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Um possível mal-entendido transformou a vida de Alexandre Oliveira Pontes, 20 anos, em um pesadelo na cidade Londrina, no Norte do estado. Desde o dia 21 de fevereiro ele está preso na carceragem do 2º Distrito de Polícia Civil – o mais lotado da cidade – acusado de ter cometido um assalto a uma loja na Avenida Duque de Caxias. O que tornou a situação incomum é o fato de que não existe prova contra ele. Mesmo os funcionários do estabelecimento atestaram, em depoimento, que o rapaz não cometeu nenhum crime.

Pontes é surdo e não fala. Ele foi preso por policiais militares dentro de um ônibus, minutos depois de ter deixado a loja, onde tentou comprar um achocolatado. As funcionárias disseram que estranharam o comportamento do rapaz – pelo simples fato de que ele não falou nada.

Segundo elas, a suspeita virou acusação após um cliente ter comentado que viu "um volume" por baixo da camiseta de Pontes. "Ele [cliente] disse que a gente poderia ter sido assaltado, porque viu uma arma com ele", disse a funcionária, que preferiu não se identificar.

Por causa da suspeita do cliente, o proprietário saiu da loja e pediu para que policiais fizessem a abordagem. A PM parou o ônibus e prendeu o rapaz. Segundo a irmã de Pontes, Ivani de Oliveira Pontes, os próprios policiais disseram que quase atiraram, porque o rapaz não respondia às ordens dos PMs. "Meu irmão é surdo-mudo e ficou muito assustado com a situação."

Uma semana depois da prisão, uma das funcionárias depôs e disse que foi tudo um mal-entendido. "Ele não tinha nada e o volume [debaixo da camisa] era a carteira dele. Acho que ele não deveria ficar preso", disse.

Sem precedente

A prisão em flagrante foi lavrada com base no depoimento do proprietário e dos policiais. A forma como foi feito o flagrante causou espanto e indignação até no meio policial. "Em tantos anos de polícia esse caso foi um dos mais injustos que já vi", disse um policial que acompanhou o processo.

Segundo o delegado do 4º DP, Jairo Luiz Duarte de Camargo, após receber o inquérito e ouvir a funcionária ele apressou a conclusão, para que a Justiça fizesse a análise o mais rápido possível.

A defesa do rapaz pede a liberdade baseada na falta de provas e no depoimento das funcionárias da loja. Durante toda a tarde da última sexta-feira (2), um dos advogados contratados pela família permaneceu na 2ª Vara Criminal, mas o pedido de soltura não foi apreciado pela Justiça. A reportagem não conseguiu contato com a promotora da 2ª Vara Criminal, que acompanha o caso.

"Meu irmão nunca fez mal a ninguém"

Alexandre Oliveira Pontes, 19 anos, nasceu surdo e nunca falou. Mas a deficiência não o impediu de batalhar para conseguir emprego e continuar a manter, até hoje, os estudos – realizados à noite. "Meu irmão é um trabalhador. Uma pessoa que nunca fez mal a ninguém", disse a irmã, Ivani de Oliveira Pontes.

Segundo ela, o anúncio da prisão surpreendeu a todos que se relacionam com o rapaz. "No emprego ninguém acredita que isso tenha acontecido." Uma funcionária da empresa ouvida pela reportagem confirmou a surpresa e garantiu que Pontes continua com a vaga garantida.

De origem humilde, Pontes mora com três irmãos na Vila Casoni (centro) e seu salário ajuda na manutenção da casa e também paga pequenos luxos. A irmã contou que Pontes gosta de se vestir como os cantores de hip-hop. "Muita gente confunde usar uma calça larga com ser bandido. Existe preconceito em toda essa história também", argumentou.

Rapaz teria direito a tradutor

A presidente do Conselho Municipal das Pessoas Portadoras de Deficiência Física, Martinha Claret Dutra, disse que vai acionar o Ministério Público (MP) para levantar os dados sobre a prisão de Alexandre Oliveira Pontes. Ela informou que é direito do portador de necessidades especiais um tradutor providenciado pela autoridade policial, para ajudar na comunicação e no direito à defesa. A família alega que, desde a prisão, não conseguiu fazer contato com Pontes e nem mesmo a advogada foi autorizada a entrar na delegacia.

Reunião

Na manhã desta segunda-feira, pela primeira vez um intérprete esteve na delegacia para se comunicar com Pontes. O rapaz informou que não sabe e ainda não entendeu porque está preso. Segundo a advogada da família, uma reunião na tarde desta segunda com o juiz substituto tentará pôr fim na situação.

"Já entramos com o pedido de liberdade provisória no dia 21, mas até agora não temos resposta. Vamos ter uma conversa com o juiz substituto para tentar resolver o caso. A queixa do crime foi retirada na sexta-feira (2)", explicou a advogada Michele Bitencourt.

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