O motorista Dejair Batista Câmara cresceu testemunhando casos de familiares que até o meio da vida eram completamente saudáveis mas que, por volta dos 40 anos, começavam a apresentar incapacidade de controlar movimentos, alterações de personalidade e perda da capacidade intelectual. Anos depois, Câmara teve de encarar o sofrimento da própria mãe. Abalado com a situação e sem entender a causa dos problemas de saúde que afetavam seus familiares, ele procurou ajuda médica. Após acompanhar a mãe em consultas com diversos especialistas, o motorista finalmente teve o diagnóstico. A família dele carrega um gene responsável por uma enfermidade rara: a Doença de Huntington.
Trata-se de uma doença degenerativa, sem cura, cujos sintomas são decorrentes da perda de células nervosas de uma determinada região do cérebro, denominada gânglios da base. Como conseqüência, a pessoa começa a manifestar movimentos involuntários nos braços, pernas, tronco e face, dificuldade de pensar e humor deprimido ou irritado. Posteriormente, aparecem alterações na fala e na deglutição, perda de equilíbrio e da capacidade de pensamento. No estágio mais avançado, o portador pode acabar de cama, tendo perdido muito peso e sendo incapaz de falar e andar. "Descobrimos a doença quando minha mãe tinha cerca de 45 anos. Hoje, aos 60, ela parece um bebê, é totalmente dependente e vive em uma cama", conta Câmara.
Quem é filho de um portador tem 50% de chance de carregar o gene "defeituoso", que é transmitido de pai para filho sem pular uma geração. Quem carrega o gene certamente irá desenvolver a doença, a não ser que morra de alguma outra causa antes do aparecimento dos sintomas. A incidência da Doença de Huntington é de 5 a 10 casos em cada 100 mil habitantes.
O gene alterado que causa a doença foi localizado em 1993. Sabe-se que a anomalia ocorre quando a repetição da seqüência de substâncias que formam a proteína huntington se expande. "As pesquisas que vêm sendo feitas buscam uma maneira de conseguir silenciar o gene doente. Já sabemos que a proteína é essencial para a vida, portanto não adianta tentar eliminá-la", explica o neurologista da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Nílton Becker.
O pesquisador Julio Fernandes Leite, da União dos Parentes e Amigos dos Doentes de Huntington, explica que, em geral, há um intervalo de 15 a 20 anos desde as primeiras manifestações até a morte do paciente. "É muito triste porque a doença pega bem a fase produtiva do indivíduo, quando ele deveria estar no auge da sua capacidade. Por isso falamos que é uma doença social e econômica que abala também a estrutura familiar", afirma. Leite destaca, entretanto, que o doente não morre por causa da doença, mas devido a complicações por ela trazidas. "Com o avanço da doença, é comum que a pessoa tenha traumas por causa de quedas, infecções, pneumonia ou até mesmo engasgo, decorrente da dificuldade de deglutição", diz.
Apesar de não haver cura, é possível reduzir os sintomas com medicamentos. "Geralmente os portadores de DH tem tendência a depressão, o índice de suicídio nas famílias portadoras é até oito vezes maior do que na população normal. Então temos que tratar também esses problemas associados", esclarece Leite.
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