• Carregando...

O estado do Rio de Janeiro tem a mais antiga Defen­soria Pública do país, instala­da em 1954, com 56 anos de atuação. Depois dela, insti­tuiu-se a Defensoria Pública de Minas Gerais, que fun­ciona há 29 anos.

Há precedentes históricos na defesa dos menos favorecidos economicamente no Brasil, por meio da disponibilização, pelo Estado, de advogado. Em 1935, o estado de São Paulo foi precursor ao adotar o primeiro serviço estatal de assistência judiciária do Brasil; não se tratava, ainda, de uma Defensoria Pública propriamente dita, mas pode tal órgão ser considerado como precursor daquela. A iniciativa foi seguida pelos estados do Rio Grande do Sul e de Minas Gerais. Em contraste com a iniciativa vanguardista tomada pelos paulistas em 1935, o próprio estado de São Paulo era, até o ano de 2006 (quando entrou em vigor a Lei Complementar 18/05), um dos poucos estados brasileiros carentes de uma Defensoria Pública instituída de acordo com a Constituição Federal de 1988 e a Lei Comple­mentar 80/94 – que prescrevem a Defensoria como órgão permanente e autônomo.

Hoje, dezembro de 2010, Paraná e Santa Catarina são os dois únicos estados brasileiros em que não ocorreu a institucionalização de Defensorias. Estão os dois ricos estados do Sul do Brasil em mora com a população carente há, simplesmente, 22 anos e dois meses. Quando informo isso em sala de aula, sou questionado por meus alunos curitibanos: "Professor, mas e aquele prédio que fica na esquina da Cruz Machado com a Alameda Cabral, lá tem uma plaquinha dizendo Defensoria Pública?!?!". Respondo-lhes: "Aquele é um prédio alugado, cuja plaquinha não espelha a realidade. Ele é ocupado por advogados indicados politicamente, não por Defensores concursados! O que falta ao Paraná é a criação da ‘Instituição’ Defensoria Pública, com servidores próprios, concursados e bem pagos – e não emprestados de outros órgãos estatais ou indicados politicamente".

A Defensoria Pública é classificada pela Constituição de 1988 como Função Essencial à Justiça (artigos 127 a 135, especialmente o 134 e seus dois parágrafos), juntamente com o Ministério Público, a Advocacia Pública (por exemplo, a Advocacia-Geral da União e as Procuradorias dos Estados e dos Municípios) e a Advocacia (da OAB, a comum, para aqueles que podem contratar advogado).

A considerar que a Cons­tituição também prescreve que "todos são iguais perante a Lei (...)" e garante que "(...) aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes" (artigo 5.º caput e inciso LV), só se pode concluir: a defesa é um direito humano fundamental de qualquer pessoa que se encontre em território nacional. Tal verdade se reflete também na seara internacional que afeta o Brasil (e o Paraná): é o que prescreve o artigo XI da Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948) e também o artigo oitavo, 2, "e", do Pacto de São José da Costa Rica.

Ora, se a defesa dos indivíduos – pobres ou não – é um direito humano, e não tendo o Paraná instituído formal – e organicamente – a sua Defensoria Pública estatal, pode-se dizer que, por isso: (1) o Brasil, por conta da omissão paranaense, pode ser denunciado à Comissão Intera­mericana de Direitos Humanos, com sede em Washington, pelo descaso com os pobres no território deste estado federado, e, em consequência disso, condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, de São José da Costa Rica; (2) cabe Mandado de Injunção para a regulamentação da fruição do direito fundamental à defesa (artigo 5.º, LXXI); (3) cabe também Ação Direta de Inconstitu­cionalidade por Omissão (artigos 102, I, "a" e 103 da CF/1988).

No campo político, o assunto "Defensoria Pública do Paraná" tem sido debatido pelo governador cujo mandato se encerrará dentro de poucos dias, bem como pelo governador eleito. O primeiro quer instituí-la, deixando-a como marco de seus últimos dias à frente do Executivo. O eleito entende que a criação de tão importante órgão, ao apagar das luzes de um governo, não é salutar aos cofres públicos. É o que se noticia.

A verdade é que todos os governadores que estiveram à frente do Executivo paranaense, desde 5 de outubro de 1988, omitiram-se, e não será agora, em poucos dias de mandato, que se arquitetará algo tão grandioso e que deveria estar em pleno funcionamento há tanto tempo. Omitiu-se, igualmente, a Assem­bleia Legislativa.

O fato é que o governador eleito deverá cumprir a Constituição da República, e o povo deve dele cobrar a criação efetiva da Defensoria Pública do Estado do Paraná no prazo máximo de seis meses. Ouso marcar data: até o dia 1.º de julho de 2011. Caso contrário, o Paraná continuará a dar um péssimo exemplo ao Brasil, o que é uma vergonha!

Alexandre Coutinho Pagliarini é pós-doutor em Direito Constitucional pela Universidade de Lisboa; doutor e mestre pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]