Numa banca do Centro Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas, no Rio de Janeiro, o goleiro Bruno Fernandes já foi condenado pelo sumiço da ex-amante Eliza Samudio. A "condenação" está num folheto de cordel vendido na feira. Nele, o jogador suspenso do Flamengo é apresentado como responsável pelo crime. "Bruno com seus amigos/ Em ato que traz repúdio/ De forma vil e cruel/ Matou Eliza Samudio/ Como em filme de terror/ Produzido num estúdio", contam os versos do folheto de Isael de Carvalho.

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Outros casos policiais também foram contados em sextilhas, estrofe de seis versos usada em cordéis. Esse tipo de literatura veio de Portugal na colonização e o nome vem da forma como os folhetos eram expostos para venda, pendurados em cordas ou barbantes. A poesia se popularizou no Nordeste, primeiro de forma oral e depois escrita.

"A função do poeta é ser jornalista", afirma José João dos Santos, 78 anos, o Mestre Azulão, membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel. "No Nordeste, o que acontecia no Brasil e no mundo, o cordel espalhava. Agora, já tem até televisão, mas o povo que gosta de poesia só acredita num acontecimento quando lê na literatura de cordel."

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Mestre Azulão pôs em versos a mor­te da Isabella Nardoni, pela qual o pai dela, Alexandre Nardoni, e a madrasta, Anna Jatobá, foram con­­denados em março. "Lhe apertaram o pescoço/ Asfixiando Isa­bel­­la/ Julgando que estava morta/ Com faca cortaram a tela/ Naquele horroroso drama/ Pisando em cima da cama/ Lhe atirou pela janela."

Em 2007, a morte de João Hélio também foi narrada por ele. O menino, então com 6 anos, morreu ao ser arrastado pelas ruas do Rio, preso ao cinto de segurança do carro da família, levado por assaltantes. "João Hélio Fernandes foi/ Aquela pobre criança/ Que teve uma morte horrível/ Da mais estúpida vingança/ Dos monstros enfurecidos/ Arrastado por bandidos/ Num cinto de segurança."

Para escrever sobre os casos, Mestre Azulão procura fontes de informações variadas. "De um jornal para outro tem diferença. A gente vê então qual está mais exato. O valor aqui é a poesia. Jornal nenhum faz. Só o poeta." Antes de condenar Bruno, Isael se isenta de apurar os fatos. "Tudo que aqui foi escrito/ Já foi bem noticiado/ Minhas são somente rimas/ Nesse tema conturbado/ Investigação só cabe/ A quem é credenciado."