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O ex-comandante da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) da Rocinha, major Edson Raimundo dos Santos, disse na noite de quarta-feira (2), durante audiência de instrução e julgamento, que liberou o ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, após checar seus documentos no dia de seu desaparecimento.

"Me chamou a atenção ele não apresentar uma identidade, e sim a carteira de trabalho e vários contracheques da atividade de pedreiro que exercia. Depois disso, o liberei", disse o major, que é um dos 25 PMs acusados de tortura, ocultação de cadáver, fraude processual e formação de quadrilha.

Amarildo está desaparecido desde que foi conduzido por policiais militares, no dia 14 de julho do ano passado, para uma das bases da UPP Rocinha, na zona oeste do Rio.Durante cinco horas, o major respondeu às perguntas do juízo, do Ministério Público e dos advogados de defesa. O PM afirmou que nenhuma das acusações é verdadeira e voltou a relatar o que disse em depoimento: que teria liberado Amarildo após checar seus documentos.

"Estou levando porrada desde que as investigações começaram. Hoje me sinto aliviado, pois pude falar à Justiça toda a verdade", declarou, ao término do seu depoimento.

Ao ser questionado pela Promotoria sobre os depoimentos de alguns policiais da UPP, que disseram que Amarildo foi torturado e morto na sede, Santos voltou a negar o crime. O major declarou, ainda, que os PMs foram coagidos a fazer as declarações pelos agentes da Divisão de Homicídio.

"A abordagem na UPP não durou nem cinco minutos. Vi o Amarildo caminhando em direção a uma escada que leva a uma outra região da Rocinha, a Adionéia. Os investigadores da Divisão de Homicídios pressionarem e constrangeram os policiais durante os depoimentos. Além disso, várias vezes o delegado Rivaldo Barbosa me pedia para colocar a culpa nos outros policiais, falava que iria arruinar minha vida e que ele não poderia 'falhar' novamente", disse.

Santos disse que o delegado se referia ao fato de que, na época em que trabalhou como subsecretário de Inteligência na Secretaria de Segurança, não percebeu que um dos seus assessores era um falso coronel. Por isso, de acordo com o policial, ele teria perdido o cargo.

O major afirmou que, na noite do desaparecimento de Amarildo, chovia muito, e um pico de luz queimou a fonte da câmera que poderia ter filmado a descida de Amarildo pela escada. O fato foi corroborado por um funcionário da empresa que administra as câmeras.

Ainda de acordo com o oficial, todas as câmeras da Rocinha foram colocadas por pontos definidos por ele e, após o desaparecimento, ele comprou com dinheiro próprio três HDs e gravou todas as imagens das 80 câmeras espalhadas pela comunidade e entregou à Divisão de Homicídios.

"Minha esperança era de que uma câmera pudesse mostrar a sua imagem após a liberação dele da sede. Mas vi que os investigadores estavam tendenciosos a colocar a culpa na PM ao não interrogar um morador que disse ter visto Amarildo, um dia após ele ter sido abordado pela minha equipe", disse.

Ocorrências

Na noite do desaparecimento, outra pessoa já havia sido conduzida para a UPP e liberada pelo major. Após liberar Amarildo, o major afirmou que saiu outras duas vezes da UPP, o que pode ser comprovado por outra câmera.

Uma das saídas foi para verificar o chamado de um morador que achava que sua cachorra havia sido roubada. A outra saída foi para a 15ª DP (Gávea), para uma ocorrência envolvendo um policial da unidade.

Ainda de acordo com o oficial, as luzes da sede foram apagadas pois a unidade estava em alerta para ataques.

"Não era a primeira vez que isso ocorria, então, quando existia algum alerta de ataque eu segurava o efetivo até mais tarde e pedia para as luzes serem apagadas, pois no escuro ficaria mais difícil para alguém atirar de longe", disse.

Por conta da suspeita de ataque, o major ainda teria pedido apoio do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) para a realização de uma ronda na comunidade.Ainda no seu depoimento, o major afirmou que conhecia a esposa e alguns filhos de Amarildo, inclusive a cadastrou em um sistema de distribuição de cestas básicas feitas pela UPP.

"Um policial me falava que ela era ligada ao tráfico, e eu continuei a dar a cesta justamente para ganhar a sua simpatia pelo nosso trabalho. Em outra ocasião, vi seu filho passando mal de fome e dei do meu bolso R$ 20 para ela comprar um almoço."

O major relatou também detalhes da operação "Paz Armada", que estava conduzindo na comunidade, com a ajuda do Ministério Público e da Polícia Civil. Além disso, falou sobre projetos de proximidade, das prisões que fez sobre seu comando e das tentativas de suborno do tráfico.

Os depoimentos dos outros acusados deverão ocorrer nos dias 9 e 11 de abril em outras audiências. Dos 25 policiais militares denunciados pelo Ministério Público, 13 estão presos, inclusive o major.

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