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A nova regra para transplantes de fígado no Brasil, que dá preferência a pacientes mais debilitados, é uma antiga reivindicação no sistema de saúde. Entretanto, alguns médicos criticam o método adotado pelo Ministério da Saúde (MS), a partir da portaria 1.160, para definir os lugares na fila de espera pelo transplante.

Desde 15 de julho, a ordem de chegada deixou de ser o critério para estabelecer os lugares na fila. Agora, é o estado de saúde do paciente que determina a ordem, seguindo um índice chamado Meld (Model for End-Stage Liver Disease). Com uma escala que vai de 6 a 40, os pacientes de Meld mais alto têm preferência pelo transplante. De acordo com cirurgiões ouvidos pela Gazeta do Povo, a preferência por pacientes em estado mais grave é justa. Porém, o método, utilizado há quatro anos nos Estados Unidos, não seria condizente com a realidade brasileira.

O chefe da Cirurgia de Transplante Hepático do Hospital de Clínicas (HC), Júlio Coelho, aponta que a nova regra não vem acompanhada de um investimento na mesma proporção. Por lidarem agora exclusivamente com pacientes graves, os transplantes vão exigir mais estrutura não apenas no procedimento médico, mas também em questões como transporte e acomodação de pacientes (ver texto ao lado). Coelho diz que pacientes nesse estado exigem cuidados maiores (mais medicamentos e internamentos mais constantes) e, conseqüentemente, mais caros. "Nos Estados Unidos a realidade é outra. Lá, a estrutura para se atender pacientes desse nível é muito maior", argumenta.

Como exemplo, o médico do HC cita o sistema de captação de órgãos. Por problemas que vão da burocracia à falta de recursos, o volume de órgãos retirados para transplante é cerca de três vezes menor do que em países desenvolvidos, segundo Coelho.

O cirurgião João Eduardo Nicoluzzi, chefe de uma das duas equipes de transplante hepático da Santa Casa de Curitiba e do Hospital Angelina Caron, em Campina Grande do Sul (região metropolitana), concorda. "Pacientes graves têm urgência, o que exige estrutura extremamente avançada. E o nosso sistema não está pronto para isso", afirma.

A alteração também gera o risco de aumento do número de mortes em transplantes de fígado. Estudo feito em 2003 pelo Hospital das Clínicas de São Paulo demonstra que a suspeita é justificável. Na pesquisa, 237 transplantados foram avaliados no período entre 1995 e 2001. Dos 126 pacientes menos graves, com Meld médio de 9,4, 15% faleceram seis meses após o transplante. Já entre os 111 pacientes mais graves, com índice Meld médio de 20,1, a mortalidade foi de 26%.

Segundo o médico que coordenou o estudo, Paulo Massarollo, que atualmente chefia o serviço de transplante hepático da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo e é secretário da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), o estudo também demonstra que a mortalidade dobra a cada aumento de 15 pontos na escala Meld. "Isso demonstra que o paciente de Meld mais alto gera custos mais altos", aponta.

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