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| Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo

Público X Privado

"Obstrução de via é caso de polícia", diz urbanista

Convidado a analisar a questão da obstrução de vias públicas para fins particulares, o arquiteto Clovis Ultramari, do curso de Arquitetura da PUCPR, diz que o questionamento deveria ser dirigido a um especialista em segurança pública e não a um urbanista. O tom de provocação se deve à necessidade de preservar o direito público sobre o privado.

"É área pública e ninguém tem direito de se apropriar. É caso de polícia. O desrespeito à cidade se constrói com pequenas concessões", observa.

Diante das apropriações verificadas, Ultramari prevê dificuldades. "Reverter qualquer situação, como desapropriar uma área, vai servir de base a outros pedidos", argumenta, sobre o passivo que está sendo gerado nas vias da cidade.

Divisórias?

Moradores de rua sem saída ainda sonham com cancela

Em 2010, um projeto polêmico do então vereador Mário Celso Cunha (PSB) propunha permitir que moradores de ruas sem saída colocassem cancelas nos acessos, garantindo controle de entrada e segurança. Após uma avalanche de críticas de urbanistas, o projeto acabou engavetado pelo então prefeito Luciano Ducci.

À época, moradores de vias com essas características, como os da Rua Pedro Lauffer, no bairro Campina do Siqueira, mostraram interesse no projeto, inclusive em entrevista à Gazeta do Povo. Como não quiseram levá-lo adiante, à revelia da lei, acabaram desistindo da ideia da cancela.

"Apesar dos custos de manutenção, acredito que seria interessante do ponto de vista da segurança. Mas como o projeto não andou, sequer chegamos a discutir", conta o agropecuarista Nelson Buffara, 56 anos, os últimos 21 deles como morador da Rua Pedro Lauffer.

A pedidos

A obstrução de vias públicas incomoda parte da população. Somente neste ano, foram registrados, em média, 12 pedidos para abertura de vias no serviço 156. Em 2012, foram 151 solicitações. De acordo com o Instituto Curitiba de Informática, as justificativas são as mais variadas. As mais comuns se referem às melhorias no trânsito e no transporte público.

Falta de dados

O Ippuc não possui levantamento sobre ruas bloqueadas na capital. Se uma área de domínio público estiver obstruída por empreendimento privado, a questão será responsabilidade da Secretaria Municipal de Urbanismo. Procurado por mais de uma semana, o órgão informou que equipes técnicas estavam avaliando os pontos citados pela reportagem.

  • Detalhe de jardinete na Rua Carmelo Rangel, no Batel, em Curitiba. Prefeitura não confirma, mas suspeita-se que jardim que interrompe rua não foi instalado por iniciativa do poder público
  • Impasse envolvendo o Shopping Pátio Batel – que necessitaria derrubar o Bosque Gomm para fazer vazão de veículos – pode encontrar uma solução
  • Detalhe da Rua Celeste Santi, no Ahú, um dos jardinetes apontados pela população como obstáculo ao trânsito. Jardins podem ser inovação urbanística de grande valor, mas faltam dados sobre quantos são e seu status junto à prefeitura. Autorizados ou não?
  • Outro detalhe da Rua Celeste Santi. Curitiba é marcada pela preponderância dos interesses privados se impondo sobre os interesses públicos
  • Geral da Alameda Dom Pedro II, no Batel: edifício de luxo, o Springfield interrompe fluxo na região. Gestão Beto Richa junto à prefeitura alegou não ter dinheiro para arcar com a desapropriação
  • A interrupção da Alameda Dom Pedro II, no Batel, mostra fragilidade do poder público em lidar com privatização dos espaços urbanos
  • Cadê a rua? Rua Tapiranga, no emergente bairro do São Braz: condomínio fechado não só abortou a rua como criou sensação de insegurança na região
  • Rua Via Firenze, no bairro Vista Alegre, outro exemplo das interrupções urbanas criadas pelos condomínios fechados

Da lista de contrapartidas entregue pela prefeitura aos administradores do Shopping Pátio Batel – próximo a ser inaugurado –, duas chamam a atenção por demandarem desobstrução de via pública. A interrupção de ruas, no entanto, é algo comum em Curitiba e os bloqueios são causados por condomínios, estacionamentos e até por simpáticos jardinetes.

INFOGRÁFICO: Veja algumas situações típicas de obstrução para pedestres e motoristasSLIDESHOW: Veja imagens de ruas interrompidas em Curitiba

No Jardim Vista Alegre, por exemplo, a Rua Via Firenze praticamente desapareceu. Isso porque virou exclusividade do condomínio que, além de se apropriar do espaço físico, leva o mesmo nome da via. Moradores recém-chegados dizem nunca ter ouvido falar que ali passava uma rua, mas os antigos reclamam.

"Havia uma rua, sim. E era asfaltada. Agora, a gente entra por um lado da rua e sai pelo mesmo lado, isso se for autorizado", reclama Arildo Gomes dos Santos, 43 anos. Ele retornou ao Vista Alegre após 24 anos longe do bairro e conta ter se assustado com a presença do condomínio no lugar da via pública.

No caso das intervenções viárias do Pátio Batel, o shop­ping terá de se virar para fazer uma ligação entre as ruas Hermes Fontes e Bruno Filgueira sem cortar árvores do Bosque Gomm, área tombada pelo Patrimônio Histórico. Quem mora no bairro afirma que há, bem perto dali, uma solução menos traumática para desafogar o trânsito da região, mas essa solução esbarra em um jardinete construído na Rua Carmelo Rangel. De acordo com moradores de ruas próximas, o logradouro não foi construído pelo poder público. A prefeitura não confirma que o jardinete é iniciativa da população.

Outra intervenção polêmica é a abertura da Rua Abrão Lerner até a Avenida General Mário Tourinho. Para fazê-lo, o shopping Pátio Batel terá de desmontar o estacionamento de uma concessionária. De acordo com a prefeitura, o terreno é de domínio público e já há um entendimento com os lojistas que o ocupam.

O mesmo não se pode dizer do imbróglio em que se transformou, há cinco anos, a criação do binário Avenida Batel-Bispo Dom José e Her­mes Fontes-Dom Pedro II. A Alameda Dom Pedro II é interrompida pelo condomínio Springfield. À época, apesar de considerar a intervenção viária importante para a região, a administração Beto Richa disse que que não havia verba para desapropriar o terreno.

O muro e a rua

Já bem longe do Batel, a construção de um muro nos fundos de um condomínio fechou a Rua Tapiranga, no São Braz. Pior do que a interrupção do tráfego, porém, foi um efeito inesperado: a sensação de insegurança. "Construíram o muro há um ano. Mas o problema maior é que ao redor ficou uma viela estreita, cheia de mato, que tem atraído usuários de drogas", reclama o mecânico Bruno do Amaral, 27 anos, que mora há dez anos em uma das casas da via bloqueada.

Piquenique e tapete vermelho em prol do Bosque Gomm

Um grupo de 60 manifestantes se reuniu na manhã de ontem, em frente ao Bosque da Casa Gomm, no Batel, para uma manifestação pela preservação da área. O local - que é tombado pelo Patrimônio Histórico - estaria ameaçado pela necessidade de abrir arruamento para escoar o trânsito do Shopping Pátio Batel.

A manifestação, denominada "Piquenique dos Sabiás", foi promovida pelo grupo "Salvemos o Bosque da Casa Gomm", que tem 1,7 mil fãs no Facebook. Por volta das 10 horas, foram servidos cerca de 500 bolinhos caseiros aos participantes, recepcionados com um tapete vermelho estendido na entrada do local. A chuva atrapalhou o protesto.No fim de junho, liminar da Justiça proibiu o Grupo Soifer – responsável pela obra do Pátio Batel – de realizar qualquer intervenção no Bosque da Casa Gomm. Originalmente, o imóvel centenário ocupava o espaço onde foi erguido o novo shopping e foi removido para os fundos do terreno, agora ameaçado.

Pequeno jardim público gera reclamação

Apesar de aprazível, um jardinete inaugurado em 1999 pelo então prefeito Cássio Taniguchi – e que homenageia uma das fundadoras do movimento adventista sabatista, Ellen White (1827-1915) – já gerou uma reclamação ao serviço 156 da prefeitura.

Motivo: o jardinete interrompe a Rua Celeste Santi, no Ahú, entre as ruas Mateus Leme e Vieira dos Santos. "Para quem não anda de carro, o local até que é bonito. Mas complica muito a vida de quem precisa pegar a Rua Mateus Leme", protesta o supervisor de vendas Reinaldo Chapanski, 57 anos.

Ruas que levam a lugar nenhum

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