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Perda da Península Antártica, último “paraíso” dos pinguins, e medo do escuro poderão levar ao fim da espécie que atua como um termômetro da mudança climática | Andy Isaacson/ The New York Time
Perda da Península Antártica, último “paraíso” dos pinguins, e medo do escuro poderão levar ao fim da espécie que atua como um termômetro da mudança climática| Foto: Andy Isaacson/ The New York Time

Hábitat

Se acabar o gelo, animal desaparecerá

Usando restos mortais mumificados de pinguins, pesquisadores conseguiram reconstruir um longo histórico dos pinguins-de-adélia na Antártida. Segundo a reconstrução, na última era glacial os pinguins alteraram suas rotas migratórias e localizações de colônias, em resposta a avanços e recuos do gelo marinho. Entretanto, seu alcance aparentemente nunca ultrapassou o atual ponto ao sul, pela simples razão de que os pinguins-de-adélia parecem precisar de luz para se alimentar e navegar. A luz também dá segurança contra predadores.

"Os pinguins-de-adélia e imperadores possuem uma associação obrigatória com o gelo marinho", disse o pesquisador David Ainley. "Quando o gelo acabar, estas espécies acabarão". O Mar de Ross é previsto como o último local da Terra onde haverá gelo marinho. Mesmo assim, conforme o gelo anual de inverno recua cada vez mais ao sul, os pinguins podem terminar presos atrás de uma cortina de noite polar. De fato, diz Ainley, os pinguins-de-adélia enfrentam uma possível extinção não só pela perda do habitat, mas também por um inabalável medo da escuridão.

Pesca está favorecendo a espécie

O crescente apetite do consumidor pelo robalo chileno (chamado de merluza-negra na Antártida e na Patagônia) também pode estar beneficiando os pinguins do Mar de Ross. A pesca no Mar de Ross, inaugurada em 1996 e certificada como sustentável em dezembro pela organização não governamental Marine Stewardship Coun­cil (Conselho de Gestão Marinha), pode ajudar os pinguins-de-adélia ao reduzir a competição pelo peixe Pleuragramma antarcticum, espécie do tamanho da sardinha que serve de alimento para pinguins e merluzas-negras. O ecólogo David Ainley e colegas relataram ter visto menos orcas no sul do Mar de Ross desde 2002. As baleias se alimentam da merluza, e menos aparições sugerem que a pesca já está alterando o ecossistema.

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O Cabo Royds, lar da colônia de pinguins mais ao sul do mundo, é um promontório rochoso coberto de gelo sujo e guano rosado. Além do alarido dos filhotes, gritando com seus pais por restos regurgitados de krill, está o Mar de Ross, uma extensão do Oceano Pacífico que abriga mais de um terço da população de pinguins-de-adélia do mundo e um quarto de todos os pinguins-imperadores. Acima de tudo, este pode ser o último ecossistema marinho intacto do planeta.A colônia de pinguins é uma das mais estudadas do mundo. Dados sobre seus residentes, os pinguins-de-adélia, foram obtidos inicialmente na expedição realizada entre 1907 e 1909 por Ernest Shackleton, respeitado explorador britânico cuja cabana de madeira segue preservada perto dali.

"Este é o nirvana dos pinguins", disse em uma manhã de janeiro David Ainley, ecólogo da empresa de consultoria H.T. Harvey and Associates que estuda os pinguins do Mar de Ross há 40 anos. "Se você é um pinguim de gelo, não existe um lugar melhor".

Entre as espécies mais afetadas pelo aquecimento global, as mais óbvias são aquelas que dependem do gelo para viver. Os pinguins-de-adélia são um termômetro da mudança climática, e na margem norte da Antártida, na Península Antártica, suas colônias entraram em colapso à medida que uma intrusão de águas mais quentes reduz a estação de gelo anual do inverno.

Nas últimas três décadas, a população de pinguins-de-adélia na península, a nordeste do Mar de Ross, diminuiu em quase 90%. A única colônia de pinguins-imperadores na península hoje está extinta. A temperatura média do ar de inverno na Península Antártica Ocidental, uma das regiões de aquecimento mais rápido no planeta, subiu 6 graus celsius nos últimos 50 anos, gerando maior precipitação de neve. A neve enterra as rochas que os pinguins-de-adélia procuram a cada primavera para fazer seus ninhos, favorecendo as espécies que conseguem sobreviver sem o gelo e se reproduzem mais tarde – como os pinguins-gentoos, cuja população cresceu 14 mil por cento.

O clima mais quente na Península Antártica também afetou a cadeia alimentar, exterminando o fitoplâncton que se desenvolve sob blocos de gelo e o krill, uma das bases da dieta do pinguim. Esses dois organismos representam até 80% da alimentação dos pinguins, segundo um novo estudo, publicado na edição de maio de The Proceedings of the National Academy of Sciences.

No Mar de Ross, contudo, há uma tendência contrária: a cobertura de gelo marinho do inverno está aumentando e as populações de pinguins-de-adélia estão prosperando. A colônia de Cabo Royds cresceu mais de 10% ao ano até 2001, quando um iceberg do tamanho da Jamaica rompeu a plataforma de gelo do Mar de Ross, forçando os residentes a se mover 70 quilômetros ao norte para encontrar águas abertas. O iceberg apareceu em 2006 e hoje a colônia de 1,4 mil casais reprodutores está se recuperando vigorosamente. Do outro lado da Ilha de Ross, a colônia de pinguins-de-adélia em Cabo Crozier – uma das maiores conhecidas, com estimados 230 mil casais reprodutores – cresceu cerca de 20%.

Paraíso e purgatório

Para algumas colônias de pinguins, as mudanças climáticas criaram um paraíso; para outras, um purgatório. Mesmo assim, em longo prazo o destino de todos os pinguins-de-adélia e imperadores parece selado, enquanto o implacável aquecimento puxa o tapete de gelo marinho sob seus pés.

Alguns cientistas atribuem o aumento do gelo marinho no Mar de Ross ao persistente buraco na camada de ozônio, legado do uso humano de clorofluorcarbonos que resfriam a atmosfera superior acima do continente e elevam a diferença de temperatura em relação à atmosfera inferior e ao equador. Nos últimos 30 anos, isso gerou ventos de leste mais vigorosos no verão e outono. O aquecimento das latitudes médias da Terra está surtindo um efeito similar, aumentado a diferença de temperatura e enviando ventos mais fortes – que empurram o gelo marinho para longe da costa e expõem regiões de águas abertas, chamadas polínias. Nessas áreas, os pinguins-de-adélia que estão fazendo seus ninhos têm acesso facilitado a alimento.

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