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Vídeo: | Rodolfo Bührer / Gazeta do Povo
Vídeo:| Foto: Rodolfo Bührer / Gazeta do Povo

Um ano de luta contra a violência

O Dia Internacional da Mulher foi fundamental para a criação do Centro de Referência e Atendimento à Mulher em Situação de Violência, em Curitiba, que completa hoje 1 ano de funcionamento. A instituição atendeu até o fim de fevereiro deste ano 390 mulheres vítimas de violência doméstica na capital e região metropolitana. Num só espaço, o Centro oferece atendimento psicológico, social e jurídico.

Para a diarista Adriana (nome fictício), 42 anos, foi só com o atendimento que recebeu no Centro, há 15 dias, que ela conseguiu recuperar a auto-estima e enfrentar seu ex-marido, que ameaçou ela e suas duas filhas adolescentes de morte. Adriana precisou chamar a polícia, que a aconselhou a procurar ajuda. "Agora estou mais segura e sei que não estou sozinha, tenho amparo legal e psicológico", diz.

Casada há 17 anos e separada (não legalmente) há dois, Rosana lembra que seu ex-marido sempre foi violento e que chegou a sair de casa quatro vezes. "Sempre tive medo e vergonha de procurar a Delegacia da Mulher", diz.

O fato de morar longe da família, que reside no interior de outro estado, fazia com que Adriana tivesse ainda mais medo de mudar a situação. Nem o risco de morte que correu, há um ano, a fez reagir. "Ele tentou me enforcar e só parou de me agredir porque caiu um vaso muito pesado no pé dele", diz.

A psicóloga do Centro de Referência, Rosana Saadi Weinhardt, explica que o caso de Adriana não é exceção. "Muitas mulheres acham que seu caso não tem solução. E existe um mito de que mulher gosta de apanhar. Não é isso que ocorre. A mulher acredita e permanece com o agressor", diz.

Amparada pelo Centro, Adriana lembra o quanto sua vida tem mudado. "Me arrependo de não ter feito isso antes. Nesses anos todos, eu apenas servi de empregada e como objeto. Nunca fui valorizada por ele", finaliza.

No Dia Internacional da Mulher, uma boa notícia mostra que o abismo da desigualdade entre homens e mulheres vem diminuindo – lentamente, mas diminuindo. As trabalhadoras paranaenses, assim como as brasileiras, tiveram um maior aumento no rendimento médio mensal em comparação com os homens.

Um balanço divulgado ontem pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos no Paraná (Dieese-PR) e pelo Sindicato dos Bancários de Curitiba e Região Metropolitana mostra que o salário da mulher no Paraná aumentou em média 45,83%, passando de R$ 408, em 2002, para R$ 595, em 2005. A variação é maior que a dos homens paranaenses, que no mesmo período tiveram um reajuste médio de 37,12% – passaram de R$ 584 para R$ 815.

Mesmo com o aumento, a presidente do Sindicato dos Bancários, Marisa Stédile, ressalta que a mulher ainda sofre discriminação no mercado de trabalho. E para isso aponta a diferença ainda existente na remuneração entre os gêneros. Em 2005, as mulheres no Paraná tiveram salários 42,23% menores que os homens. "A maioria ainda está inserida em profissões menos valorizadas, com o salário mínimo como base, que teve uma boa valorização no período", diz.

Na análise feita do setor bancário em todo o país, o Paraná ocupa o segundo lugar no ranking da maior diferença salarial entre homens e mulheres, que é de 30,02%. Além disso, os dados apresentados pelas duas entidades demonstram a desigualdade entre a qualificação e os salários nos dois gêneros. Enquanto 25,54% das mulheres têm curso superior completo ou incompleto, somente 13,12% dos homens têm igual qualificação no Paraná. Apesar disso, apenas uma mulher a cada três homens recebem mais de 20 salários mínimos.

Marisa ressalta que muitos avanços na área de emprego e trabalho foram conquistados pelas mulheres nas últimas décadas. "Mas a progressão funcional da mulher ainda é muito difícil", diz. Na opinião da professora de Sociologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Marlene Tomanini, isso ainda ocorre porque toda a carga da reprodução humana recai sobre a mulher. "A reprodução é biológica e social, não apenas familiar. Não é um desejo privado, mas da sociedade. E se não quisermos mais reproduzir ninguém, como ficaria?"

Em outros campos, como no legal e de políticas públicas, o gênero feminino foi conquistando cada vez mais espaço desde a instituição oficial pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1975, do 8 de março como o Dia Internacional da Mulher. Um dos pontapés iniciais foi a mudança na redação da Constituição Brasileira, de 1988, que garantiu a igualdade de direitos entre homens e mulheres. E de lá para cá foram muitas conquistas, até culminar na Lei Maria da Penha, que entrou em vigor em setembro do ano passado e estabeleceu penas mais rígidas para quem comete violência doméstica contra esposas e companheiras.

Para a socióloga Jacqueline Pitanguy, uma das organizadoras do livro O Progresso das Mulheres no Brasil, lançado em novembro do ano passado, a sociedade ainda tem a percepção do sexo feminino como mais dependente e frágil. "Culturalmente não existe a visão de igualdade entre homens e mulheres", diz. Para a socióloga, essa discriminação começa dentro do próprio ambiente familiar, onde tanto homens como mulheres trabalham, mas as tarefas domésticas e o cuidado dos filhos nem sempre não são divididos. "A presença masculina nos espaços decisórios é muito forte e as mulheres ainda são exceção", afirma.

Diante de tantos avanços que contribuíram para a diminuição da desigualdade entre os gêneros, a dúvida que persiste é se há motivos para a existência de um dia especial para as mulheres. Na opinião da presidente do Conselho Estadual da Mulher do Paraná, Ivanira Gavião Pinheiro, a data é importante para chamar a atenção da sociedade para a discriminação ainda sofrida pela mulher. "Evidentemente que não lutamos pela igualdade no sentido físico, mas no sentido de oportunidades."

Para a socióloga Jaqueline, todas as estatísticas que existem sobre o assunto mostram ainda a exclusão da mulher, por isso a importância do dia. "A igualdade de oportunidades não anula as diferenças entre os gêneros. Pode comportar a complementação e intercambialidade (troca) de papéis", diz. Já a professora Marlene ressalta que a data tem de ser menos comemorativa e mais reflexiva. "Há um desafio de levar o Dia Internacional da Mulher mais a sério e menos bandeiroso", diz.

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