Hoje Araci Minaif sorri, mas o trauma da remoção forçada tornou-a mais desconfiada| Foto: Daniel Castelano / Gazeta do Povo

Muitos animais para compensar perdas familiares

Araci Minaif acumulava não apenas lixo, mas também gatos e galos. Eram dezenas de bichos soltos pelo quintal e dentro de casa. Na confusão instaurada durante a remoção, a maioria dos animais fugiu. Hoje, a idosa segue cuidando de alguns deles. Os vizinhos chegaram a construir um viveiro nos fundos do terreno, mas Araci não concorda em mantê-los presos.

Ela passou a dispor da companhia de animais há uma década, quando perdeu em sequência a mãe, o irmão e um emprego de doméstica. Começou a trabalhar com reciclagem, usando o quintal de casa como depósito. Solitária, despertou a suspeita de ter desenvolvido problemas mentais. Os vizinhos próximos sempre garantiram que ela mantinha a lucidez.

A "acumulação compulsória", conhecida como Síndrome de Diógenes, ocorre quando a pessoa é incapaz de jogar qualquer coisa fora, e sempre está disposta a recolher lixo na rua e levar para casa. É uma das novas doenças descritas pela nova edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, publicado neste ano após mais de uma década de debates. Seu diagnóstico é polêmico e controverso entre especialistas da área. No caso de Araci, o terreno passou a ser usado por outras pessoas para desovar tranqueiras. Após a limpeza, ela não voltou a acumular objetos. (OT)

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A casa chegou a ter 25 toneladas de lixo, mas o terreno foi limpo por um mutirão
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Aos 75 anos, Araci Minaif se tornou uma mulher arredia. Pouco vai à rua ou recebe visitas. A catadora de materiais recicláveis despertou a comoção de um bairro inteiro de Curitiba quando foi retirada de casa à força e internada compulsoriamente em um asilo. O entendimento da Justiça foi que ela não tinha condições de cuidar de si mesma. Considerada uma "acumuladora compulsiva", chegou a guardar 25 toneladas de lixo no terreno de sua moradia, numa esquina do Alto da XV.

O episódio da remoção forçada, ocorrido há um ano, foi o estopim para um mutirão entre os vizinhos de Araci. Enquanto pediam a volta da idosa para o lar, enchendo a frente da casa com cartazes e fazendo barulho em rádio, tevê e jornal, se organizaram para tornar habitável o lar de Araci – uma casa colonial de madeira dos anos 30, onde ela nasceu e passou toda a vida.

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Como parte do acordo para que Araci voltasse para casa, o juiz determinou que a idosa fosse acompanhada por uma cuidadora em tempo integral. Também foram designadas duas curadoras – primas-irmãs de Araci – para administrar a casa, contratar as profissionais e gerir a aposentadoria da idosa.

Os moradores reconheciam que o comportamento da moradora e as condições da construção haviam se tornado um problema de higiene e segurança para o bairro. Porém, não viam na saída forçada dela uma solução. "O pessoal gosta dela. É boa de papo", lembra o engenheiro mecânico Elcio Modro, um dos articuladores da ação.

Nova vida

O terreno foi limpo, ganhou portão e grades no muro. A casa teve as paredes de madeira consertadas e pintadas. O banheiro, que estava inutilizável, foi recuperado. Vários móveis foram doados, assim como um fogão elétrico. Araci tinha apenas o de lenha, que permanece em pé até hoje, ao lado da "novidade". "O terreno havia se tornado esconderijo de marginais, além de banheiro público", lembra Elcio, que ainda bate no portão ao menos uma vez ao dia para ver como está a vizinha.

De volta à casa, a idosa, inicialmente, se recusou a receber a Gazeta do Povo. Mas com a mediação de um vizinho conhecido, abriu as portas para a reportagem. São receios acumulados a partir da remoção e da internação forçadas. A mulher, antes expansiva, tornou-se sorumbática. Após ser tema de diversas reportagens, reclama não ter sido ajudada por aqueles que a procuraram. Entretanto mantém contato direto com os parentes e com os vizinhos, que seguem doando alimentos. Ela reclama não ter mais a renda extra proporcionada pela reciclagem.

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Araci quer ficar em casa. Os vizinhos também querem.