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Faltam critérios para unificar punição

"Cada cabeça uma sentença." O ditado popular se aplica no dia-a-dia dos tribunais quando está em julgamento o destino de adolescentes em conflito com a lei. Não existe no Brasil um procedimento unificado para aplicação das medidas socioeducativas e isso leva muitos juízes da infância e juventude a aplicar mais as medidas de internação. Um projeto de lei enviado à Casa Civil da Presidência da República visa regulamentar essas medidas e padronizar o atendimento socioeducativo.

"Hoje, cada estado trata o adolescente de forma discricionária e isso abre espaço para arbitrariedades como, por exemplo, não dar preferência às medidas de meio aberto conforme está previsto na lei (ECA)", diz Ariel de Castro Alves, do Movimento Nacional dos Direitos Humanos. O projeto de lei está sendo analisado tecnicamente pela Casa Civil e ainda não tem data para ser encaminhado ao Congresso Nacional.

Outra falha a ser corrigida é a falta de defensores públicos. Das 2.510 comarcas do país, só 996 dispõe de defensoria pública para quem não tem dinheiro para contratar advogado. O déficit de profissionais no país chega a 2.951 vagas, segundo o II Diagnóstico da Defensoria Pública no Brasil. A média nacional é de um defensor para cada grupo de 83,2 mil habitantes.

No interior, a ausência de defensorias públicas é agravada pela falta de magistrados especializados nos direitos da infância e da adolescência. A cultura existente entre os juízes criminais – tipo predominante nas comarcas pequenas – é a de a melhor forma de lidar com um jovem em conflito com a lei é interná-lo.

A União e os governos estaduais gastam muito em "prisões" para adolescentes em conflito com a lei e investem pouco em medidas socioeducativas de regime aberto para recuperá-los. Quem afirma são especialistas na área da infância e adolescência, respaldados pelos orçamentos públicos. O Paraná, por exemplo, gastou nos últimos três anos quase sete vezes mais na construção de educandários do que em investimentos nos programas de liberdade assistida e de prestação de serviços à comunidade. Foram R$ 6 milhões para cem municípios do estado, em programas executados por 81 prefeituras e 28 organizações não-governamentais.

A quantia passou de R$ 500 mil, em 2004, para R$ 2,5 milhões no ano seguinte e R$ 3 milhões em 2006. Há um esforço para fortalecer as medidas socioeducativas do meio aberto, mas ainda assim os valores são quase sete vezes menores do que os R$ 40 milhões que o governo gastou no mesmo período na reforma e construção de novas unidades prisionais para adolescentes em conflito com a lei. São 850 vagas, incluindo os recém inaugurados educandários de Cascavel e Laranjeiras do Sul. Outros estão em obras em Ponta Grossa, Curitiba e Maringá.

A opção por essas unidades se repete em maior escala em São Paulo, onde estão 50% dos 40 mil adolescentes brasileiros que cumprem algum tipo de medida socioeducativa. Em 2005, dos cerca de R$ 250 milhões do orçamento (sem incluir o pagamento de servidores) gastos com a assistência dos adolescentes em conflito com a lei, 92% foram aplicados na manutenção das internações e na construção de novas unidades. A execução das medidas socioeducativas, que os especialistas acreditam ser a melhor forma de ressocializar os jovens, ficaram com 0,7% dos recursos e o restante foi destinado à municipalização do atendimento e ao acompanhamento dos jovens que saíram do sistema socioeducativo.

Em 2006, a dotação orçamentária subiu para R$ 388 milhões, dos quais 88% foram empregados na internação e construção de unidades. O investimento em medidas socioeducativas caiu para 0,3%. A realidade paranaense e paulista é a mesma da maioria dos estados brasileiros. Os governos investem cada vez mais na construção e manutenção de unidades prisionais para menores de 18 anos de idade, mas isso não tem refletido na redução dos índices de crimes praticados por jovens. Especialistas argumentam que a melhor forma de se combater a violência é o investimento maciço em medidas socioeducativas.

Sem essas medidas, os jovens são mandados a cumprir internação sem passar por atividades que promovam sua recuperação e diminuam a reincidência no mundo do crime. De outra forma, corre-se o risco de fazer dessas unidades meros depósitos de jovens. A coordenadora do Fórum Nacional de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (FNDCA), Tiana Sento-Sé, vê a internação do adolescente como última medida a ser tomada pelo juiz. O adolescente precisa de acompanhamento psicológico e da convivência com a família, pois apenas privá-lo de liberdade não o fará se recuperar.

Para inverter a lógica de se investir mais em internação do que em medidas socioeducativas, o Conanda procura sensibilizar o Legislativo. Para isso, tentará garantir recursos para implementação do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) na elaboração do Plano Plurianual 2008/2011. A estratégia será conversar com as lideranças partidárias. O Conanda tentará usar a mesma estratégia com o Executivo. O Conanda calcula que para a implementação do Sinase seriam precisos recursos da ordem de R$ 300 milhões.

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