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O Nobel de Economia deste ano premiou uma teoria que originalmente buscava responder a uma pergunta aparentemente não econômica: como promover casamentos bem-sucedidos? O americano Lloyd Shaple propôs equações matemáticas que, em tese, permitem unir casais que preencham suas expectativas mútuas. Ganhou o prêmio juntamente com o conterrâneo Alvin Roth, que testou o modelo em outros "mercados" em que o preço é incapaz de estabelecer o equilíbrio entre a oferta e a demanda de bens. Num mundo em que a lógica monetária cada vez mais invade as relações humanas, este Nobel é um alerta: o dinheiro não pode, nem deve estar acima de tudo, mesmo na economia.

A teoria de Shaple e Roth é especialmente válida para situações em que há limitações éticas para se estabelecer o preço de um bem. Não é aceitável que se pague para ter uma esposa ou marido. Tampouco é moralmente justificável que vagas em escolas públicas ou órgãos humanos sejam vendidos. Aliás, algoritmos que permitem a distribuição de alunos pelos colégios de uma localidade e que indicam a disponibilidade e compatibilidade de doadores para transplantes são casos práticos dos modelos matemáticos concebidos pelos ganhadores do Nobel.

A procura pela cara-metade, a educação pública e a doação de órgãos são exemplos de "mercados" – espaços de busca e oferta de bens materiais ou imateriais – em que o dinheiro não é desejável. São relações regidas por fatores não monetários, mas que ainda assim obedecem a princípios gerais de economia, no entendimento de Shaple e Roth.

A constatação de que há mais valores que a moeda – inclusive na economia – representa um esteio contra a excessiva "monetização" da vida, fenômeno contemporâneo que busca traduzir tudo em cifrões. Partidários dessa forma de ver o mundo tendem a propor soluções para os desafios humanos em termos de custos e ganhos financeiros. Há poluição? Taxe-se, então, os poluidores. Crianças não querem estudar? Pague a elas mesada se tirarem boas notas. Um político pretende se eleger? Invista muitos recursos na campanha.

Neste mundo profundamente "monetizado", quem tem dinheiro pode poluir mais, estudar mais e eleger seus representantes. É isso que se deseja? Que valores restarão se todo o valor for o do dinheiro? Essas intrigantes perguntas têm sido feitas pelo filósofo americano Michael Sandel, autor do livro O que o dinheiro não compra, lançado recentemente.

Sandel afirma que, sem que a sociedade refletisse adequadamente, o paradigma monetário ultrapassou o campo do bem-estar material e hoje influi nas relações pessoais, na saúde, na educação e na vida cívica. O Nobel deste ano dá um pouco de luz à discussão: nem mesmo na economia o dinheiro resolve tudo. Quem dirá no resto.

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