Alíquota será zero para importação de revólveres e pistolas| Foto: Albari Rosa/Arquivo/Gazeta do Povo
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É justo que o dono de um imóvel possa usar um meio letal para impedir que alguém entre em sua casa sem a sua autorização, mesmo quando não for ameaçado com uma arma? O Projeto de Lei (PL) 4782/20, de autoria do deputado federal Filipe Barros (PSL-PR), quer garantir esse direito, criando no Brasil a conduta de salvaguarda residencial.

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Segundo o PL, o morador de uma residência poderá, por legítima defesa, matar o invasor de sua propriedade sem ser incriminado por isso, desde que comunique imediatamente a ocorrência a uma autoridade policial. A salvaguarda residencial é definida no projeto como qualquer conduta praticada pelo morador “para assegurar a inviolabilidade da sua vida, de seus familiares e de seu patrimônio”.

“Hoje, as pessoas estão desarmadas, infelizmente, e poucas possuem meios de praticar a legítima defesa. Quando essas poucas pessoas praticam a legítima defesa, é frequente o Ministério Público processá-las, seja por homicídio culposo ou lesão corporal. Isso tem que acabar”, diz o autor do projeto.

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Segundo o Código Penal, hoje, quem age em legítima defesa, em estado de necessidade (isto é, em situação de perigo criada por outra pessoa) ou cumprindo algum dever legal não pode ser incriminado. No entanto, se um juiz considera que houve excesso na reação – como no caso de alguém que atira em uma pessoa desarmada –, há punições previstas.

A ideia de Barros é acabar com essa ressalva para âmbitos residenciais, criando um mecanismo legal para que um morador não sofra nenhum tipo de sanção quando agir contra um invasor de sua residência, independentemente das circunstâncias da invasão.

“A propriedade privada tem que ser sagrada. Se nós estamos dentro da nossa propriedade com nossa família e alguém invade essa propriedade, com qualquer intuito que seja, nós precisamos ter o direito de exercer a legítima defesa sem a preocupação de posteriormente o Ministério Público se insurgir contra isso”, afirma o autor do projeto.

Segundo o texto do PL, se a arma de fogo usada pelo morador estiver com o registro vencido, isso não vai desqualificar a legítima defesa, mas o autor do disparo deverá providenciar a regularização da arma imediatamente.

A legítima defesa envolve, segundo o texto do PL, o uso de ofendículos (aparatos residenciais para aumentar a segurança) em muros, “como arames, cercas elétricas, entre outros”, de cães de guarda, de serviços de segurança privada e de armas de fogo.

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”Doutrina do castelo” embasa PL sobre salvaguarda de residência

Nos Estados Unidos, chama-se de “castle doctrine” – “doutrina do castelo” – a ideia de que há imunidade jurídica para quem usa força letal contra um invasor de sua residência. Diversos estados norte-americanos incorporam essa doutrina em suas legislações, com diferentes gradações.

“Há leis semelhantes em outros países, como nos Estados Unidos. O que me motivou foi o número de crimes existentes em nosso país. Temos em nossa Constituição o valor da propriedade privada. Colocamos a propriedade privada como um dos pilares daquilo que definimos como liberdades individuais, só que isso não tem o devido respaldo jurídico”, explica Barros.

Um dos argumentos contrários à doutrina do castelo é que a vida é um bem jurídico mais importante que a propriedade e que, por isso, não se pode tirar a vida de alguém que invade uma propriedade.

Para o deputado, há um equívoco nesse argumento. No texto do projeto, ele afirma: “Na maioria dos casos em que há invasão de domicílio, os crimes que ocorrem dentro da residência atentam contra a vida das pessoas que lá estão, sendo possível determinar que o bem jurídico escolhido, portanto, é sempre a vida e a integridade física dos cidadãos e não apenas a propriedade.”

Projeto atenta contra Constituição, diz jurista

Antônio Santoro, professor de Direito Processual Penal do Ibmec-RJ, considera que o projeto de lei de Barros atenta contra a Constituição e o Código Penal, porque “estabelece autorização para matar fora dos casos que, estritamente, a Constituição e o Código Penal preveem”.

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“Quando se propõe um projeto de lei afastando qualquer possibilidade de punição a uma pessoa que mate a outra por ter invadido seu domicílio, há uma série de problemas”, diz o jurista.

Um dos problemas, segundo ele, é a desproporcionalidade dos bens jurídicos que estão em conflito. “A inviolabilidade de domicílio não tem o status dignitatis, ou seja, o mesmo estado de dignidade que a vida”, afirma.

Além disso, de acordo com Santoro, para dizer que havia risco de vida para uma pessoa que teve seu domicílio violado, é preciso analisar o caso concreto, sem que haja presunção prevista na própria lei. “Toda vez que um sujeito propõe um projeto de lei que retira do juiz, do delegado, do promotor a análise do caso concreto, há uma presunção”, diz.

Santoro dá um exemplo: “Aqui no Rio de Janeiro é um costume soltar pipa e jogar futebol na rua. Não é incomum que uma pipa ou uma bola caia dentro de uma casa. Aí, um sujeito de 16, 17 anos pula o muro para pegar a bola ou a pipa. Esse projeto de lei parece estar autorizando a pessoa que está em casa a empregar meios letais contra quem pulou o muro. Presume algo que circunstancialmente não deveria ter sido presumido”.

Segundo o jurista, a legítima defesa não pode nunca ser presumida – só se verifica no caso concreto. “E é óbvio que eu não estou dizendo que uma pessoa que tenha a sua casa invadida, eventualmente, não possa ser absolvida se tiver matado alguém, desde que fique claro pelas circunstâncias que, de alguma forma, sua integridade física ou da sua família estava em risco. Mas isso não pode ser presumido. Um projeto de lei que estabelece essa presunção é um projeto que autoriza o assassinato”, conclui.

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