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      Desde o nascimento do primeiro filho, há um ano e três meses, a dona de casa Adryan Rodrigues, 26 anos, nunca mais soube o que é dormir uma noite inteira. Arthur tem rotina regrada: acorda por volta das 9h30, tem horários certos para comer e brincar e nunca adormece depois das 22 horas. Mesmo assim, chega a acordar cinco vezes durante a madrugada. "Até os seis meses, ele acordava de duas em duas horas, cravado, para mamar. Hoje em dia, ele come super bem durante o dia e, mesmo assim, ainda acorda à noite. Sei que não é fome, é apego", admite a mãe.

      A cama de Arthur está montada no quartinho, mas ele dorme junto com os pais, o que "facilita" as mamadas noturnas. A solução não é fácil. Adryan conta que chegou a ler um livro indicado pelo pediatra, mas tem dó de aplicar a metodologia, que inclui deixar o filho chorando por um tempo. "Como parei de trabalhar só para cuidar dele, me sinto mal em deixá-lo chorar. Penso: ‘Para quê? Amanhã não trabalho mesmo’."

      A queixa de Adryan é uma das mais comuns entre pais, principalmente, os chamados "de primeira viagem". Na casa da consultora de empresas Priscilla Andrade Ribeiro, 31 anos, fazer o filho Matheus, de um ano e um mês dormir, sempre foi uma espécie de operação de guerra. "Ele faz birra, fica resmungando. Está com 12 quilos e só dorme no colo. Depois, ele acorda umas três ou quatro vezes durante a noite. O médico disse que é a fase dos dentes, que é normal."

      Não foi muito diferente com Renata Konzen, quando, há quase seis anos, se viu às voltas com o sono da primogênita Helena. Bióloga por formação, ela conta que, quando percebeu que alguma coisa estava errada, resolveu ler sobre neurologia do sono. O sucesso foi tanto, não só com Helena, mas com filhos de amigos, que Renata começou a dar consultorias para famílias com o mesmo problema. "A Helena se tornou um bebê tão calmo que, quando chorava, os vizinhos vinham saber se estava doente. Aí as pessoas perguntavam: como você faz? Eu fazia, e dava certo."

      Tática

      O segredo, conta Renata, é antecipar as necessidades do bebê, que podem ser de ordem alimentar, neurológica ou afetiva. "Às vezes, a criança não acorda para mamar, mas por falta de contato físico." Depois da chegada das gêmeas Íris e Flora, há três anos, ela abriu uma empresa, a Sosseguinho, para dar consultorias on-line e presenciais a pais de todo o Brasil e até do exterior. Entre os temas mais requisitados, dois serão tratados em palestras que Renata dará hoje, em Curitiba: como regular o sono das crianças e como lidar com as birras. A primeira está marcada para 9 horas e a segunda, para 14 horas, ambas no Full Jazz Hotel. Para assistir a uma delas, o preço é R$ 50, já o passaporte para as duas custa R$ 90. A consultora, que é de Cuiabá, volta em 16 de agosto, para novas palestras sobre a temática. Informações e inscrições pelo site www.sosseguinho.com.br.

      Entrevista

      Chorar até dormir não é solução

      Renata Konzen, consultora familiar

      A maior queixa dos pais é esta mesmo ‘meu filho troca o dia pela noite’?

      É, é também que ele acorda com muita frequência.

      Tem jeito mesmo? Muitas mães acabam levando o bebê para a cama, porque não aguentam ficar levantando...

      É uma coisa que não é errada, não há um estudo científico que diga que faz mal para a criança. Às vezes, eu até recomendo. Quando os pais trabalham muito, chegam e já está na hora da criança dormir, não tem como dar esse contato físico. Mas dormir na cama junto costuma atrapalhar mais o casal do que a criança.

      No caso do Arthur [citado na reportagem], que não dorme bem há um ano e três meses, ainda há saída para ensinar à mãe?

      Sim! 95% dos casos que atendo são crianças entre sete meses e dois anos. Porque até os seis meses todo mundo diz ‘é porque está só no peito, quando começar a comer vai dormir. Quando chega a seis meses, a pessoa se desespera. Tem jeito e normalmente não demora muito...

      Alguns métodos orientam a deixar o bebê chorando até adormecer, mas na verdade, ele precisa ficar calmo e não estressado...

      Quando deito para dormir, tenho que estar calma, se estou chorando há horas, sei que não vou dormir. Quando você aplica o [livro] "Nana, nenê", ele vai funcionar, mas a custos altos, de quebra de vínculo de confiança, porque a criança confia que ela chora e você vai atender. Mas aí falam ‘precisa aprender desde cedo que tem horário para tudo’. O nenê dessa idade nem sabe que existe horário. Eu quero que ela saiba ‘tô calma e vou dormir’, não que ela se acalme a partir de um chilique de uma hora.

      Em quanto tempo é possível solucionar o problema?

      É complicado dizer, porque não é ciência exata, mas em uma semana... Basta você identificar a causa. Se você for agir no sintoma, que é a mamada noturna, você vai ficar brigando com a criança por não sei quanto tempo.

      As causas da insônia são distintas?

      São. Um bebê pequenininho tem três esferas de necessidade: alimentar, de sono e afetiva. Sempre peso essas três e vamos vendo em que estágio de dificuldade de sono ele está. Se ele não consegue dormir, vou ensiná-lo a dormir. Mas se ele dorme fácil e vive acordando, vamos ver o que está atrapalhando o sono. Pode ser questão alimentar, pode ser uma alergia. Já a questão afetiva é muito pesada num bebê. Quando ele troca o dia pela noite, normalmente, tem o componente afetivo. Fica no carrinho o dia inteiro, a mãe trabalha, faz as coisas, chega de noite ele quer colo. O pessoal insiste em dizer que não pode dar colo porque vai acostumar. E eu falo que o nenê nasceu no colo, passou nove meses ali, se era para viciar, já está viciado. Ele não entende amor, só contato físico. Em um bebê pequeno é uma das coisas que mais atrapalham.

      Você fala em ensinar o bebê a dormir. Com fazer isso com alguém que não sabe falar, se expressar?

      Eu tenho que ajudá-lo a adormecer por conta própria. Normalmente, a mãe fica com ele no colo, balança, balança, até ele desfalecer. O que eu faço é tentar mantê-lo calmo, até que ele adormeça sozinho, sem eu ficar junto... Quando você consegue tirar o balanço, a mamadeira, e ele dormir, acabam os problemas de sono, porque a gente sempre usa uma muleta. Temos um ciclo de sono. Todo mundo acorda de noite. A gente dá uma olhada no relógio, se vira na cama, arruma a coberta. Estamos acordados, mas voltamos a dormir. [O problema é] quando o bebê precisa da chupeta, da mamadeira, do balancinho, do peito, para voltar a dormir, cada vez que ele der uma acordadinha dessas.

      A saída é não demorar muito para tomar atitude?

      É diferente quando é uma questão disciplinar, o bebê já tem um ano e não aceita ficar no berço. Aí aplicamos a "disciplina positiva", que é quando a mãe dá carinho, mas não cede. Vou estar do lado, em uma postura carinhosa, mas firme.

      Para o bebê tem que ficar ali do lado também?

      Sempre! [Mostra fotos de mãe que atende] Olha só, é muito comum segurarem na mão da mãe. Eu digo ‘você é quem mais passa confiança para o seu filho, por que tirar isso dele? Ele vai ficar com medo’.

      Mas naquelas pequenas acordadas de madrugada ele não vai precisar disso de novo?

      Não, é o que eu digo ‘demora um pouco para atender seu filho’. Às vezes, quando eles dão essas acordadinhas, dão uma resmungada e a mãe entra e o acorda. É cansativo? No primeiro e segundo dia, muito! Porque o nenê chora, você pega no colo, acalma, e vamos tentar de novo. O William Sears, que é um dos maiores nomes da criação com apego, diz ‘nenhum bebê vai parar de chorar, mas devo estar ao lado, dando apoio’.

      Algumas crianças maiores têm medo de dormir sozinhas. Como fazer?

      A partir dos quatro, cinco anos, começa um novo estágio de desenvolvimento a partir da percepção dos perigos do mundo. Antes, a criança não tem medo de nada, porque não percebe. Quando eles começam a perceber a morte como irreversível, começam a ter medo. Não adianta dizer para a criança que o medo dela é besteira. Não adianta dizer ‘não existe monstro, não tem perigo’. Quando esse medo é fantasioso, você entra nessa fantasia. Não deixa a criança assistir a telejornal. Ela não entende que na Ucrânia está morrendo um monte de gente, ela acha que é aqui. Ela está ali brincando ‘na Ucrânia morreram tantos, na Venezuela a miss morreu com um tiro na cabeça’, para ela, aquilo é dentro de casa. Até os 12 anos, elas não têm muito essa noção. Tem criança que com sete, oito anos já apresenta ansiedade generalizada. Se o pai demora a chegar, surta. Tem crianças que desenvolvem síndrome do pânico por causa disso.

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