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De acordo com um levantamento realizado pela IRG Pesquisas – encomendado pela Associação de Mulheres, Mães e Trabalhadoras do Brasil (Matria) – mais de 80% dos eleitores brasileiros são contrários à presença de trans em banheiros e prisões femininas.
Questionados sobre a presença de indivíduos nascidos do sexo masculino que se identificam como mulheres em banheiros femininos, 81,4% dos entrevistados discordaram da aplicação do critério da autoidentificação para o ingresso nos banheiros; 81% discordaram do critério da autoidentificação para a organização dos presídios femininos e 78,5% discordaram do uso da autodeclaração para acesso aos esportes femininos.
Entre os entrevistados que votaram no ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), 95,6% discordaram da aplicação do critério da autoidentificação. Esse número passou a 67,8% dos participantes da pesquisa que votaram em Lula (PT) na última eleição.
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Ainda, entre os que são contrários à aplicação do critério da autoidentificação, 85,5% são do sexo masculino e 77,4% do sexo feminino. Além disso, ter ou não ter filhos também exerce influência sobre as opiniões: 83,9% das pessoas com filhos discordam da política da autoidentificação de gênero; esse percentual cai para 74,8% entre as pessoas que não têm filhos.
A pesquisa ainda registrou uma rejeição de quase 90% das pessoas à linguagem neutra e desconhecimento da população sobre políticas de identidade de gênero.
Os pesquisadores entrevistaram 1.100 pessoas, maiores de 16 anos, por contato telefônico, nos meses de outubro e novembro de 2024. A margem de erro é de 3 pontos percentuais, para mais ou para menos. O nível de confiança é de 95%.
Troca da palavra “mãe”
Quando perguntados sobre a troca da palavra “mãe” pela expressão “pessoa que gesta” em documentos e formulários oficiais do governo federal, 89,8% dos entrevistados se posicionaram contra a medida.
O mesmo percentual também foi registrado contra a troca do termo “mulher” por “pessoa que menstrua”.
No início do ano passado, o Ministério da Saúde, ainda sob o comando da ex-ministra Nísia Trindade, substituiu os termos “mulher” e “mãe” por “corpo de quem pariu” e “pessoa que pariu” em publicações oficiais.
Também no ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) discutiu uma ação proposta pelo Partido dos Trabalhadores (PT) que pedia a substituição do termo "mãe" por "parturiente" ou outros termos neutros na Declaração de Nascido Vivo (DNV).
O PT alegou a necessidade de reconhecer a identidade de gênero de pessoas do sexo feminino que se identificam como homens e que têm filhos. O STF acabou acatando o pedido do partido parcialmente e incluiu o termo “parturiente” ao lado de “mãe” nos documentos.
Confusão sobre as regras
O levantamento revelou uma confusão sobre os critérios atuais para o acesso de trans a espaços e direitos femininos.
“Muitos brasileiros ainda acreditam que as regras antigas se aplicam, como a exigência de laudos médicos, cirurgias e terapia hormonal, desconhecendo a nova realidade: apenas a autodeclaração já basta, isto é, ‘nada além da manifestação de vontade do indivíduo’, conforme determinou o Supremo Tribunal Federal no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4275, em 2018”, diz a Matria em um comunicado sobre a pesquisa, publicado na sexta-feira (21).
Quando perguntados sobre “o que é uma mulher trans”, os entrevistados deram 220 respostas diferentes.
O conteúdo das respostas mostrou que 61% dos brasileiros não sabem o que “mulher trans” significa; 11% acreditam que são pessoas do sexo feminino lésbicas ou com características socialmente consideradas masculinas; 23% creem ser qualquer pessoa que deseja ser do outro sexo e 18% não sabem dizer.
Cotas e privilégios
Mais da metade dos entrevistados se posicionaram contra à concessão da licença-maternidade para pessoas trans não nascidas como mulheres (52,6%).
“De modo geral, entre as pessoas que concordaram parcial ou totalmente, elas não identificaram esse direito como uma concessão específica a pessoas transgênero, mas a todas as pessoas com filhos, independente do sexo”, destacou a Matria.
Em relação às cotas para transgêneros em concursos e universidades públicas, metade dos entrevistados “discordou totalmente” (50,2%), enquanto 24,7% dos entrevistados “concordaram totalmente”.
Entre as pessoas favoráveis, algumas manifestaram que gostariam que as cotas viessem acompanhadas de uma avaliação mais ponderada da sua viabilidade e compatibilidade com os direitos de outros grupos.
Maioria não vê preconceito em mulheres que discordam da agenda de gênero
Entre os entrevistados, 75,3% disseram não enxergar preconceito nas mulheres que discordam ou criticam a política de gênero.
Para Aída Souza, advogada da Matria, “essa informação se choca com diversas decisões judiciais recentes que culminam com a perseguição judicial a quem discorda da aplicação da teoria da identidade de gênero e faz críticas ao seu uso, especialmente pelo Estado e pelo sistema jurídico”.
Celina Lazzari, diretora da Matria, explica que o objetivo da associação com a pesquisa “era entender a real percepção da sociedade brasileira sobre um tema cada vez mais presente no debate público, que é a auto identificação por gênero”.
“Existem apenas quatro pesquisas do tipo no mundo, e nenhuma delas é brasileira. E nós queríamos que uma organização especializada em opinião pública, com experiência e reconhecimento em pesquisas correlatas, fosse responsável pela definição da metodologia, execução da pesquisa e com total autonomia. Por esse motivo escolhemos a IRG Pesquisas”, explicou.
Pesquisa foi premiada
A pesquisa encomendada pela Matria recebeu o segundo lugar do Prêmio Tep Talks da Associação Brasileira de Pesquisadores Eleitorais (Abrapel) e do Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe), no ano passado.
A pesquisa concorreu com outros trabalhos que foram apresentados em um seminário internacional, em Maceió (AL). Com o tema "pesquisas eleitorais: desafios e metodologias na democracia contemporânea", o seminário aconteceu de 3 a 5 de dezembro de 2024.
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