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Para Viviane, professor deve dispor de mais tempo no próprio trabalho | Marcelo Elias/ Gazeta do Povo
Para Viviane, professor deve dispor de mais tempo no próprio trabalho| Foto: Marcelo Elias/ Gazeta do Povo

INPC versus Fundeb

Reajuste iria comprometer ao menos 70% das prefeituras

Um dos impasses envolvendo o piso do magistério refere-se ao reajuste anual do valor, de R$ 1.187. Muitos municípios têm feito a correção anual pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), na casa dos 6%. Já os órgãos que defendem os trabalhadores argumentam que o reajuste está atrelado à variação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), de 22% ao ano.

Segundo o presidente da Associação dos Municípios do Paraná, Gabriel Samaha, o reajuste do Fundeb somado ao novo salário mínimo irá comprometer perto de 70% das prefeituras do estado. Ele explica que os municípios têm que destinar 60% do Fundeb ao pagamento de salários e 40% para investimento. De acordo com Samaha, com o maior reajuste, o pagamento de salários irá ultrapassar o índice de 60% na maioria das cidades. Piraquara, por exemplo, cidade da qual Samaha é prefeito, iria gastar mais de 100% do fundo para o pagamento de professores.

O prefeito afirma que a associação não é contra o piso nacional e reivindica mais recursos às prefeituras para que elas deem conta das demandas. Já a Confederação Nacional dos Municípios informa que aguarda o anúncio do novo valor pelo governo federal para divulgar o estudo sobre o impacto financeiro e se pronunciar sobre o tema.

Indefinição

O Ministério da Educação (MEC) afirma em nota que aguarda relatório do Tesouro Nacional para fazer a divulgação e lembra que o reajuste será retroativo a janeiro. Na posse de Aloizio Mercadante como ministro da Educação, semana passada, ele afirmou que pretende iniciar um diálogo amplo para que os estados e municípios assegurem a implantação do piso nacional, a melhoria da remuneração e das condições de trabalho do magistério e das carreiras da educação, de acordo com texto no site do órgão.

O MEC informa ainda que não faz levantamento de quantos estados e municípios aplicam a lei. "Como a aplicação da lei é obrigatória, essa tarefa cabe aos órgãos fiscalizatórios, como Ministério Público e tribunais de contas", diz a nota. O ministério fornece complementação de recursos a estados e municípios que a requisitarem, desde que comprovem as exigências.

STF tratou do piso, mas não da jornada

Em agosto de 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou constitucionais os dispositivos da lei que fixam o piso salarial do magistério. Por maioria de votos, os ministros entenderam que a União tem competência para dispor sobre normas gerais relativas ao piso de vencimentos dos professores da educação básica "como forma de utilizá-lo como mecanismo de fomento ao sistema educacional e de valorização profissional, e não apenas como instrumento de proteção mínima ao trabalhador". Mas não houve decisão com relação ao artigo da lei que determina o limite de dois terços da carga horária para o desempenho das atividades de interação com os educandos. Não houve quórum suficiente para a decisão e, em tese, a constitucionalidade da jornada pode ser questionada futuramente no STF.

Interatividade

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Professores da educação básica que atuam na rede pública ainda não dispõem integralmente dos direitos estabelecidos pela Lei Nacional do Piso do Magistério, N.º 11.738 de 2008. Apontada como um dos elementos para a melhoria da qualidade de ensino, a lei fixou um piso salarial para a categoria e determinou que 33% da jornada de trabalho dos professores seja exercida extraclasse, para capacitação e preparo das aulas. Três anos depois, municípios reconhecem a importância das medidas, mas alegam não ter condições de cumpri-las totalmente de imediato. Enquanto isso, professores propõem uma paralisação nacional.

A presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Cleusa Ro­­drigues Repulho, aponta que os efeitos da lei do piso não serão sentidos neste ano letivo. Segundo ela, o ano de 2012 será de organização, com o levantamento de quantos profissionais precisarão ser contratados e os impactos financeiros e negociação junto aos sindicatos. "Nenhuma rede consegue implantar [a lei] de uma hora para a outra." Ela também aponta o fato de esse ser um ano eleitoral, o que impede a contratação de funcionários para o serviço público a partir de 7 de julho.

A percepção de Cleusa é de que muitos municípios já cumprem o piso salarial, fixado em R$ 1.187, e que o maior desafio está na ampliação da jornada extraclasse. A afirmação vem ao encontro de uma pesquisa feita por várias instituições sobre os impactos da lei do piso. A professora do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná Andréa Barbosa Gou­veia, que participa do estudo, explica que dez estados e as respectivas capitais foram analisados, em 2010. Observou-se que muitos já atingiram o valor do piso e ou­­tros estão bem próximos disso, mas nenhum destina 33% para atividades extraclasse. Foram pesquisados os estados de São Paulo, Santa Catarina, Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Roraima, Piauí, Pará e Rio Grande do Norte.

Polêmica

Apesar de a lei ser de 2008, governos e prefeituras começaram a se estruturar efetivamente a partir da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que julgou constitucional a lei, em agosto do ano passado, após um questionamento de cinco estados, entre eles o Paraná. Na época, o estado argumentava que, com a destinação de um terço da jornada de trabalho para atividades extraclasse, mais 9.288 professores teriam de ser contratados, aumento de 15% do quadro a um custo aproximado de R$ 9 milhões por mês.

Atualmente, o índice de hora-atividade está em 20%. A Secre­taria de Estado da Educação afirma que está estudando maneiras de implementação da lei. Já o piso salarial está acima do valor nacional. A realidade é semelhante à da rede municipal de Curitiba, que irá fazer um novo concurso para professores tendo em vista o aumento da hora-atividade.

"Se a capital que tem um orçamento grande e tem uma área urbana grande já é difícil, imagina para um município pequeno", observa a presidente da Undime no Paraná, Cláudia Maria da Cruz. De acordo com a professora, os municípios defendem o piso e a hora-atividade e estão revendo seus planos de carreira. O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, Roberto Franklin de Leão, afirma que há uma luta grande para a implementação da lei e que foram feitas 19 greves estaduais no ano passado. A categoria programa uma paralisação nacional para os dias 14, 15 e 16 de março em defesa do piso e da carreira.

Melhorias se refletem na sala de aula

Professores bem remunerados e com tempo para capacitação e planejamento das aulas elevam a qualidade do ensino, garantem os envolvidos no processo. "Para mim, a figura do professor é central", diz a professora do Setor de Educação da UFPR Andréa Barbosa Gouveia. Ela afirma que um piso nacional para a categoria é fundamental devido às desigualdades de rendimentos existentes no país e faz com que a carreira se torne mais atrativa para o ingresso de novos profissionais.

Sobre a destinação de 33% da jornada para atividades extraclasse, Andréa aponta que o profissional adquire mais tempo para se atualizar, participar de cursos e preparar as atividades. "O professor, para construir o hábito de estudo com o aluno, tem de ter direito de exercer seu hábito de estudo." Para o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, Roberto Franklin de Leão, uma das variáveis para a melhoria do ensino é a condição de trabalho. "A lei do piso é construída num processo de valorização."

Cotidiano

A professora Viviane Aparecida Bastos, que atua na rede municipal de ensino de Curitiba, explica que no dia a dia os professores da primeira etapa do ensino fundamental têm uma variedade de assuntos para pesquisar, com conteúdos de língua portuguesa, matemática, ciências, história e geografia. "A gente tem de planejar o método para ensinar essa criança, estudar o conteúdo, passar para os pais como a criança está. É uma série de coisas que tem de estar resolvendo e muitas vezes não dá tempo." Há dois anos, Viviane passou a lecionar a disciplina de artes e precisa planejar os conteúdos para diferentes turmas.

A professora observa ainda que muitos colegas acabam levando muitas atividades para serem feitas em casa, interferindo na vida social. "Quanto mais o professor puder pensar na função dele no local de trabalho, mais sadio é", aponta.

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