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Adriano, Caroline, a diretora Célia, Lucas e José Paulo: desejo de que o mercado responda ao empenho de quem estudou | Pedro Serápio/Gazeta do Povo
Adriano, Caroline, a diretora Célia, Lucas e José Paulo: desejo de que o mercado responda ao empenho de quem estudou| Foto: Pedro Serápio/Gazeta do Povo

Anote

A virtude está no ensino médio

Educação de Jovens e Adultos (EJA)

Em 2008, apenas no Núcleo Estadual de Educação de Curitiba, mais da metade das matrículas no ensino médio passaram a ser do modelo regular, moderando o avanço da EJA. O núcleo de Curitiba corresponde a 10% da rede estadual de ensino. No estado todo, de um ano para outro, houve redução de 16 mil alunos de educação de jovens e adultos, garantindo essa modalidade para os que têm grande defasagem idade e série. Um a cada três jovens no Brasil vive esta situação.

Ensino regular

Dos mais de 600 mil alunos do ensino médio no estado, 532 mil estão no regular. Caso consiga manter esse ritmo, o Paraná tende a fortalecer, nos próximos anos, sua parcela de jovens com formação básica, compatíveis com as exigências do mundo do trabalho. Hoje, apenas 54,3% dos alunos estão na série adequada, portanto, menos sujeitos à evasão.

Desafio

O Paraná tem 1,8 milhão de jovens, 900 mil na escola, 600 mil no ensino médio e 350 mil na faixa adequada para o antigo colegial. Diminuir esse funil deve ser a prioridade do próximo secretário de estado da Educação.

Fontes: Seed, Ritla e IBGE.

Sob as bênçãos de Paulo Leminski

José Paulo Porrat tem 19 anos, é terceiranista e quer ser advogado. Lucas Müller, de 18, seu colega de classe, quer cursar Gestão da Informação e sonha com a vida política: já se filiou ao PSDB. A matogrossense Caroline Garcia, 17 anos, vai fazer carreira em Publicidade. E o paraense Adriano Saldanha, 19 anos, não só se prepara para o vestibular de Letras como já engatinha na vida literária. Ele encerrou a roda de conversa com a reportagem da Gazeta do Povo com um conto escrito à mão, fazendo jus à fama da escola em que estuda, o Colégio Estadual Paulo Leminski, no bairro Tarumã, em Curitiba.

O encontro foi acompanhado pela diretora da instituição, a professora Célia Luzzi, e serviu de termômetro sobre a quantas anda o ensino médio. A contar pelo quarteto – articulado e crítico – pode ser o melhor dos mundos, mostrando que não investir no professorado que lida com essa faixa etária merece um atestado de insanidade. Hoje há 4,8 mil professores do estado em formação continuada – metade deles em tempo integral. A expectativa é que o ensino médio tire proveito do programa.

Outro indicativo é a festejada diversidade da escola pública. Lucas é egresso de uma das melhores escolas particulares de Curitiba, o Medianeira. Caroline estudou na rede privada da rica Sinop, no Norte matogrossense. A família de José Paulo tem opção pelo ensino oferecido à população. E Adriano vem de uma família de poucas letras. Migrou do Norte para Curitiba por ouvir dizer que aqui havia melhores condições de ensino.

Resistência

Dificilmente esse grupo se encontraria noutro lugar não fosse o Colégio Paulo Leminski – instalado em uma antiga instituição correcional e hoje convertido num dos melhores desempenhos do Enem. Célia, a diretora, assim como a nova coordenadora do ensino básico da Secretaria de Estado da Educação, Fátima Navarro, têm reservas à maneira como os rankings são divulgados. Por isso, preferem se referir à Leminski como uma escola de resistência, que manteve o curso do Magistério no início da década, mesmo com a ordem de que fosse fechado. Hoje, tem uma dezena de cursos profissionalizantes e funciona como uma usina de conhecimento.

Os alunos reconhecem a valentia da escola. Mas não deixam de reconhecer, qual técnicos do Ministério da Educação, os abalos a que está sujeito o ensino médio. Viram colegas desistir da sala de aula. Cons­tatam que muitos não veem serventia no que aprendem. E que os professores padecem para tornar o conhecimento atraente para uma faixa etária seduzida por computadores e automóveis.

Mesmo para eles, que abraçaram o ensino, a escola tem de representar um avanço na vida profissional. "Não quero ganhar pouco a vida toda", diz José Paulo, que trabalha no Fórum Civel. A diretora Célia, com Paulo Freire na ponta da língua e uma sala toda decorada com as fotos do documentarista Sebastião Salgado, bem que tenta avivar no grupo a ideia de que a gente não estuda para ganhar dinheiro. Eles concordam. Mas permanecem pragmáticos.

"Sinto angústia. Penso onde o que aprendi vai me levar. Já sugeri que houvesse a disciplina Matemática Financeira", pontua o articulado Lucas. "A sociedade precisa incentivar o ensino médio", reforça. Caroline faz um quase apelo: "Poxa vida, queria que meu esforço fosse valorizado."

O Brasil festeja a universalização do ciclo básico – cuja cobertura ultrapassa 97% – e a significativa presença de estudantes no ensino universitário. Superou-se a vexatória taxa de 4% da população com curso superior, cifra arrotada, durante décadas, em discursos de formatura, numa celebração estranha ao nosso apartheid educacional. Hoje, estima-se, os "com canudo" beiram os 13% da nação e, ainda que com ressalvas à qualidade, reconhece-se que foram dados passos largos para uma nova ordem educacional.

Todos esses esforços de inclusão e expansão, contudo, criaram para o ensino médio o efeito "esqueceram de mim". Literal­mente no meio, os três anos do antigo colegial ficaram num estágio de indefinição que preocupa educadores, mobiliza técnicos e atordoa governos.

A maior sangria está na evasão escolar, cujos índices são superiores a 50%, caso se leve em conta quantos concluem o fundamental e quantos chegam ao terceiro ano. O problema é de tal monta que pode ser equiparado a dilemas como as mortes no trânsito ou a epidemia do crack.

Deficiências

Os maus-tratos ao ensino médio são de uma tradição medieval. Basta pensar no desmanche dos cursos profissionalizantes, que por décadas, ainda que debaixo de uma saraivada de críticas, eram um bom motivo para brasileiros de baixa renda permanecerem na escola. Não bastasse, em se tratando da educação um processo paulatino, o ensino médio ainda arca com todas as deficiências do ciclo fundamental e carece de recursos à altura. Estudos institucionais, como os apontados pelo próprio ministro da Educação, Fernando Haddad, indicam que os investimentos por aluno/ano deveriam ser no mínimo de R$ 2 mil, quando hoje não ultrapassam R$ 1,4 mil.

Dados do IBGE divulgados este mês reforçam a impressão de que os adolescentes do médio estão à beira do caminho. O Brasil conta com cerca de 35 milhões de jovens entre 15 e 24 anos – 18,5% da população do país. O contingente forma a chamada "bolha demográfica". Se essa massa atingir melhores níveis, as chances de desenvolvimento crescem sobremaneira. O contrário disso é um atraso que remeterá o país ao tempo das cavernas. Só resta vencer.

A conta é conhecida, mas mesmo assim, algo como 2 milhões de brasileiros entre 15 e 17 anos estavam fora da escola no ano passado, redundando num dos maiores desperdícios de potencial humano de que se tem notícia. A esse número se soma a informação de que mais de 50% dos que cursam o ensino regular ou profissionalizante têm defasagem idade-série, o que os aproxima perigosamente da situação de abandono.

Relatório

Há três anos, a Rede Latino-Americana de Informação Tecnológica (Ritla) fez o alerta ao publicar o estudo Relatório de Desenvolvimento Juvenil, dando contas da fragilidade do ensino médio em terras tupiniquins. Desde então, quem acompanhou as páginas de educação na imprensa pôde conferir detalhes da maré baixa a que estão sujeitos os escolares adolescentes. Mesmo assim, não há muitas políticas dignas de nota. Nesse cenário, um dos poucos estados que se destaca é o do Paraná (leia na página seguinte).

Os dados da Ritla e de demais fontes disponíveis invariavelmente mostram a dificuldade da escola em falar com o estudante acima de 15 anos, de mantê-lo nas instituições e de ajudá-lo a superar deficiências trazidas dos oito primeiros anos de escolaridade. De todos os quadros, contudo, um dos mais assustadores é o que aponta para a desvalorização do ensino médio no mundo do trabalho, o que indica o pouco caso do capital com a juventude.

Concluir os três anos "mé­­dios" não representa, como em tempos idos, uma boa colocação no mercado do trabalho, quando secundaristas se tornavam bancários ou técnicos de proficiência reconhecida. O desmanche dos cursos profissionalizantes – moda que pegou no início dos anos 2000 – só veio reforçar essa tendência. O preço da maldade do mercado em premiar quem passou 11 anos em sala de aula é o desestímulo em continuar.

Inadequação

Não há estudos conclusivos, mas a baixa frequência no ensino médio tem a ver com a inadequação de linguagem dos professores – pouco preparados para lidar com adolescentes de uma sociedade de violência, competição e cada vez mais seduzida por avanços tecnológicos. Não raro, secundaristas apontam a dificuldade em ver utilidade no que aprendem em sala de aula. Um dos efeitos é a migração para os EJAs – a educação de jovens e adultos, distorcendo a intenção do programa, que é o de atender estudantes mais velhos, há tempos afastados da escola, e não adolescentes em condições de fazer cursos regulares.

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