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Manual

Confira as dicas da policial Tânia Guerreiro no combate à pedofilia:

Incidência – A sargento trabalha com os seguintes dados: 67% dos pedófilos são padrastos, 20% são pais; 10% são mulheres (mãe, tia, madrinha, babá, diarista, empregada). Também costumam ser agressores o avô, o irmão mais velho, parentes hospedados na casa.

O agressor – Pode estar em qualquer classe social e nível intelectual. Vê a criança como um objeto sexual e cultiva seu poder sobre a vítima.

Pacto de silêncio – Até os 5 anos, muitas crianças entendem a agressão sexual como um carinho, o que as faz ceder. Passada essa fase, o agressor usa de estratégias como o trato, o segredo, a promessa e a ameaça.

Estratégia – O pedófilo age de maneira lenta. Espera o tempo que for preciso até conseguir o ato sexual completo. Tem senso de oportunidade e jamais dá "bandeira" em público.

Veracidade – De acordo com a policial, a criança não é capaz de inventar uma história sexual. No máximo reproduz o que vê. Se não estiver sendo seviciada, pode estar assistindo a pessoas fazendo sexo ou tendo acesso a material pornográfico.

Observar

• Quando a criança se masturba em público, mostra órgãos sexuais ou roupas íntimas é sinal de que pode estar sendo violada.

• A criança vitimizada costuma ter assaduras e carne-viva nos genitais. Meninas tendem a segurar a urina, por causa do mal-estar provocado pela ardência. Outro sintoma é recusar o sabonete nas partes machucadas durante o banho e a fricção da toalha.

• Vítimas de pedófilos se recusam a ficar em determinados cômodos da casa sozinhas. Costumam tomar banho compulsivamente, tendem a se mutilar e a ter distúrbios do sono e na alimentação.

Bom conselho

• Procure evitar idas não monitoradas a casas de vizinhos que tenham brinquedos e guloseimas à vontade.

• Não deixe a criança sozinha em banheiros públicos, pois figuram entre os locais onde acontece o maior número de estupros.

• Cuidado ao contratar serviços domésticos – carpintaria, entregas, limpeza, manutenção. Oriente seu filho para que não abra a porta quando estiver sozinho.

• Não crie uma neurose. O abraço e o beijo fazem parte, mas estabeleça limites corporais. Criança deve aprender a se proteger e saber que seus genitais não podem ser tocados por ninguém sem autorização.

Fonte: Tânia Guerreiro, PM.

A sargento da Polícia Militar Tânia Mara Guerreiro, 47 anos, planeja bater recordes em 2007. Vai ter de suar muito. Ano passado, ela percorreu 55 mil quilômetros em todo o estado. Nas cidades por onde andou, fez 81 palestras e calcula ter falado para pelo menos 15 mil pessoas – o equivalente a uma Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) inteira. Passou por 11 universidades, conversou com estudantes de Direito, Pedagogia e Psicologia, além de ter se dirigido a oficiais de 26 unidades militares. Até o momento, tem tido um boa performance: só em maio fará oito palestras, todas sobre o tema que a persegue há 25 anos, a pedofilia. Combatê-lo é sua causa secreta.

A cruzada de Tânia fez dela uma das mais ativas representantes do poder público paranaense no combate ao abuso sexual de crianças e adolescentes. O mérito não se deve todo a seu fôlego de gato. A pedofilia é uma tragédia sem rosto e sem números, o que levou a policial a acompanhar histórias alheias como se tivessem acontecido na sua casa. E a quantificá-las. Tornou-se um banco de dados ambulante – o que não é pouco. Há poucas informações disponíveis sobre o assunto porque o Direito Penal não o reconhece como um delito específico, mas uma variante dos crimes sexuais. Graças a essa aberração legal, o homem que violenta uma mulher de 30 anos e o que ataca uma criança de 6 estão passíveis à mesma punição – pena de seis a dez anos de detenção.

Por força da lei, um órgão oficial como o Núcleo de Proteção à Criança e ao Adolescente Vítimas de Crime (Nucria) não pode fazer distinção entre a pedofilia e outros delitos. Em 2005, por exemplo, foram 653 boletins de ocorrência na capital, incluindo de homicídio e maus-tratos a violência sexual. Atualmente, os dados passam por geoprocessamento e devem integrar o novo mapa da violência do estado, o que leva o órgão a não divulgar os índices de 2006 e 2007.

Ano passado, a Gazeta do Povo apurou que 26,6% das ocorrências do Nucria eram de crime sexual, com uma média de sete ocorrências por dia, 200 casos num ano. De acordo com o núcleo de geoprocessamento, esses números são questionáveis, pois surgiram da reunião aleatória de informações oriundas de várias delegacias e outras fontes. Mas é improvável que o número de casos tenha diminuído: o Nucria foi criado em 2004 e ainda é desconhecido da maior parte da população. À medida que o tempo passa, o volume de denúncias aumenta. "Não é histeria. Há mais mecanismos de defesa da infância. As pessoas sabem disso. Foi-se o tempo em que criança até comia em separado", observa a PM.

Militância

A indignação da sargento Tânia com o avanço da violência sexual contra a infância é indisfarçável. Tanto que decidiu organizar suas próprias estatísticas, com dados recolhidos nos quatro cantos do mundo, incluindo congressos internacionais na Hungria e Canadá. Sua maior fonte, contudo, é a experiência acumulada no dia-a-dia. Calcula pelo menos quatro denúncias por dia em Curitiba e região metropolitana, índice abaixo da média do Nucria. "Não estudei Psicologia. O que falo é o que vejo e posso provar", diz. (veja texto ao lado).

Segundo a policial, 87% dos casos de pedofilia envolvem o pai ou o padrasto. Sem falar nos avôs, irmãos mais velhos e primos – com participações sempre acima da expectativa –, o que faz das próprias famílias as grandes vilãs. "São números assustadores", indigna-se a mulher que administra a farda, um bom estoque de jóias e bijuterias, emoções à flor da pele e ganas de mudar as leis, cujos parágrafos têm na ponta da língua.

É do tipo despachada. Fala alto e não manda recado. Tanto é que suas palestras são terminantemente proibidas para menores de 18 anos. Pudera. Em duas horas e meia de fala, não usa de meios-tons e já se acostumou a ver participantes em crises de choro, pedindo para sair ao relembrar suas biografias de abusados. No Norte do Paraná, há pouco tempo, a comoção ajudou a salvar uma criança. "Enquanto assistia à palestra, a mãe percebeu o que estava acontecendo com a filha, saiu e depois me ligou, confirmando o que suspeitou. Sei que todos os que saem desses encontros se tornam agentes no combate à pedofilia", reforça.

Um dos pontos mais controvertidos são as orientações dadas por Tânia sobre como tratar pedofilia com as crianças. Ela não recomenda floreios e palavras científicas. "Tem de dizer para o menino e para a menina que ninguém deve mexer no pipi e na pepeca, nem lamber o pipi e a pepeca dos outros. Os pequenos entendem do que se trata", garante. De tanto dar dicas, Tânia decidiu organizar um manual em que descreve passo a passo a atuação do pedófilo. "A pedofilia tem a idade da humanidade. Antigamente, ninguém falava porque era tabu. Tive de gritar socorro pelos quatro cantos do mundo e pedir para que os pais cuidem de seus filhos. É um campo minado."

O mais difícil é traçar um perfil do abusador. Pode ser o pai de família exemplar, o bom moço com quem qualquer um deixaria o filho, o compadre com o qual se tem um relacionamento de décadas e o sujeito estressado, que atazana a mulher e maltrata o cachorro. Estima-se que 90% dos casos de pedofilia sejam praticados por homens, mas a participação de mulheres é muitas vezes indireta. Tânia já observou a mãe que vira cúmplice e que culpa o abusado pelo que aconteceu. "O perfil do pedófilo eu não conheço. O que sei é que não importa o quanto ama a criança; não importa se é doutor ou analfabeto. Ele pode estar em qualquer lugar. Pode estar levando a criança num banheiro. Ele é lento e paciente."

Serviço: Denúncias de maus-tratos e crimes sexuais devem ser feitas ao Nucria (41) 3244-3577.

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