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Ficinski: “85% dos que continuarão andando de ônibus vão ajudar a pagar a passagem dos 15% que vão andar de metrô” | Hugo Harada/Gazeta do Povo
Ficinski: “85% dos que continuarão andando de ônibus vão ajudar a pagar a passagem dos 15% que vão andar de metrô”| Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo

Ippuc

Ônibus ainda terá papel importante

Vinicius Boreki

A construção do metrô não significa um abandono do ônibus, na avaliação do presidente do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), Cléver Almeida. "A vinda do metrô não anula a história e o futuro de Curitiba de investimentos em ônibus", afirma. Ele cita os exemplos da Linha Verde e do Ligeirão como melhorias recentes do transporte.

Segundo ele, o metrô surge como solução para uma cidade estrangulada pelo número de carros. Por mais investimentos que se façam em ônibus, o número de veículos influência a velocidade do sistema – com o aumento de cruzamentos nos eixos.

Almeida admite que o sistema metroferroviário é mais custoso. No entanto, na operação dos ônibus, não constam valores embutidos, como a manutenção de vias públicas, terminais e estações-tubo. De acordo com ele, cada carro do metrô funciona por 30 anos e tem o mesmo custo de três biarticulados, cuja vida útil é de dez anos. A prefeitura garante que a tarifa será a mesma do sistema de ônibus, mas é impossível determinar o valor hoje em razão da possível variação de insumos até 2016.

Outro benefício indireto do metrô é o fato de as canaletas se tornarem um parque linear, com incentivo às bicicletas com a construção de uma ciclovia de aproximadamente 13 quilômetros e a melhoria de qualidade de vida das pessoas. "Com um tempo de permanência menor no sistema, as pessoas ganham mais tempo para fazer o que lhes interessa", diz.

Por duas vezes presidente do Instituto de Pesquisa e Plane­­jamento Urbano de Curitiba (Ippuc) e participante do processo histórico de transformação da capital paranaense em cidade mundialmente reconhecida como modelo, o engenheiro e arquiteto Lubomir Ficinski entregou ao prefeito Luciano Ducci, no último dia 4, sua carta de demissão do cargo de diretor de Transportes que ocupava na Urbs. Motivo: discordância quanto à prioridade dada à construção do metrô em detrimento da modernização do sistema de ônibus. Para Ficinski, as melhorias que deixaram de ser introduzidas poderiam garantir vida longa ao atual sistema com maior eficiência e a custos muito meno­­res do que os previstos para o metrô. "O que vai acontecer é que 85% dos passageiros que continuarão andando de ônibus vão ajudar a pagar a passagem dos 15% que vão andar de metrô". A promessa da prefeitura é de integrar o futuro metrô ao sistema atual com tarifa igual à do ônibus, mas, como observa o ex-diretor da Urbs, a passagem terá de subir para pelo menos R$ 3,10 para dar viabilidade econômica ao metrô.

Diplomado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) em Engenharia Civil (1960) e em Arquitetura e Urbanismo (1964), Ficinski fez parte da geração convocada pelo prefeito Ivo Arzua (1962-67) para auxiliar na elaboração de um novo projeto urbano para Curitiba, em substituição ao Plano Agache, que já não se adaptava à realidade. Foi, à época, junto com Jaime Lerner, um dos fundadores do Ippuc. Mais tarde, trabalhou em projetos que se tornaram ícones da cidade, como o das canaletas exclusivas para ônibus e a implantação dos expressos e dos binários. Leva também sua assinatura o projeto de engenharia do Parque Barigui.

Em entrevista à Gazeta, Lubomir Ficinski defende mais investimentos no sistema de ônibus, lamenta a lentidão de alguns setores da administração municipal e critica a prioridade concedida ao metrô – modal, segundo ele, muito caro e desnecessário para Curitiba agora ou a longo prazo.

Por que razão o senhor pediu demissão da Urbs?

Fiquei muito frustrado por não poder modernizar o sistema. Fui convidado pelo prefeito para fazer isso. Não consegui implantar o desalinhamento das estações-tubo ao longo de toda a linha Norte-Sul [do Santa Cândida ao Pinheirinho] como estava no projeto original, com 23 quilômetros. Depois, quando a prefeitura decidiu priorizar o metrô, o projeto foi reduzido à metade – o desalinhamento seria feito apenas no trecho Santa Cândida–Praça do Japão. Mas nem esse foi possível executar.

Por que não?

Eu não senti na prefeitura toda a vontade...

Faltaram recursos?

Não. O custo para o desalinhamento estava orçado em cerca de R$ 15 milhões. O governo do estado até chegou a transferir R$ 5 milhões para a Urbs. Com esse recurso nós contratamos a construção de novas estações-tubo e a reforma das antigas. Para as demais obras do desalinhamento, já com o restante dos recursos garantidos, foram feitas duas licitações – uma ficou deserta e outra a empresa vencedora não provou qualificação técnica. E isso vem se arrastando desde o ano passado. Não aconteceu mais nada. Chegou um momento em que eu cansei.

Que culpa tem a Urbs ou a prefeitura nisso?

A Urbs não teve culpa nenhuma: fez os projetos, deixou tudo pronto. Mas, na prefeitura, as prioridades não estão definidas. Lá cada setor tem suas próprias prioridades e cada qual está cuidando do seu quintal. Desse jeito não se consegue fazer as coisas direito. E isso eu escrevi para o prefeito.

Mas qual é a importância desse desalinhamento das estações?

É muito grande! No único trecho executado, o Boqueirão-Praça Carlos Gomes, os "ligeirões" ganharam 20 minutos no trajeto, o que é quase a metade do tempo antes do desalinhamento. Este seria também o tempo ganho entre o Santa Cândida e a Praça do Japão. Se fosse até o Pinheirinho, seriam 40 minutos ou mais! Se você multiplicar esse tempo menor por milhões de passageiros, você vai ver o quanto isso se refletiria na economia e na qualidade de vida das pessoas.

Este ganho de tempo seria suficiente para mostrar que o ônibus ainda é solução melhor do que o metrô?

Sem dúvida! É o tempo menor que permite maior frequência e atendimento pleno mesmo nas horas de pico. Veja: a Urbs terminou há um mês um levantamento do transporte coletivo na região Sul de Curitiba. Os dados, portanto, são bem recentes: a demanda do Sul até o centro da cidade é de 256 mil passageiros por dia e 30 mil na Linha Verde. Ora, a proposta que viabiliza o metrô requer que o movimento seja de 456 mil passageiros/dia em 2014. Isto é, seria preciso aumentar em 78% o número de passageiros na linha do metrô em quatro anos. Não cabe na cabeça de ninguém que isso possa acontecer, mas, com o desalinhamento, os ônibus seriam capazes de chegar facilmente a atender ao pico da demanda de 31,5 mil passageiros.

Qualquer número abaixo de 456 mil significa que o governo precisaria subsidiar o preço da tarifa?

Olha, os metrôs sempre exigirão subsídios, aqui ou em Paris. Mas veja: a Fipe [Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas] calculou que a operação do metrô curitibano nesse trecho de 14 quilômetros vai custar R$ 199 milhões por ano, o que dá R$ 16,5 milhões/mês. No mesmo trecho, com ônibus, custa R$ 4 milhões, com potencial para transportar o mesmo número de passageiros. A diferença, portanto, é de R$ 12 milhões por mês. Lógico, essa diferença tem de entrar na tarifa, o que significa que a passagem, que hoje é de R$ 2,50, teria de subir para no mínimo R$ 3,10.

O prefeito anunciou que a tarifa do metrô será igual à do ônibus...

É... a tarifa vai ser igual, só que ninguém está dizendo de quanto vai ser! Então, o que vai acontecer é que 85% dos passageiros que continuarão andando de ônibus vão ajudar a pagar a passagem dos 15% que vão andar de metrô. Atual­mente, a Urbs já é obrigada a subsidiar a passagem em 7 centavos [o custo real é maior do que o da tarifa], o que lhe dá uma despesa mensal de R$ 1,8 milhão.

O senhor concorda que um dia Curitiba vai precisar de metrô? Nesse caso, não é melhor pensar nele já e construí-lo?

Talvez Curitiba não precise nunca de metrô. Há tanta coisa ainda a ser feita. Tem de espalhar o crescimento da cidade, tem de espalhar a demanda, tem de tornar o sistema de ônibus mais eficiente, melhorar as vias de tráfego, fazer sinalização inteligente, incentivar a criação de empregos em outras regiões, etc... Curitiba vai demorar ainda muito tempo para apresentar uma demanda em horário de pico que justifiquem um metrô. Talvez esse dia nem chegue. Não importa quem queira fazer o metrô nem como vai ser feito. O que importa é quem vai pagar por isso.

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