram parcerias e "saem de férias", ou seja, esquecem do caso, quando deveriam participar e fiscalizar a execução desse objeto. Esse acompanhamento permanente vai evitar os desvios, e nesse sentido a lei traz sim fundamentos para que isso aconteça.

Com exigências desse tipo, a ONG não corre o risco de ficar engessada?

Uma equação difícil de solucionar é justamente essa. A ONG precisa ter liberdade gerencional e alcançar seus objetivos sem a rigidez da estrutura pública. O projeto de lei exige, por exemplo, que haja contratação de bens e serviços por parte da ONG. Ela vai realizar esse objeto por meio da contratação de terceiros, e para isso, vai ter que seguir um regulamento próprio de aquisição de bens e serviços para demonstrar transparência na contratação. Burocracias como essa podem tornar o sistema moroso como o poder público. Além disso, a lei fala especificamente que servidores do poder público devem ter livre acesso nas ONGs e nas empresas prestadoras de serviço para essas ONGs, o que é inaceitável e digno de um estado ditatorial. Ela pode proporcionar uma interferência gigante do público sobre o privado.

O QUE MUDA

O chamado Marco Regulatório das ONGs substitui o decreto 6170/2007, que determinava a formação dos convênios. A maior parte do teor do Projeto de Lei já constava nesse decreto, que por sua vez não era de abrangência nacional. O novo marco traz como novidades protocolos de prestações de contas e de escolhas das entidades parceiras e tem aplicabilidade a todos os estados, municípios e órgãos federais.

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