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São Paulo – Um exemplar do Corão, dezenas de fotos da família perdida e, enfeitando a parede, um mapa da Palestina anterior a 1948, ano de criação do Estado de Israel. O confeiteiro Talal Mustafá Gilbara, um dos 35 reassentados palestinos que chegaram há dez dias a São Paulo, tenta preservar no seu novo mundo, um pequeno apartamento de asilo para idosos, as raízes e imagens de um passado sofrido. Natural da cidade de Kalkilia, no noroeste da Cisjordânia, ele vagou por quatro países até cair num acampamento jordaniano de refugiados no deserto de Ruweished, a 70 quilômetros da fronteira do Iraque.

"Fui bem recebido na Líbia e no Egito, maltratado na Jordânia e perseguido no Iraque, onde vivi de 1991 a 2003, até a queda de Saddam Hussein", disse Talal na quarta-feira, com a ajuda de um intérprete, o egípcio Moheb Nasr Bismarck Nasr, engenheiro aposentado da Embraer. Na Jordânia, perdeu toda a família – mãe, mulher, um filho e duas filhas – num acidente de carro ocorrido em 84 e até hoje inexplicável para ele.

São quase 17 horas e Talal está sem comer desde as 4h33 da madrugada, cumprindo o jejum ritual do Ramadã, o mês sagrado do Islã. Só vai jantar depois das 18h04, como determina uma tabela, escrita em árabe e português, fornecida pelo xeque da cidade.

Canadá, Irlanda e Suécia, os outros países que atenderam a um apelo do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), selecionaram a dedo pessoas mais jovens e profissionalmente mais qualificadas. O grupo de 117 palestinos aceitos pelo governo brasileiro tem professores, engenheiros, economistas e escritores, mas inclui também pedreiros, artesãos e motoristas.

Os palestinos que estão chegando ao país foram divididos em dois grupos. Uma parte ficou em São Paulo, e outra foi para o Rio Grande do Sul. Os que já chegaram a São Paulo foram divididos em núcleos familiares, moram em casas alugadas pelo Acnur e recebem uma ajuda de custo com base no salário mínimo – 100% (R$ 380) para o chefe da família, 75% para a esposa e 25% para cada um dos outros membros. Na primeira semana, eles tiveram os primeiros contatos com a cidade. Fizeram exames médicos e começaram a tratar dos documentos, como visto de residência permanente, CPF e carteira de trabalho. Por enquanto, os palestinos não saem sozinhos pelas ruas. Os muçulmanos foram à mesquita e uma família católica – casal e dois filhos – pediu para ir à missa.

Outros dez palestinos que também chegaram no primeiro grupo foram para Porto Alegre, onde estão hospedados numa casa da Associação Antônio Vieira, dos padres jesuítas. "Os reassentados daqui serão distribuídos por seis cidades do interior", informa o presidente da Federação Árabe Palestina do Brasil, Alayyan Aladdin, sem revelar, por enquanto, os nomes das cidades. Elas foram escolhidas entre aquelas que já têm alguma presença árabe e muçulmana, para que os palestinos se adaptem com mais facilidade.

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