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Batalha foi esquecida por registros da época

Para os veteranos que participam das reuniões, a missão de resgate que rendeu a condecoração à Tro­­pa Alfa foi um caos alimentado por adrenalina. Ela começou, assim como muitas coisas no Vietnã, com um pedido de ajuda. Um avião norte-americano e sua tripulação haviam tido problemas causados por um abrigo norte-vietnamita localizado próximo à fronteira com o Camboja. Eles estavam praticamente cercados e a densa vegetação de floresta impossibilitava a evacuação por meio de helicópteros. Ao escurecer, os americanos tinham praticamente certeza de que seriam atacados.

"Eu não tinha opções, nem para onde escapar", relembra George Hobson, o comandante da unidade que se encontrava em apuros, a companhia Charlie. Mas Poindexter, na época um capitão de 25 anos, se voluntariou para resgatar a companhia Charlie. Na noite anterior, um morteiro explodiu acidentalmente dentro de um dos veículos da tropa, matando vários homens e tirando o sono dos soldados. Entretanto, no dia se­­guinte, quando ocorreu o resgate, a Tropa Alfa já se encontrava em seus tanques M551 Sheridan e outros veículos armados adentrando em vegetação tão densa que era quase impossível ver o veículo da frente.

Uma troca de tiros violenta ocorreu quando a tropa chegou ao local onde se encontrava a companhia Charlie. Aviões americanos tentaram ajudar, mas não conseguiram atingir os vietnamitas. Soldados norte-vietnamitas saíam dos abrigos e eram forçados a recuar a tiros de metralhadora. Ao pôr-do-sol, os americanos finalmente perceberam que a noite iria favorecer os inimigos e decidiram então recolher seus mortos, feridos e cansados, e bateram em retirada. O número de mortos jamais foi registrado claramente, mas Poindexter estima que, incluindo o incidente com o morteiro, 7 homens morreram e mais 70 ficaram feridos durante a batalha e seu prelúdio.

Hobson revelou acreditar que a Companhia Charlie seria "exterminada" caso a Tropa Alfa não tivesse aparecido naquele momento. Naquela época, todavia, esse era apenas mais um dia de chuva no Vietnã. Algumas semanas mais tarde, a Tropa Alfa se juntou à invasão no Camboja.

A batalha virou apenas uma nota de rodapé na História – ou até mesmo menos que isto. Um mem­­bro da tropa, August Whi­­tlock, relembra que, quando deixou o Vietnã, o soldado processando sua documentação perguntou se ele havia participado de alguma grande batalha. Quando Whitlock mencionou a missão de resgate e a troca de tiros próxima à fronteira com o Camboja que levou um dia inteiro, o soldado verificou uma lista. "Não houve batalha alguma neste dia", disse o soldado a Whitlock. Agora essa informação será corrigida.

Santa clara, Califórnia - Quando Ray Moreno retornou do Vietnã, no mesmo dia em que foi chamado de "assassino de bebês" por aqueles que eram contra a guerra, ele decidiu guardar para sempre seu uniforme do Exército no guarda-roupa. Mesmo apesar de memórias e pesadelos ainda fazerem parte do seu cotidiano, ele raramente falava sobre o assunto. Também havia esquecido os companheiros de batalha. Tudo isso mudou quando o ex-soldado começou a frequentar reuniões anuais da sua tropa, há alguns anos. De repente, as portas que bloqueavam o passado se escancararam. "Eles estavam lá. Eles entendem. Se quisermos chorar, choramos. Se não quisermos, tudo bem", declarou Moreno, 58 anos.

Para muitos membros da unidade de que Moreno fez parte, a Tropa Alfa da 11.ª Cavalaria Ar­­mada, as reuniões anuais dos veteranos da Guerra do Vietnã se tornaram uma forma de terapia: uma chance de se reconectarem, sarar feridas e compartilhar laços atados em uma guerra impopular. No entanto, a reunião deste ano (que ocorreu no mês passado) se tornou especial por outro motivo. Em um salão de baile de hotel, a Tropa Alfa divulgou o recebimento de uma Citação Presidencial de Unidade – a maior honra militar concedida para unidades militares – concedida pelo Exército por "heroísmo extraordinário" ao resgatar mais de 70 soldados cercados por um batalhão norte-vietnamita em 26 de março de 1970. Nas próximas semanas, acreditam os veteranos, o presidente Obama irá realizar formalmente a citação em uma cerimônia na Casa Branca.

Para a reunião de veteranos deste ano, a maioria deles na faixa dos 60 anos, a citação foi uma validação poderosa das ações que alguns tentaram esquecer. "A dor e as memórias jamais irão desaparecer, mas você se sente um pouco melhor ao receber reconhecimento por isso", declarou Moreno, hoje morando em Orosi, Califórnia.

A citação encerra uma campanha de seis anos liderada pelo ex-comandante da Tropa Alfa, John Poindexter, em busca de reconhecimento. A saga começou, de acordo com Poindexter, depois que ele leu um artigo sobre a guerra no qual um veterano reclamava que os soldados da Tropa Alfa não haviam recebido medalhas. "Era uma epifania. Eu senti que devia corrigir um erro", declarou Poindexter. Ele iniciou um abaixo-assinado que solicitava que o Exército concedesse premiações individuais e uma Citação de Unidade. Para tal, ele organizou uma equipe de assistentes para coletar relatórios pós-guerra, registros de óbitos, fotografias históricas e relatos em primeira pessoa.

Poindexter, hoje um rico empresário do Texas, conseguiu compilar todas as informações em um dossiê com quase dez centímetros de espessura e as enviou para o Exército. Além disso, ele publicou o livro The anonymous battle ("A batalha anônima"), baseado nos relatórios da missão de resgate que ele escreveu há mais de 30 anos. A documentação ajudou a tropa a obter não apenas a citação do presidente, mas também medalhas individuais para 14 membros.

Entretanto, o processo de reconstruir a batalha fez muito mais do que render premiações. Vários veteranos declararam que, depois que Poindexter entrou em contato, seu interesse pelo Vietnã foi reavivado. Alguns começaram a buscar velhos amigos com quem não tinham falado por décadas. Outros começaram a frequentar as reuniões da 11.ª Cavalaria, das quais nunca haviam participado.

Romeo Martin, por exemplo, disse que por 33 anos ele jamais falou sobre a guerra, nem mesmo com sua esposa. No entanto, Martin, hoje um carteiro de 60 anos em Hartford, Connecticut, disse que seu "sangue voltou a correr pelas veias" após ler o manuscrito de Poindexter. Ele conseguiu, então, localizar seu velho comandante e reativou a amizade. Outro membro da tropa entrou em contato com Romeo e ambos começaram a frequentar as reuniões juntos. "Elas me ajudaram muito. Eu vivia em uma concha. Existem muitos companheiros que ainda estão em suas conchas", revelou Martin sobre as reuniões anuais.

Alguns veteranos tiveram vidas de sucesso. Pasqual Gutierrez se tornou um arquiteto bem-sucedido, sócio de uma empresa com dez filiais na Califórnia. Outros da tropa, entretanto, não se saíram tão bem. Um morreu de uma overdose de drogas, e muitos outros foram diagnosticados como portadores do estresse pós-traumático. "A guerra deixou marcas muito fundas neles. Mesmo hoje em dia, ela nos deu a imagem de que somos um mau exemplo", disse Gu­­tierrez. Em parte devido a esse mes­­mo motivo, ele se recusou a con­­­­­­tribuir para o livro de Poin­­dexter ini­­cialmente. Entretanto, depois de muitas alfinetadas, ele escreveu memórias detalhadas da batalha e, após o convite de Martin, ele começou a frequentar as reuniões. "Iniciou-se uma pequena rede social. Foi incrível rever estes camaradas e perceber que tínhamos esta experiência inigualável em nossas vidas."

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