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Modelo de bloqueador instalado em Presidente Venceslau, unidade prisional paulista de segurança máxima | Edson Lopes/GESP
Modelo de bloqueador instalado em Presidente Venceslau, unidade prisional paulista de segurança máxima| Foto: Edson Lopes/GESP

Migração do Depen à Sesp está longe do consenso

Um dos itens do "pacotão penitenciário", a migração do Departamento de Execução Penal (Depen) à pasta de Segurança divide opiniões fora do governo. Responsável pela gestão do sistema penitenciário, o Depen hoje está vinculado à Secretaria de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos (Seju). A mudança ainda está em estudo.

Ainda assim, o Sindicato dos Agentes Penitenciários (Sindarspen) criticou a eventual alteração. Para o presidente da entidade, Anthony Johnson, o ideal seria que fosse criada uma secretaria específica para gerir os presídios do estado, como determina a revisão da Lei de Execuções Penais (LEP), que tramita no Senado. "Nós queremos uma secretaria própria da execução penal", diz.

O sindicato nega que tenha sugerido a mudança do Depen para a Sesp e atacou a falta de diálogo com o governo. "O pacote é temerário. Os agentes deviam ter participado da reunião com o governador. Não chamaram as pessoas mais afetadas pelas mudanças, que são os trabalhadores", afirma.

A principal preocupação dos grupos de defesa de direitos humanos é quanto ao comprometimento do processo de reinserção dos detentos à sociedade. "Vai ser um retrocesso enorme. A ressocialização dos presos – que já está prejudicada hoje – vai falir completamente", diz a advogada Isabel Kügler Mendes, membro da Comissão Nacional de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil.

A Sesp é responsável pelas polícias Civil e Militar. Por causa deste "DNA", a advogada acredita que haja até mesmo um conflito constitucional no fato de a pasta da Segurança assumir o Depen. "A pena é uma medida judicial. O detento não pode, em hipótese alguma, continuar sob guarda das autoridades de segurança", conclui.

Opinião

Tímido e insuficiente, conjunto de medidas não vai à raiz dos problemas

Diego Ribeiro e Felippe Aníbal, repórteres

O "pacotão penitenciário" anunciado pelo governo do Paraná apresentou mudanças tímidas e insuficientes. Pode se dizer que o único ponto positivo foi corrigir o erro de atender seguidamente as transferências de presos rebelados para outras unidades. Mas os problemas no sistema vão muito além.

Faltam assessores jurídicos nas penitenciárias [150 foram embora após a criação da Defensoria Pública; hoje, nove defensores atuam nas prisões]; há lentidão na revisão de penas; os recursos do Fundo Nacional Penitenciário permanecem contingenciados; e o governo estadual segue sem criar vagas concretas com construções de novas unidades penais. Não bastasse isso, a cultura do encarceramento e a desgastada Lei de Execução Penal (LEP) não evoluem com a velocidade necessária.

Esse conjunto de obstáculos estabelece uma ordem perversa, como bem anunciava o sociólogo do filme Tropa de Elite. Em 2014, o número de presos em flagrante no Paraná deve passar da casa dos 40 mil. Sem contar os milhares de mandados de prisão cumpridos. Se o ritmo de prisões for mantido, será necessária a construção de 100 penitenciárias com capacidade de mil detentos cada até o fim do próximo mandato de Richa.

Se prender não é a solução, resta apostar na ressocialização – com foco no retorno ao convívio social e criando oportunidades de trabalho. Neste sentido, a transferência do Depen para a Sesp seria um retrocesso atroz. A cultura policial brasileira é carregada de preconceito com os detentos e tem grandes problemas estruturais. Quem prende tem condições de ressocializar? O trabalho dos agentes melhoraria nesta pasta? A Sesp não queria presos em delegacias, agora topará abraçar todo o Depen?

O governo do Paraná deve encontrar resistência para pôr em prática parte das medidas que compõem o pacote anunciado nessa semana para tentar conter a onda de rebeliões que, desde o início deste ano, acomete o sistema penitenciário do estado. Uma das iniciativas – o bloqueio de celulares nos presídios – deve enfrentar contestações judiciais, a exemplo do que ocorre em outros estados. Já a possível migração do Departamento de Execução Penal (Depen) para a Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) não é consenso entre entidades vinculadas ao sistema.

De acordo com o anteprojeto de lei encaminhado à Assembleia Legislativa pelo governador Beto Richa (PSDB), as operadoras ficariam obrigadas a instalar dispositivos que identifiquem e bloqueiem o sinal de celular nos limites dos presídios do estado. A medida prevê multa entre R$ 50 mil e R$ 1 milhão às empresas, em caso de descumprimento.

Entretanto, ainda que a lei seja aprovada no Paraná, não deve ser fácil tirá-la do papel. Em Santa Catarina, uma norma semelhante foi aprovada em 2012, mas foi contestada no Supremo Tribunal Federal (STF) pela Associação Nacional das Operadoras de Celular (Acel), que argumenta que a medida é inconstitucional. Enquanto o pedido não é julgado, os presídios catarinenses continuam sem bloqueio de sinal.

Para o advogado Ro­­drigo Tostes de Alencar Masca­­renhas, autor do livro Direito das Telecomuni­­cações, o principal ponto que caracterizaria a inconstitucionalidade da proposta é que não é competência dos estados – e sim da União – legislar sobre telecomunicações. "Em princípio, o Paraná não poderia legislar sobre esta matéria. Provavelmente vai haver uma discussão judicial sobre a constitucionalidade desta lei", diz o especialista. Em julho, a Bahia também aprovou uma lei parecida, mas que ainda não foi colocada em prática.

Na argumentação do anteprojeto de lei assinado por Richa, o governo do Paraná alega que há um parecer da Procuradoria Geral da República que aponta que as leis da Santa Catarina e Bahia não são anticonstitucionais.

O Sindicato das Empresas de Telecomunicações (Sin­­diTelebrasil), por sua vez, alega que a Lei de Execuções Penais (LEP) "é explícita em relatar que é de competência do estado instalar bloqueadores e detectores de metais nos presídios". As operadoras, diz o sindicato, contribuem quando solicitadas, "prestando consultoria técnica para que haja a melhor adequação possível dos bloqueadores de sinais".

Fim do diálogo

A reunião que definiu o "pacote penitenciário" nessa semana também pôs fim ao diálogo entre o governo e os agentes penitenciários. A reportagem apurou que o governador Beto Richa interrompeu as negociações com o Sindarspen por causa de "quebra de confiança". O estopim foi um áudio enviado via WhatsApp aos agentes pelo presidente do sindicato, Anthony Johnson. Na gravação, o sindicalista pede mudanças na Seju. Ao longo da semana, os agentes promoveram manifestações em frente ao Palácio das Araucárias. Consultado pela reportagem, Johnson preferiu não comentar o áudio, mas destacou que segue defendendo o diálogo aberto com o governador.

Medidas

Conheça o ‘pacote penitenciário’ do governo do Paraná:

Transferências: resolução da Seju proíbe que presos rebelados sejam transferidos para outras unidades. Também institui um comitê para, semanalmente, analisar quais detentos querem e têm condições de serem transferidos. Status: já em vigor.

Celulares: anteprojeto de lei encaminhado à Assembleia determina que operadoras bloqueiem sinais de celulares nos presídios paranaenses. Status: encaminhado à Assembleia Legislativa. Ainda que aprovado, deve enfrentar recursos judiciais das operadoras.

Depen: governo está avaliando se transfere o Departamento de Execução Penal para a Secretaria de Segurança Pública. Hoje, o Depen está vinculado à Secretaria de Justiça. Status: em análise.

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