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Defesa

"O Brasil não prende muito, ele prende mal", rebate procurador

O procurador da República e relator do projeto na comissão que analisa a reforma no Senado, Luiz Carlos Gonçalves, considera que o Brasil pune pouco com a prisão os criminosos. "Ao contrário da lenda, o Brasil não prende muito, ele prende mal. Furtadores e pequenos estelionatários não são a clientela para as prisões fechadas e o nosso anteprojeto diz isto com clareza", argumenta. Em defesa da proposta, Gonçalves observa que a reforma propõe a redução da pena para furtos e nos casos mais simples de roubo. "Por outro lado, nos crimes violentos e nos crimes que causam grave lesão à sociedade, justifica-se o aprisionamento", salienta.

Segundo ele, a possibilidade de substituição de pena privativa de liberdade por medidas alternativas foi favorecida no anteprojeto. "Não é possível dizer que, se aprovado, o anteprojeto levará mais gente para a prisão. Penso que é exatamente o contrário, pois entre os crimes que mais encarceirizam atualmente, vários tiveram redução de pena", argumenta.

Sobre o fim do livramento condicional, o jurista não acredita que, por isso, mais gente ficará presa. "É mais favorável para o preso obter progressão de regime carcerário, para o semi-aberto ou aberto, do que ficar em livramento condicional."

Pontos positivos

O procurador defende ainda que o anteprojeto inovou com a criminalização do enriquecimento ilícito, que será um auxiliar poderoso no combate à corrupção. Na opinião dele, o projeto é equilibrado e, por isso, desagrada aos extremos dos dois lados do embate. Ainda segundo Gonçalves, há uma série de melhorias que colocam a proposta de lei em sincronia com a realidade atual, como a criação do crime de bullying. (DR)

O maior obstáculo para os administradores dos departamentos prisionais do Brasil é descobrir como criar vagas no sistema penitenciário na mesma velocidade em que as prisões são realizadas. No ano passado, a população carcerária no país era de 514 mil, em torno de 200 presos por 100 mil habitantes. O déficit é de aproximadamente 200 mil vagas. Por esse motivo, as propostas incluídas na reforma do Código Penal de extinguir o livramento condicional e a de colocar a prisão como pena do artigo 121 ao 543 aumentam a preocupação entre vários especialistas.

O Conselho Nacional de Secretários de Estado da Justiça (Consej) chegou a afirmar que caso a reforma permaneça como está os estados não conseguirão conter um "boom" carcerário. A presidente da entidade e secretária estadual da Justiça do Paraná, Maria Tereza Uille Gomes, irá até o Senado para expor aos legisladores a posição da entidade em favor do livramento condicional. A data ainda será definida. "É importante que, em determinado momento da pena, o apenado tenha condições de sair em liberdade mediante condições que devam ser fiscalizadas pelo estado, para que seja inserido no meio social", diz.

Para o membro da Co­missão de Defesa dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Dálio Zippin Filho, a reforma intensifica a cultura do aprisionamento no país. "Essas propostas são absurdas. Por qualquer coisa a pessoa vai presa. O país já vive um déficit de vagas. Não há condições de construir mais presídios na mesma proporção", explica.

Disciplina

De acordo com o professor de Direito Penal René Ariel Dotti, a segurança pública pode receber um impacto muito negativo. "Para todos os casos criminais se aplica a pena de prisão. Isso vai multiplicar a tragédia carcerária. Ainda mais porque eles eliminaram o livramento condicional", afirma. Na avaliação dele, a extinção da condicional é grave porque há mais de 100 anos o procedimento é, do ponto de vista do preso, uma esperança.

Ele ressalta que o mecanismo é uma medida de disciplina do cárcere. "Em razão desse livramento o preso procura manter um comportamento para não ter faltas disciplinares. Estão criando a cultura da rebelião, da revolta", argumenta.

Dotti e Zippin Filho defendem também o aprimoramento das penas alternativas. Segundo Dotti, a reforma do código comete exageros, como impor mais rigor nas penas para o cambismo e para a realização de rinhas de galo. "Já existem penas alternativas, como a pena de multa e prestação de trabalhos à comunidade, que são muito importantes", destaca.

Para o sociólogo Luís Flávio Sapori, do Centro de Estudos e Pesquisa em Segurança Pública da PUC-MG, o livramento condicional, da forma como ocorre hoje no Brasil, tem um problema grave: a falta de fiscalização. "Muitos criminosos em condicional cometem crimes. É preciso criar uma estrutura de acompanhamento de presos", afirma.

"Homicídio com dolo eventual" será redefinido

A defesa do ex-deputado estadual Luiz Fernando Ribas Carli Filho terá uma nova possibilidade de tentar livrá-lo do júri popular, caso a reforma do Código Penal seja aprovada. Esse panorama é uma hipótese possível, em razão da nova definição do homicídio por dolo eventual e pela criação de uma nova modalidade: a culpa gravíssima. O ex-parlamentar é acusado de causar a morte dos jovens Gilmar Rafael Souza Yared e Carlos Murilo de Almeida em um acidente de carro em 2009, em Curitiba.

A nova possibilidade para a defesa ocorre em razão de o homicídio com dolo eventual (pelo qual o ex-parlamentar foi denunciado e que ocorre quando se assume o risco de matar) ficar condicionado aos casos em que o agente do crime consentir ou aceitar causar o resultado do ato. Caso essa situação não esteja bem caracterizada, a denúncia pode ser transformada em homicídio por culpa gravíssima, o que impossibilitaria o Ministério Público de levá-lo a júri popular. Pela legislação, ele só seria julgado por representantes do povo em casos de homicídio doloso (com intenção de matar) ou por dolo eventual.

Segundo alguns especialistas, que preferiram não se identificar, a mudança coloca em xeque o dolo eventual. O principal argumento, em casos de embriaguez ao volante, é a hipótese de um condutor alcoolizado ser incapaz de consentir no resultado do crime.

Outro lado

O procurador da Re­­pú­­blica Luiz Carlos Gon­­çalves, relator da comissão de juristas que analisa o projeto no Senado, defende que haverá evolução da lei no caso de dolo eventual. De acordo com ele, o Código Penal hoje vigente é falho nessa questão. "O Código não diz nada, fala somente em ‘assumir o risco de produzir o resultado’. Esta imprecisão é que permite que ora o sujeito responda por homicídio ou lesão corporal dolosa, ora responda por homicídio culposo [sem intenção], cuja pena atual, pasme-se, é de apenas três anos", ressalta.

Na avaliação dele, o projeto resolve esta questão de duas maneiras: dizendo que o dolo eventual exige consentimento ou aceitação do resultado e criando a culpa gravíssima. Se aprovado, quem hoje recebe pena de no máximo três anos, poderá receber a pena de até onze anos (oito pela culpa gravíssima e mais três por dirigir embriagado).

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