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Batida da Rone na Vila Icaraí: população prefere chamar o xerife | Fotos: Daniel Derevecki/Gazeta do Povo
Batida da Rone na Vila Icaraí: população prefere chamar o xerife| Foto: Fotos: Daniel Derevecki/Gazeta do Povo

Polícia paralela é risco para a comunidade

O sociólogo Pedro Bodê, coordenador do Centro de Estudos sobre Segurança Pública e Direitos Humanos da UFPR, diz que o risco da ação de uma polícia paralela é o pior possível. "Esta prática produziu o justiceiro em São Paulo, a milícia no Rio de Janeiro, e um pouco antes os grupos de extermínio. São aparelhos e aparatos paralelos ao Estado. Este é o pior dos cenários e deve ser combatido, porque usurpa do Estado o dever de fazer segurança pública. E aí, neste aspecto, a tolerância tem de ser zero." O especialista lembra ainda que, fora o Estado, só as empresas de segurança registradas e reconhecidas pelo próprio Estado podem atuar nesta área.

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Violência que não entra nas estatísticas

Os bairros Alto da XV, Hugo Lange e Juvevê estão entre os bairros com menores índices de homicídios dolosos ocorridos em Curitiba no ano passado. Segundo os dados oficiais, são lugares calmos, onde não ocorrem assassinatos. Mas a experiência vivida pelo comerciante José Mainheriche, 50 anos, mostra que a sensação de insegurança independe das estatísticas.

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Os cinco bairros mais violentos de Curitiba, onde ocorreram 60% dos homicídios registrados no ano passado, estão colocando cada vez mais nas mãos de justiceiros, xerifes, seguranças clandestinos, patrões do tráfico de drogas e líderes comunitários o papel que caberia à polícia. Nestes lugares, a figura do Juvenal Antena, personagem interpretado pelo ator Antônio Fagundes na novela Duas Caras, na fictícia favela Portelinha, está se tornando real.

Segundo estatísticas da Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp), 353 dos 589 homicídios registrados no ano passado aconteceram nos bairros Cajuru, Cidade Industrial de Curitiba (CIC), Sítio Cercado, Uberaba e Tatuquara. Embora o governo tenha afirmado, no início do ano, que "congelaria" a violência nessas regiões, não há dados oficiais que confirmem esse quadro. A secretaria já divulgou o balanço de homicídios no primeiro semestre de 2008, mas não detalhou os dados por bairros, como fez no ano passado. Segundo a Sesp, "elas (as informações) são de uso exclusivo da polícia, que as usa em estratégias para mapear e combater os locais onde a criminalidade está atuando".

Segundo moradores, porém, nada mudou. A reportagem da Gazeta do Povo percorreu, na semana passada, os cinco bairros considerados perigosos em Curitiba. A maioria das pessoas ouvidas diz que só chama a polícia quando acontece um homicídio, ou só a enxerga nas redondezas nas batidas da Rone (Ronda Ostensiva de Natureza Especial). O resto é resolvido pela própria comunidade.

Embora seis entre dez crimes contra a vida tenham ocorrido nesses bairros, a sensação de insegurança não é restrita a quem vive por lá. Afinal, os cinco bairros mais violentos não estão isolados. O bolsão Audi/União, por exemplo, fica entre a BR-277 (caminho das praias paranaenses) e a Avenida das Torres (corredor entre Curitiba e o Aeroporto Internacional de São José dos Pinhais), onde há cerca de 3 mil domicílios e aproximadamente 15 mil moradores.

Xerife

Na Vila Icaraí, o local mais humilde e violento do Bolsão Audi/União, o xerife faz o papel da polícia, contam os moradores. "Aqui tem mortes, coisas bárbaras, mas é bandido contra bandido: maloca contra maloca. No entanto, a gente não chama a polícia. Não tem sentido a sua presença aqui. Quem resolve os problemas é o xerife – o patrão", diz Odair (nome fictício).

O morador conta detalhes de como um xerife age na Icaraí. "Quando acontece um furto aqui dentro, não compensa chamar a polícia. A gente pede ajuda para as pessoas respeitadas (temidas) dentro da comunidade. Elas fazem devolver o objeto e pronto. Eu não sei se ele é traficante, mas todo mundo sabe que ele não pensa duas vezes para tomar uma decisão. Só que as pessoas o respeitam. Elas têm medo é da polícia", diz.

Vanderléia (nome fictício), 36 anos, mãe de cinco filhos (o mais novo tem 2 anos, o mais velho 16 anos), vive há quatro anos na Vila Icaraí. Para ela, a segurança ali é péssima. "Não dá para sair de casa. Os nossos filhos são ameaçados na rua. Ocorrem muitos arrombamentos, assaltos e outros crimes."

Mas o presidente da Associação dos Moradores da Vila Jardim União, Altair Góis, diz que o Bolsão Audi/União não é tão violento como representa ser, pelo menos na Vila União, que faz divisa com a Vila Icaraí. "Aqui o último homicídio aconteceu há cerca de um ano", diz.

A BR-277 separa o Uberaba e Cajuru, dois dos cinco bairros campeões de homicídios. Dentro do Cajuru, a Vila Trindade é famosa pela ação de traficantes. Segundo comerciantes, os problemas do local são o tráfico de drogas e os assaltos, principalmente a lojas de cosméticos e farmácias – a farmácia da Rua da Trindade está sendo vendida porque já foi assaltada 28 vezes. "O negócio é ter segurança própria (clandestina) contra os assaltos, porque aqui ninguém é furtado", conta um comerciante.

No Sítio Cercado, quem vê o construtor José Ribeiro, 47 anos, não consegue perceber a importância que este homem tem na região. Presidente da Associação de Bairros da Moradias 23 de Agosto, na Vila Osternack, no bairro Sítio Cercado, é um homem simples, bem-humorado e diz resolver tudo por meio da conversa. Ele é um dos "Juvenais" de regiões que precisam de um líder e de alguém que resolva os problemas da comunidade.

Ribeiro diz ter a militância na veia, pois seus pais foram os primeiros a invadir as terras da família Gabardo, há 15 anos. "Aqui não tem roubo. O pessoal não deixa ninguém entrar, e as brigas de gangues são controladas. O importante é se proteger como pode e manter a tranqüilidade."

Sobre a atuação dos "xerifes", a Sesp informou em nota que "é necessário que a população registre as ocorrências policiais, para que a polícia possa ter ciência de onde estão se concentrando os crimes e assim poder combatê-los e reduzir os índices de criminalidade".

Serviço:

As estatísticas sobre a segurança pública de Curitiba e outras regiões do estado estão no site www.seguranca.pr.gov.br, no qual são divulgados relatórios trimestrais sobre criminalidade.

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