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Vídeo| Foto: RPC TV

Semana passada, um "japonês" deu de atrapalhar a tarde de skate dos estudantes Constantino Esmanhotto, Victor Hugo Souza Araújo e Wladymir Thiago de Campos – todos com 13 anos, colegas de escola e moradores da Zona Norte da capital. Durante quase uma hora, o forasteiro se plantou na pista de cimento da Rua Schiller – entre o Cristo Rei e o Hugo Lange – restringindo as manobras radicais da piazada. O rabo-de-olho durou até o momento em que o trio descobriu de quem se tratava: Lauro Tomizawa, 64, arquiteto e urbanista que idealizou o Jardim Ambiental 2, nome oficial da descolada Rua Schiller. "A vista da rua, de cima da pista, é a melhor", justificou-se o desmancha-prazeres.

Foi o que bastou para que, curitibanamente, formassem fila para cumprimentá-lo. Só faltou pedirem autógrafo. "Valeu, tio. Venho aqui toda semana, principalmente aos sábados", disse Constantino, dando uma pincelada de verniz à conversa. "Foi uma das primeiras do Brasil, né", disse o garoto. "Não, a primeira", garantiu Lauro, sobre o equipamento da Schiller do qual mais se orgulha. Sem outras pistas em que se basear, restou a ele, e a seu companheiro de prancheta no Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), o carioca Roberto Coelho, medir as inclinações do skate e projetar as ondulações que hoje fazem a alegria da moçada da região.

Mas reduzir a Schiller ao pioneirismo da pista de skate seria um desacato. Juntamente ao Jardim Ambiental I – trecho que vai da Avenida Sete de Setembro com a José de Alencar, até a Zeila Maria dos Santos – a rua é herança de uma Curitiba que o vento levou. Os dois projetos assinados pela dupla Lauro-Roberto, inaugurados respectivamente em 1977 e 1978, na gestão do prefeito Saul Raiz, são remanescentes da época em que ruas viravam praças – e não o contrário, a exemplo do que aconteceu, recentemente, com a Pracinha do Batel.

Rio Juvevê

A Rua Schiller era um achado para os arquitetos e urbanistas da década de 70. Tinha 28 metros de largura e um canal no meio, o Rio Juvevê. Perfeita para o paisagismo, não fossem as águas suportarem heroicamente os efluentes de um cortume, logo ali, o que lhe dava um odor, digamos, catinguento. Ser vizinho do Juvevê não era propriamente ganhar na loteca. Mas com uma boa praça por perto, quem sabe. Aliás, muito perto: o rio foi canalizado e sobre ele se construiu um parque linear – para muitos, uma das soluções urbanas mais geniais já desenvolvidas na cidade.

"Desapropriar áreas para construir zonas de lazer costuma ser muito caro. Percebemos que podíamos fazer uma intervenção ali mesmo, na rua. Foi uma experiência, para ver o que dava", relembra o urbanista Lubomir Fichinski, presidente do Ippuc na ocasião e até hoje ligado ao órgão municipal, onde trabalha na pesquisa do metrô. Pois deu certo.

Nem Lubomir nem Lauro lembram ao certo, mas é provável que pelo menos uma dezena de ruas sem grande importância para o tráfego tenha sido sondada para se somar à série "jardim ambiental". Poucos anos depois, apenas duas vingaram, mas com outro conceito e dimensão.

"Houve resistências", lembra Lubomir – afinal, ninguém tinha visto algo igual. "A população jurava que o terreno ia desvalorizar com os jardins de miolo de rua." Não desvalorizou, por um motivo óbvio. O I e o II são cenários irresistíveis e sobrevivem à lista de senões surgidos com o tempo: as calçadas são estreitas demais; e na II a parte aterrada sofreu uma pequena depressão.

No mais, palmas para eles. "É um projeto subestimado", diz Lubomir, assinando embaixo que os jardins ambientais bem deviam voltar às pranchetas três décadas depois da primeira experiência. Não é bananeira que já deu cacho: caso o metrô saia do papel, pode voltar a acontecer nos 27 quilômetros da canaleta do Expresso da linha Norte-Sul, a que liga Pinheiro a Santa Cândida.

Fora de cogitação para Lauro e Lubomir, só canalização do rio – do que ambos fazem um contrito mea culpa. "Era outro tempo. Não se falava tanto em meio ambiente. Era outro mundo. Tinha 16 mil pessoas morando do lado de lá da BR. Hoje, eu despoluiria as águas", admite o ex-presidente do Ippuc.

Circular pelos jardins ambientais é um golpe de sorte. O visitante pode se deparar, por exemplo, com donas de casa tomando café nas quadras de areia, encontrar duplas jogando tênis e pouco se lixando para o inferno da Sete de Setembro, a alguns metros dali.

Para gente como a professora aposentada Maria do Pilar Mendes, 55 anos, beira o inacreditável. "Moro perto do Jardim Ambiental I há oito anos e nem sabia que isso existia quando comprei meu apartamento. Quando descobri, fiquei pasma. É uma beleza", elogia. A boa impressão se repete entre os 56 sócios da pista de bocha, outra inovação de Lauro Tomizawa, a alguns passos de onde a Schiller se encontra com a Marechal Deodoro.

"Não existisse essa rua a gente estaria em casa assistindo à televisão e torrando a paciência da mulher", brinca o aposentado Luiz Maciel, 63, morador da região. "Foi uma boa saída. Isso aqui era um rio fedido", lembra Miguel Baranowski. Mas nenhum deles arranca mais elogios à Schiller do que Caetano Rucci, 67, o "Maringá".

Aos sábados, é ele quem encabeça o churrasco dos sócios – cuja adesão é de R$ 5 por mês. Também administra a ira dos síndicos, incomodados com tanta festança e com a presença de moradores de rua no campo de bocha. "A gente chega a jogar até 10 da noite. Só não vale dinheiro", garante Maringá.

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