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Madalena Kolecha, moradora do Faxinal Papanduva de Baixo, em Prudentópolis: vida simples | Josué Teixeira / Gazeta do Povo
Madalena Kolecha, moradora do Faxinal Papanduva de Baixo, em Prudentópolis: vida simples| Foto: Josué Teixeira / Gazeta do Povo

Produção

Criação animal à solta tem potencial turístico, mas é inadequada

O modo de vida nos faxinais tem um potencial econômico ainda inexplorado. "As pessoas que não são daqui ficam impressionadas ao ver que os animais voltam sozinhos para a propriedade, sem precisar chamar, quando está entardecendo", diz o faxinalense Marcelo Kolecha, citando isso como uma atração turístico. Conforme Margit Hauer, do IAP, a criação de suínos poderia ser uma fonte de renda. "Na Espanha, há algumas comunidades que consomem a carne de animais criados soltos porque ela é mais saborosa", diz.

No faxinal em Prudentópolis ainda há resistência. "O porco é criado para nós mesmos, não dá para vender no mercado porque é preciso seguir as normas sanitárias", completa o irmão mais velho de Marcelo, Jacó Kolecha, que é produtor de mel e tem um mercadinho no povoado. Ele diz que os faxinalenses precisam diversificar a produção de suas propriedades, mas reconhece a dificuldade. "Os faxinalenses só produzem milho, feijão e fumo. Eles não mudam porque têm medo de arriscar", aponta.

Para Margit, a diversificação e a geração de renda dentro dos faxinais são uma alternativa para a fixação no campo, principalmente dos jovens. "O problema é o mesmo da agricultura familiar, o jovem vê mais opções na cidade, mais conforto. Nos faxinais, ficam as pessoas mais velhas. Mas nós estamos tentando reverter isso", aponta. Ela considera que a evasão tem como consequência imediata a venda da propriedade e o risco de extinção do sistema faxinal, já que o novo comprador pode usar a terra para a agricultura moderna, como a plantação de soja, que não tem o mesmo perfil ambiental que o faxinal.

  • Museu Baba Madalena fica em uma das casas dos primeiros moradores
  • Cadastro estadual tem incluído outros faxinais: animais soltos são característica principal

Quando Madalena Zaka­­lugem Kolecha, 80 anos, foi morar ainda criança em Papanduva de Baixo, a 25 quilômetros do centro de Prudentópolis, no Centro-Sul, a região ainda era tomada pela floresta de araucária e pés de erva-mate nativos. Com o passar do tempo o cenário mudou, mas o local se consolidou como um faxinal e manteve algumas características originais, como a criação de animais à solta no povoado. Há um ano, os Kolecha montaram um museu na casa de madeira onde Madalena passou a infância com o objetivo de atrair turistas para a comunidade.

A visitação turística tem ajudado no orçamento familiar. Essa e outras iniciativas são incentivadas pelo Instituto Ambiental do Paraná (IAP) porque geram renda e, ao mesmo tempo, conservam as características do sistema. Os faxinais são comunidades rurais que usam os recursos naturais de maneira coletiva. Conforme a Lei Estadual 15.673, de 2007, as suas principais características são a produção animal à solta, a produção agrícola de base familiar e de subsistência, o extrativismo florestal de baixo impacto ambiental e a manutenção de laços de solidariedade comunitária. Embora sejam característicos do Paraná, também há registros desse tipo de comunidade no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina.

Tradição

As comunidades autênticas estão desaparecendo no estado. No começo da década de 90 havia 118 faxinais conhecidos. Um decreto paranaense de 1997 reconheceu os faxinais e a lei estadual de 2007 reforçou a existência do sistema como comunidades tradicionais e, portanto, passíveis de proteção.

Recentemente, o governo iniciou o cadastramento dos faxinais. O processo é antecedido de uma reunião pública para ouvir a opinião da comunidade. Hoje são 24 faxinais cadastrados no estado. No ano passado foram feitas duas reuniões na área rural de Ponta Grossa, nos Campos Gerais, e de Irati, no Centro-Sul. No início de abril, mais uma reunião foi promovida em Pinhão, também no Centro-Sul, para discutir o reconhecimento de três faxinais.

A partir do cadastramen­to, o faxinal pode ser be­­neficiado pelo repasse do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) Ecológico e ainda é considerado Área Especial de Uso Regulamentado (Aresur).

O processo é coordenado pelo IAP e a preocupação em proteger o sistema se justifica pelo ponto de vista ambiental. A en­­genheira agrônoma e chefe do Departamento Socioambiental do IAP, Mar­git Hauer, lembra que o faxinal preserva as araucárias e utiliza técnicas de agricultura tradicionais sem afetar o meio ambiente. Ela cita como exemplo a inexistência do confinamento de animais. "Os porcos são criados à solta e se alimentam dos frutos silvestres", diz.

EnvolvimentoFalta de planejamento e desarticulação afetam sustentabilidade

Para a presidente do Instituto Guardiões da Natureza – uma organização que trabalha com comunidades tradicionais – Vânia Mara Moreira dos Santos, é interessante que os faxinalenses sejam capacitados por políticas públicas para administrarem suas áreas. "Hoje temos o ICMS Ecológico, mas se os donos dessas propriedades e as prefeituras não souberem administrar o recurso, o dinheiro vai para ações mais emergenciais e não para planos de sustentabilidade do faxinal", diz. Ela cita, por exemplo, o uso do recurso do ICMS Ecológico para a construção de cercas e melhorias de estradas.

Para a pesquisadora pela Universidade Estadual de Ponta Grossa Cicilian Luiza Löwen Sahr, a desarticulação afeta a todos. "Há implicações econômicas, sociais, ambientais, políticas e culturais para os faxinalenses, que deixam de ter a relação que tinham com a terra, o que afeta sua concepção de mundo", diz. Os reflexos, segundo ela, repercutem em questões ligadas à reforma agrária, à política ambiental e a conservação das comunidades.

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