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Ponta Grossa – As famílias Specalsiki, Quadros e Kozan foram marcadas pela dor. Ambas perderam integrantes em razão de supostos erros de diagnóstico ou imperícia médica. Hoje, cada uma delas vivencia um momento diferente. Evaldo Specalsiki está perto do fim de uma batalha judicial que já dura quatro anos. Ivana Quadros Ferreira vive disputa semelhante há dois meses e Maria Kozan ainda estuda as medidas que irá tomar pela morte da filha, na semana passada.

Estes não são casos isolados no estado. As queixas contra erros médicos aumentaram 161% em relação à média mensal de 2004, que foi de 26 reclamações, ao Conselho Regional de Medicina (CRM) do Paraná. Em 2005, a média está em 68. As reclamações nos primeiros quatro meses deste ano já representam 85% das apresentadas durante todo o ano passado. De janeiro a abril, 275 registros foram encaminhados à entidade, enquanto em 2004 foram 320.

Entretanto, na visão do presidente do CRM, o ginecologista e obstetra Hélcio Bertolozzi Soares, isso não significa que os médicos estão errando mais. "Hoje a sociedade tem uma percepção maior sobre cidadania e quando acha que algo está errado, vai atrás dos seus direitos", afirma.

Se aumentaram as queixas, cresceram também as investigações. Em 2003, apenas 12% das queixas se transformaram em processos administrativos no CRM. No ano seguinte, o porcentual subiu para 28% e este ano 32% das reclamações feitas até agora estão sendo analisadas. Há ainda os processos que correm na Justiça, mas não há como estimar quantos são exatamente. No Ministério Público Estadual, somente pelo centro de apoio operacional das promotorias da saúde pública, tramitam 108 processos contra médicos. Destes, 65 são de Curitiba e o restante é do interior do estado.

Se o assunto preocupa a sociedade, deixa também apreensiva a classe médica. De acordo com uma pesquisa do Iatros Estatística e Pesquisa Científica para Profissionais da Saúde realizada com 465 médicos, o erro médico é algo que preocupa 90% dos entrevistados. Segundo Soares, a jornada de trabalho além da capacidade humana, o sucateamento de hospitais e aparelhamentos e a falta de recursos para atualizações constantes são fatores que contribuem para a incidência de erros.

O cansaço físico é, para a maior parte dos entrevistados, a principal causa das imperícias. "O cansaço afasta a perspicácia do diagnóstico e o prejuízo é, sem dúvida, do paciente", afirma o presidente do CRM. A recomendação do conselho é de que um médico não ultrapasse 12 horas de trabalho por plantão, mas a realidade para a maioria da classe é uma jornada que vai de 18 a 24 horas ininterruptas.

Histórias

Maria Gabriela, a filha de 6 meses de Maria Kozan, era a última paciente do pediatra que varou a noite em plantão. No último dia 7, o bebê deu entrada no Hospital da Criança, em Ponta Grossa, com febre alta e vômitos. Em dez minutos de consulta – segundo a mãe – foi constatado um quadro infeccioso na criança, que foi medicada e liberada. Doze horas depois, o bebê morreu em decorrência de uma meningite.

Diagnóstico errado está em primeiro lugar no ranking das queixas dos pacientes junto a órgãos competentes. Essa é a base de defesa da família de Ivana Quadros, que perdeu a filha de cinco anos depois da criança passar três dias em tratamento para pneumonia. A menina morreu na mesa de cirurgia em decorrência de uma apendicite.

O inquérito aberto na Polícia Civil de Ponta Grossa, há dois meses, para apurar a responsabilidade pela morte da filha não ameniza a dor da perda, mas deixa a esperança de punição. "Pelo menos vamos alertar a população e evitar que mais mortes aconteçam", diz Ivana, que também pede uma indenização por danos morais.

Condenação

O número de processos em tramitação é grande, mas poucos chegam a ter um resultado final satisfatório para as famílias das vítimas. Evaldo Specalsiki é uma exceção. Há seis anos, o filho dele morreu depois de passar por uma cirurgia de adenóide e amígdalas, um procedimento considerado corriqueiro pela classe médica. Em maio, numa decisão inédita em Ponta Grossa, a Justiça condenou criminalmente dois médicos pela morte do menino.

O otorrinolaringologista e o anestesiologista, responsáveis pela cirurgia, terão de prestar serviços comunitários por três anos e pagar 20 salários mínimos à família. O processo corre no Tribunal de Justiça e está em fase de recurso. No ano passado, os médicos já foram responsabilizados pelo mesmo caso na esfera cível e condenados a pagar uma indenização de R$ 200 mil. "A punição não acalma a dor, mas a Justiça foi feita", diz Specalsiki.

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