• Carregando...

Polêmica à vista na prova de Literatura do vestibular da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Uma das questões, a de número 60, tem mais de uma resposta aceitável, apontam professores de cursinhos e colégios de Curitiba. A pergunta pedia que o candidato assinalasse a afirmativa incorreta sobre o livro Leão-de-chácara, de João Antônio. "A alternativa apontada pelo gabarito provisório da UFPR é realmente incorreta. O problema é que existem outras alternativas que também estão incorretas", diz Juarez Poletto, professor do cursinho Decisivo.

E nenhuma das quatro outras opções escapou da análise dos professores. "Uma alternativa fala sobre ‘o recorte social da obra’ como representativo ‘da vida noturna carioca’. Do modo como a frase está construída, deduz-se que toda a obra privilegia apenas o ambiente carioca, mas o conto ‘Paulinho Perna-Torta’ desenvolve-se no mundo noturno paulistano", aponta Poletto. Carlos Machado, professor do terceirão do Bom Jesus, menciona ainda outra alternativa em que se afirma que as histórias são cariocas (a afirmativa que faz o paralelo com o livro Memórias de um Sargento de Milícias). "Aliás, ‘Paulinho Perna-Torta’, que se passa em São Paulo, é o maior conto de Leão-de-chácara", ressalta.

Uma outra alternativa da questão 60 diz que o livro não explorava os temas do submundo da vida noturna como crítica ou denúncia. "Como dizer que não há denúncia quando o livro fala da maneira com que a polícia trata esses personagens da vida noturna? Ou então de mostrar um personagem como Batistão Pamblona, do conto ‘Joãozinho da Babilônia’, que era deputado e vivia nesse mundo ao mesmo tempo?", pergunta Machado. Élio Antunes, professor do Expoente, concorda: "ora, se o conto ‘Três Cunhadas’ e o ‘Paulinho Perna-Torta’ não forem denúncia, somente exposição de uma condição, então tudo se complica no estudo da literatura brasileira", escreveu Antunes em uma publicação interna do cursinho.

Poletto aponta que ainda outra alternativa pode ser considerada incorreta. "É a que afirma ser ‘a linguagem de João Antônio’ um ‘registro autêntico daquela que é empregada no espaço social retratado por sua ficção’. Se é um ‘registro au-têntico’, será linguagem literária, já que esta é sempre criação artística?", questiona. "Seria legível um ‘registro autêntico’, compreenderíamos as falas reais dos ‘malandros e merdunchos’, quer personagens quer como voz narrativa? Certo, trata-se de um mundo ficcional, entretanto essa ‘realidade ficcional’ tem paralelo na realidade factual e mais precisamente na realidade histórica – também esta fruto de um discurso, logo, o termo ‘autêntico’ parece excessivo", conclui Poletto. Ou seja, se depender da análise dos professores, todas as afirmações sobre o livro contidas na questão 60 estariam erradas – o vestibulando poderia assinalar qualquer opção e teria acertado a questão.

Poletto conta que percebeu a irregularidade nas questões assim que viu a prova, na segunda-feira. "E muitos alunos me procuraram também, ou seja, a questão tinha um problema que não seria percebido só por professores especializados em Literatura", afirma. Ele diz que, se prevalecer o bom senso, a questão será anulada pela Federal. "Se eles mantiverem a questão, precisarão de um comentário com uma boa base de argumentos", considera.

Recurso

O professor do Decisivo orientou seus alunos a entrar com recurso – o prazo para reclamações terminou às 17 horas de ontem. Segundo a assessoria de imprensa da UFPR, se houver tentativas de anular a pergunta 60, o Núcleo de Concursos vai se pronunciar por meio do resultado dos recursos.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]