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Tecnologia

Internet é a grande "culpada"

Umberto Eco chama a internet de "A grande mãe de todas as listas". Segundo o autor, ela "nos dá a sensação de sermos opulentos e onipresentes, ao preço de não sabermos quais de seus elementos se referem a dados do mundo real, rompendo a distinção entre verdade e erro".

O esquema de lista está profundamente arraigado à automação. Na linguagem de programação de softwares, o conceito de relevância é transformado em fórmula matemática e está por trás de praticamente todo o sistema que gerencia informação. Numa análise rasteira, o buscador Google, um dos sites mais visitados do mundo, nada mais é que uma enorme lista cujos critérios de classificação são definidos automaticamente pelos usuários.

Outro na lista das páginas mais acessadas, o Facebook, também se tornou notório por fazer listas de seu conteúdo – no caso, 850 milhões de seres humanos. Em um artigo publicado originalmente na New York Review of Books em 2010 e editado no Brasil pela revista Piauí, a escritora britânica Zadie Smith aponta o caráter redutor da mídia social e de seu criador, Mark Zuckerberg, contemporâneo da autora na Universidade Harvard. "Nele, tudo é reduzido à escala do seu fundador. É azul porque, por acaso, Zuckerberg sofre de um daltonismo que não distingue o verde do vermelho", aponta.

Facebook

O esquema de classificação do Facebook, e basicamente de qualquer mídia social, obedece ao mesmo sistema binário que fundamenta toda a computação. Mesmo em relações entre pessoas, o site não pode oferecer qualquer possibilidade de resposta além de 1 ou 0 (sim ou não). A única maneira de se estabelecer culturalmente na rede, portanto, é listar uma série de livros, filmes e músicas a ser correlacionados pelo visitante da página, que a partir do mosaico conceberá uma visão sobre o dono da página.

Zadie Smith provoca: "Qual é seu status de relacionamento? Só poder haver uma resposta. Afinal, as pessoas precisam saber. Você tem uma ‘vida própria’? Prove. Adicione suas fotos. Você gosta das coisas certas? Faça listas. Entre as ‘coisas que gosta’, você pode relacionar: filmes, música, livros e tevê – mas não arquitetura, ideias ou plantas". (OT)

Concurso

Curitiba tem chances de ganhar?

Afinal, apesar de tudo, Curitiba merece estar na lista das Sete Melhores Cidades? Juliana Vosnika, presidente do Instituto Municipal de Turismo (equivalente a uma secretaria municipal), cita os pontos fortes da capital paranaense. "Temos soluções urbanas criativas e somos destaque na área ambiental, além de boa qualidade de vida e uma taxa de desemprego baixa, em relação ao resto do país."

Ela afirma que os esforços da cidade merecem ser reconhecidos internacionalmente. "Somos uma cidade sem belezas naturais, mas soubemos nos construir. Hoje temos cartões postais reconhecidos em todo o Brasil", ressalta. Ela lembra ainda que o título deve estimular agências de turismo a fazer roteiros específicos para essas cidades. "Nós já temos as Cataratas do Iguaçu como maravilha natural. Vamos, então, em busca de ter duas maravilhas no nosso estado", almeja.

Para o professor Orlando Pinto Ribeiro, coordenador do curso de arquitetura da Universidade Positivo, é improvável que uma cidade brasileira possa constar na lista. "Elas estão à mercê de todos os problemas nacionais", ressalva. Entretanto, reconhece que os esforços de Curitiba podem sensibilizar os votantes, ainda que a chance de a cidade ser eleita seja pequena. "O mais importante não é a cidade ser valorizada por pessoas de fora, mas sim pelos que vivem nela", diz Ribeiro. (OT)

Entre as 300 melhores

Curitiba passou para a segunda fase do concurso que escolherá as 7 Melhores Cidades do Mundo. O ranking é elaborado pela Fundação New7Wonders. Na primeira fase, disputada por 1.200 cidades, Curitiba ficou entre as 300 mais lembradas. A votação para a segunda fase do concurso vai até 23 de novembro e deve ser feita no site www.new7wonders.com/cities/en. Neste endereço aparecerá uma lista das cidades concorrentes por continente. Basta selecionar South America e escolher Curitiba. Depois, é preciso eleger outras seis cidades de qualquer continente. Para concluir, é necessário digitar o e-mail e, por fim, enviar o voto. Em 7 de dezembro serão divulgadas as 28 finalistas.

É cada vez mais relevante entre jornalistas, com o boom de acessos a matérias nos sites de jornais, saber o ranking das reportagens mais lidas na web. O interesse, presente em qualquer redação do mundo, está atrelado a uma busca interna por confirmação. Quanto mais alto na lista estiver o material, inocentemente raciocina-se, melhor é o assunto e a forma como foi coberto.

O referendo das listas – mais afetivo que racional – poderia ser entendido apenas como um tique da comunicação de massa. Mas sua presença se tornou um fenômeno em si mesmo. Perceba como é comum o uso de expressões como "top 10", "campeão" ou "o melhor" em conversas informais, quando obviamente não há uma análise de todos os elementos em questão. Se algo que nos agrada (ou repugna) não está em uma lista, criamos um rol imaginário no qual o precioso objeto possa despontar, ainda que solitariamente.

Atualmente, Curitiba participa de uma competição que definirá as Sete Melhores Cidades do Mundo. A lista está sendo elaborada pela mesma fundação que apontou as Sete Novas Maravilhas Naturais do Mundo – as Cataratas do Iguaçu saíram eleitas. A capital paranaense agora disputa o título com 300 cidades de diferentes países, após eliminar outras 900 na primeira fase.

A estratégia de selecionar sete cidades em meio a 1,2 mil, de certa forma, aponta às demais o que lhes falta. O processo remete a uma primitiva forma de erudição, quando a humanidade ainda tinha uma imagem amplamente imprecisa do universo. O escritor italiano Umberto Eco lembra em seu livro A Vertigem das Listas, lançado em 2010 no Brasil, que definir e enumerar elementos é uma forma de estabelecer conhecimento. Eco, especialista em Idade Média, aponta as enciclopédias e sumas teológicas como uma proposta para fornecer formas definitivas ao universo material e espiritual. Santo Enódio, no século V, define Cristo a partir de uma longa lista de substantivos: "fonte, via, direita, pedra, leão, lucífero, cordeiro, porta, esperança" e por aí vai.

Do esforço de definição plena na alta Idade Média, a lista se revigora após o Renascimento, quando o Barroco apresenta à humanidade, pela primeira vez na história, a noção de excesso. A partir de então, o esforço não é por montar um corpo de conhecimento definido, mas retirar tudo o que não é essencial e atrapalha o entendimento.

Tudo pronto

A história das listas chega ao final do século 20 com a pretensão de refilar a enorme quantidade de informação disponível, principalmente a partir do advento da internet. O elenco pré-fabricado do que é essencial em uma área se torna necessário quando é impossível descobri-lo pelo método tradicional de pesquisa (recolhimento, análise e seleção do material). "Isso é reflexo de uma necessidade de orientação. As pessoas estão se acostumando a receber o conteúdo pronto e pasteurizado, se livrando da obrigação de escolher – um processo onde existe a possibilidade de ocorrerem experiências ruins", analisa o coordenador do curso de psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Naim Akel Filho.

Para ele, o fenômeno é uma característica da sociedade contemporânea, forçada – e acostumada – a absorver cada vez mais informação. "É uma questão neurofisiológica. O cérebro se acostuma a determinados estímulos e passa a necessitar deles. O excesso de dados disponíveis cria a necessidade de sempre se estar sabendo das coisas. Ainda que aquilo seja inútil", explica.

Escolhas e gostos padronizados pelo outro

Uma entrevista concedida pelo presidente norte-americano Barack Obama à revista Rolling Stone, em 2010, rendeu comentários dos analistas políticos daquele país durante semanas. A polêmica, entretanto, não estava relacionada à crise econômica, à guerra no Afeganistão ou ao vazamento de petróleo no Golfo do México. A parte mais interessante de sua fala surgiu após a pergunta: "o que tem em seu iPod?"

Os analistas perceberam que o catálogo de artistas preferidos de Obama era tão político quanto o próprio presidente. Cui­dadosamente, Obama citou um músico saído da cultura negra absorvido pelos brancos (Stevie Wonder) e logo depois um branco crítico e engajado à luta pelos direitos civis (Bob Dylan). Roqueiros hedonistas e estrangeiros (Rolling Stones) e jazzistas introspectivos (Miles Davis e John Coltrane). As escolhas musicais sempre apontam para a convergência e o consenso, assim como a postura política do dono do aparelho.

Pertencimento

O presidente norte-americano replica um comportamento amplamente identificável na sociedade. O rol dos gostos pessoais funciona, sobretudo, como mecanismo de pertencimento. "Os padrões se impõem muito fortemente entre nós. Temos uma necessidade em saber o que os outros vestem, ouvem, leem, comem, enfim, o que consideram normal. Porque não queremos ficar de fora", explica o coordenador do curso de Psicologia da Pontifícia Universidade Ca­­tólica do Paraná (PUCPR), Naim Akel Filho.

Com a amplitude de informações e o consequente aumento nas possibilidades de escolha, até a adoção de padrões exige esforço, pois começa a ganhar escala. Em 2006, a editora Sextante, famosa por publicar os best-sellers de Dan Brown no Brasil, publicou um guia intitulado 1000 Lugares para Conhecer antes de Morrer. Devido à boa resposta do público (270 mil exemplares vendidos), a editora investiu em outros títulos da série. Seguiram-se Filmes, Discos, Vinhos, Dias que Mudaram o Mundo, Invenções que Mudaram o Mundo, Comidas, Maravilhas Naturais e Cervejas.

A venda somada desses títulos ultrapassa os 600 mil exemplares. "As listas nos ajudam muito em meio a essa enxurrada de lançamentos. São importantes para encontrar clássicos que nunca perdem o interesse e que a pessoa não descobriria simplesmente saindo por aí", destaca um dos sócios da editora Tomás Pereira. "Acredito que o principal consumidor seja o público leigo, que quer ter alguma referência."

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