O Registro Nacional de Veículos em Estoque (Renave) – anunciado pelo Ministério das Cidades – pode mudar o sistema de transferência de veículos entre concessionárias, vendedores e compradores. Composto por dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), Secretaria da Receita Federal e Secretaria de Fazenda Estaduais, representadas pelo Conselho Nacional de Fazenda (Confaz), o Renave tem por base a Nota Fiscal Eletrônica que substituiria a transferência manual feita ao Detran. Com a mudança, a taxa de transferência do veículo do vendedor para a concessionária deixaria de ser paga, o que, de acordo com entidades que representam o setor automotivo, poderia baixar o preço dos veículos para o consumidor.
Entidades que representam despachantes e os Detrans, porém, questionam a segurança jurídica da deliberação do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) que criou o Renave. Destacam ainda abaixa nas receitas estaduais que as novas regras podem gerar e contestam a legalidade do processo – já que não seria competência da União abrir mão de taxas pagas aos estados, já que quem deliberas sobre o assunto são as Assembleias Legislativas.
Atualmente, ao vender um veículo para uma concessionária ou dá-lo como entrada na compra de outro carro, o consumidor deve comunicar ao Detran sobre a transferência do veículo assinando e autenticando o Certificado de Registro do Veículo - CRV, passando a propriedade para o CNPJ da loja. A transferência do veículo tem um custo de R$ 270,14 no Detran-PR. Caso a loja não a faça, toda e qualquer infração de trânsito ou multa vai para o antigo proprietário, mesmo que o veículo já tenha sido entregue à loja. O Renave eliminaria a necessidade da transferência de propriedade de forma física junto ao Detran, e assim, a taxa de transferência deixaria de ser paga a esse órgão.
De acordo com a deliberação, no caso de aquisição do veículo pelas concessionárias, a anotação no Renave da entrada do veículo no estabelecimento gera os mesmos efeitos da transferência de propriedade e substitui o comprovante, que é previsto no Código de Trânsito Brasileiro. Ou seja, assim que a concessionária emitir a Nota Fiscal Eletrônica de entrada, o veículo ficaria registrado no Renave como “em estoque”. Por ter os mesmos efeitos da transferência, o antigo dono do veículo ficaria isento de qualquer responsabilidade sobre infrações de trânsito.
Com o novo sistema, quando o consumidor faz a compra na concessionária, ele deve comparecer ao Detran com o CRV preenchido e com a nota fiscal da compra, efetivando a transferência de propriedade. O comprador continua pagando a taxa de transferência ao Detran. A regra para a venda de veículos usados entre particulares não muda.
Burocracia
O sistema foi anunciado pelo Ministro das Cidades, Gilberto Kassab, em setembro do ano passado e estava programado para começar a vigorar no dia 1.º de março, o que não deve acontecer, pois a normativa do Contran ainda precisa passar por regulamentação. Uma reunião já foi marcada para esta quarta-feira (24) para deliberar sobre o assunto, reunindo representantes do Denatran e dos setores interessados.
De acordo com o presidente da Federação Nacional das Associações de Veículos Automotores (Fenauto), Ilídio dos Santos, a medida foi uma reivindicação do setor automobilístico como um todo, já que a burocracia na transferência dos veículos causam perdas às concessionárias. Para Santos, somando os custos das taxas de transferência com os dias que o veículo fica parado no pátio sem a possibilidade de venda, os gastos ficaram próximos aos R$ 980. “Entendemos que esta transferência não é necessária, já que a mercadoria está em trânsito. O Renave deve simplificar isto, já que bastaria uma simples comunicação ao Denatran, que reduzirá não só os custos mas o tempo que a mercadoria fica parada, que hoje é de cerca de 15 dias”, explica.
Novo sistema pode baixar a arrecadação
Dados da Federação Nacional das Associações de Veículos Automotores (Fenauto) mostram que, em janeiro, 98.811 carros seminovos e usados foram vendidos no Paraná. Se a transferência desses veículos dos antigos donos para as concessionárias deixasse de ser paga, representaria uma baixa de R$ 26,6 milhões em um mês.
O diretor-geral do Detran-PR, Marcos Elias Traad da Silva, que também preside a Associação Nacional dos Detrans (AND), afirma que a medida não deve entrar em vigor já no dia 1.º de março, já que há uma série de questionamentos feitos ao Denatran que devem ser revistos. De acordo o diretor, além da perda de arrecação, a entidade questiona a segurança jurídica que o Renave poderá trazer para o usuário. “Não houve uma consulta aos Detrans sobre a viabilidade na normativa, pois é preciso uma visão completa do sistema de transferência dos veículos para que o sistema funcione”, diz.
Ainda de acordo com o diretor, não há um balanço formal sobre a baixa de arrecadação que as novas regras podem trazer aos estados. “Isso porque não há regulamentação da medida, é impossível saber o quanto isso impactaria as receitas do Detran”, afirma. Um grupo de trabalho foi criado entre a AND o Denatran e o setor automobilístico para discutir alternativas que garantam mais segurança no momento da transferência de veículos. “Não estamos buscando inibir a atividade dos comerciantes, mas garantir que o cidadão não saia prejudicado”. Ainda não há data para que o grupo de trabalho se reúna e delibere sobre a questão.
Legalidade
Algumas entidades questionam a legalidade deste processo, já que não seria competência da União abrir mão taxas estaduais, regulamentadas pelas Assembleias Legislativas dos estados. O presidente da Federação Nacional dos Despachantes Públicos, Everton Calamucci, entrou com uma Ação Pública pedindo a suspensão desta nova medida. De acordo com Calamucci, a forma com que a deliberação está colocada, o cenário é de insegurança jurídica. “Existem muitos pontos que não são explicados pela deliberação do Contran. Em um primeiro olhar, as novas regras parecem boas, mas podem gerar problemas para o cidadão, já que não há certeza se o carro que é vendido a outra pessoa seria de fato transferido quando a compra fosse efetuada pela loja”, explica.
Procurado pela reportagem, o Ministério das Cidades afirmou que todos os estudos realizados para a elaboração do texto serão apresentados na reunião do Contran no dia 24. De acordo o Ministério, a deliberação será revista e não cabe posicionamento enquanto o novo texto não for aprovado.
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