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Conflito agrário - Caso encerra 3 anos sem mortes

O superintendente do Incra no Paraná, Celso Lisboa de Lacerda, lamentou ontem o episódio em Santa Tereza do Oeste, que quebrou uma seqüência de três anos sem registro de mortes em conflitos no campo no Paraná. Lacerda diz que a reforma agrária "caminha num terreno muito ideologizado, em prejuízo à causa". Segundo ele, tanto os contrários quanto os favoráveis ao assentamento de famílias sem-terra têm apresentado posições radicais. "E a radicalização é perigosa para todos os lados e atrasa as possibilidades de reforma agrária".

Lacerda diz que o conflito agrário precisa ser tratado no país como um problema social. "Esse episódio não é um caso policial e não se deve tratar aquelas pessoas como bandidas. É claro que ocorrem desvios e existem oportunistas como em qualquer movimento. Mas o conflito precisa ser tratado de forma técnica", diz. Em função da gravidade do caso, o ouvidor agrário nacional, Gercino José da Silva Filho, chegará hoje em Cascavel. (CH)

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seção Cascavel, responsabilizou o governo do Paraná pela reocupação da fazenda experimental da multinacional Syngenta Seeds, em Santa Tereza do Oeste (Oeste do Paraná), que terminou com a morte de duas pessoas no confronto armado entre seguranças e sem-terra, no último domingo. Em nota oficial, a OAB afirmou que o estado está agindo com "fraqueza e falta de vontade".

A preocupação, segundo Luciano Braga Cortes, presidente da seção da OAB em Cascavel, é que o governo vem "reiteradamente descumprindo ordens judiciais gerando um sentimento de instabilidade e impunidade". "Não quero entrar no mérito de quem está certo (empresa ou sem-terra), mas esse desrespeito às ordens da Justiça alimenta ações como essa (ocupação)", afirmou.

Por telefone, o presidente da OAB no Paraná, Alberto de Paula Machado, se manifestou sobre o caso. "Para a garantia do estado democrático de direito as partes, no caso o MST e o governo, devem cumprir às ordens do Poder Judiciário. Ou cumpre ou recorre, o que não pode é descumprir a ordem judicial porque se não passamos a viver numa barbárie", comentou.

Em nota divulgada no fim da tarde de ontem, no site oficial do governo do estado, a Secretaria da Segurança Pública do Paraná repudiou as declarações do presidente da OAB em Cascavel. "Justificar a ação de grupos armados no campo é justificar ação de bandidos que ignoram as leis. Nós não desrespeitamos as leis, tanto é que cumprimos uma média de uma reintegração a cada dez dias sem que uma pessoa morresse no campo", disse o secretário Luiz Fernando Delazari.

No caso da última ocupação na fazenda da Syngenta, a Polícia Militar do Paraná não cumpriu a ordem judicial de reintegração de posse. Após esgotados todos os prazos estipulados pela Justiça, os integrantes do MST resolveram desocupar a área depois que o juiz de Cascavel fixou multa pessoal ao governador Roberto Requião para cada dia de desobediência da determinação da justiça.

Ainda na nota divulgada no site do governo, a secretaria informou que policiais civis e militares de Cascavel afirmaram que os seguranças já chegaram atirando contra os sem-terra na Syngenta. De acordo com o documento, existe um vídeo, ainda não divulgado, entregue pelos trabalhadores sem-terra à Polícia Civil, que registra o momento da chegada dos atiradores na fazenda.

Destacado para acompanhar o caso, o coronel Celso José Mello, Comandante do Policiamento do Interior, disse, por telefone, que ainda não é possível afirmar que os seguranças iniciaram o confronto armado. "É muito cedo para fazer este juízo de valor e julgar o fato antes da hora. O inquérito começou agora", disse.

Por meio de sua assessoria, a Syngenta refutou qualquer tipo de acusação que a responsabilize pelo tiroteio entre seguranças e sem-terras. A empresa lamentou profundamente as duas mortes e esclareceu que em nenhum momento autorizou o uso da força e de armas para manter a segurança do local. Inclusive, informa a assessoria, o contrato firmado com a empresa de segurança prevê que os funcionários trabalhem desarmados.

Conflito armado

No domingo, cerca de 150 sem-terra invadiram a fazenda. Houve tiroteio entre seguranças e sem-terra e duas pessoas morreram – o segurança Fábio Ferreira de Souza e o líder sem-terra Valmir Mota de Oliveira, conhecido como Kenun. Pelo menos outras sete pessoas ficaram feridas – uma em estado grave. Os corpos de Souza e Kenun foram sepultados ontem.

Nove sem-terra prestaram depoimento e a maioria foi liberada em seguida. Apenas um homem, Domingos Barete, permaneceu preso, mas por causa de dois mandados de prisão expedidos pela Comarca de Catanduvas, por furto qualificado. Já os sete seguranças detidos no dia da invasão continuam presos e serão indiciados por homicídio doloso e formação de quadrilha.

Um revólver calibre 38, registrado em nome da empresa de segurança da Syngenta, foi entregue à polícia pelos próprios sem-terra. "Houve mortes e feridos dos dois lados, o que mostra que realmente ocorreu um tiroteio. Mas me parece que há um tratamento desigual numa situação parecida. Os sem-terra foram liberados e os seguranças presos", disse o advogado da NF Segurança, Hélio Ideriha Júnior, que estranhou o fato dos sete seguranças terem sido presos em flagrante e indiciados por homicídio doloso enquanto os sem-terra envolvidos no tiroteio foram ouvidos e liberados.

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