Imagem da missa enviada pela Prefeitura de Santa Vitória do Palmar.| Foto: Reprodução / Prefeitura de Santa Vitória do Palmar.
Ouça este conteúdo

A Prefeitura de Santa Vitória do Palmar, interior do Rio Grande do Sul, fez um Boletim de Ocorrência contra o padre Cristiano Cardoso pelo fato de celebrar missas nos dias 3 e 5 de junho, ato liberado pelas leis estaduais, mas proibido por decreto municipal. A Prefeitura também ingressou uma ação judicial contra a Paróquia da Igreja Matriz de Santa Vitória do Palmar, pedindo indenização de R$ 10 mil reais por danos morais coletivos. Em decisão de primeira instância, o juiz deu razão à Prefeitura, mas definiu multa de 10 salários-mínimos apenas no caso de que as missas presenciais voltassem a ser realizadas.

CARREGANDO :)

>> NOVIDADE: faça parte do canal de Vida e Cidadania no Telegram

À RBS TV, o padre disse ter solicitado ao município que adequasse o decreto municipal às decisões estaduais, que define como essenciais as atividades religiosas, desde que sejam respeitadas as medidas de segurança sanitária. Mas a Prefeitura foi irredutível na decisão.

Publicidade

"Ademais do choque legal entre os referidos diplomas, é por bem do razoável consultar a comunidade a fim de que não ocorram injustiças de nenhuma natureza, como foi o caso concreto. A fé e a vida religiosa bem vivida são comprovadamente motivo de aumento da imunidade do corpo e equilíbrio psíquico, temas já amplamente debatidos no âmbito da Assembleia Legislativa do Estado e que construíram o referido diploma estadual", disse o padre.

No dia 3 de junho, solenidade do Corpus Christi, após a Missa as pessoas saíram em carreata com a hóstia consagrada, como é costume dos católicos. “Agentes tentaram parar a carreata, mas explicamos que atividades religiosas eram essenciais e realizamos a carreata”, disse o padre ao site ACI Digital. Dentro da igreja, o padre também garantiu a adoção de todas as medidas de proteção sanitária, como 25% do limite de pessoas, máscaras, higienização com álcool gel.

No sábado à tarde, 5 de junho, agentes da Prefeitura foram autuar o padre, que se negou a assinar o documento. O Padre perguntou o nome dos agentes, que não quiseram se identificar. Segundo a Prefeitura, o padre teria sido desrespeitoso ao perguntar se os funcionários públicos eram batizados. Veja vídeo:

À ACI Digital, o padre negou que estivesse infringindo o artigo 268, do Código Penal, como diz o Boletim de Ocorrência, já que todos os cuidados foram tomados. O dispositivo prevê pena de “detenção, de um mês a um ano, e multa” a quem “infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”. O padre confirmou que irá recorrer e tem o apoio do bispo para garantir a liberdade religiosa.

Publicidade

Decisão do STF: “que rezem em casa”

No dia 8 de abril, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por 9 votos a 2, que decretos estaduais e municipais podem proibir a realização de missas, cultos e demais celebrações religiosas presenciais durante a pandemia. O caso concreto analisado era o do Decreto 65.563/2021 do estado de São Paulo. A ação foi ajuizada pelo Partido Social Democrático (PSD). O placar do julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 811 foi de 9 a 2 pela constitucionalidade do decreto.

Ao discordar da maioria, o ministro Kassio Nunes Marques salientou que é contra o fechamento total das igrejas e demais locais de culto, sempre que sejam seguidos os protocolos rígidos de proteção para evitar a disseminação do coronavírus. A sugestão dele foi a de limitar a 25% a capacidade de público das igrejas. Além disso, ele reforçou a obrigatoriedade do uso de máscara, disponibilização de álcool em gel e distanciamento social.

O ministro afirmou ainda que não foi por causa das celebrações religiosas que a pandemia ganhou força no Brasil e destacou que a possibilidade de ir à igreja nesse momento representa alento espiritual aos fiéis.

Juristas procurados pela Gazeta do Povo, lamentaram a decisão do STF, por identificar interferência indevida do Estado no direito fundamental de liberdade religiosa, ao ditar a maneira como devem ser os cultos. O Estado, segundo eles, pode impor limite de público, medidas sanitárias, mas nunca proibir celebrações presenciais.

"O Estado é laico, ele não pode dizer como as pessoas devem prestar culto, o que é importante ou não", afirmou Tiago Vieira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito e Religião (IBDR). "Para os católicos, o papa é quem pode dizer o que os fiéis devem fazer, se devem rezar em casa ou não. O ministro pode deliberar sobre questões civis, políticas, mas não dizer como o fiel tem que se portar na matéria de fé", acrescentou o especialista, comentando a afirmação do ministro Marco Aurélio Mello de que os religiosos tinham de “rezar em casa”.

Publicidade

Eles ressaltaram a importância das atividades religiosas presenciais, para católicos e fiéis de outras crenças. Embora a maior parte das discussões se debruce sobre igrejas de matriz cristã, o especialista cita situações que envolvem outros credos religiosos: "Um babalorixá ou pai de santo não incorpora uma entidade via online. É preciso do terreiro e de pessoas para ter o ápice da fé. Também é assim para a religião espírita, com as sessões mediúnicas", exemplificou.