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Casos de extorsão mediante seqüestro no Paraná |
Casos de extorsão mediante seqüestro no Paraná| Foto:

Uma decisão tomada pelo governo federal pode aumentar a prática do crime de extorsão mediante seqüestro no Brasil. Com o objetivo de "cobrir danos patrimoniais" causados pelos bandidos, a União autorizou a venda do seguro-resgate. Ou seja, se um contratante do serviço for seqüestrado, quem pagará o resgate será a seguradora.

O que parece uma solução para a violência pode ser o gatilho para novos crimes.

Especialistas afirmam que o seguro funcionaria para os seqüestradores como um incentivo, quase uma garantia de recebimento do valor pedido. O pagamento do resgate, aliás, nem sempre preserva a vida dos reféns. Na Cidade do México, por exemplo, 59 pessoas foram seqüestradas e assassinadas de dezembro de 2006 a agosto de 2008. Coincidência ou não, a venda desse tipo de seguro é legal na metrópole mexicana.

No Brasil, a Superintendência de Seguros Privados (Susep) afirma que as empresas já podem inclusive negociar o seguro, embora a regulamentação do assunto ainda não esteja completa.

Melhor saída

Segundo especialistas, o ideal seria proibir o pagamento do resgate no país, algo comum em países desenvolvidos como a Itália. Outra saída seria aplicar penas mais rigorosas, como a prisão perpétua – o que no Brasil é impossível, porque a Constituição não permite. "Tudo, menos financiar a ação de quadrilhas especializadas, correndo o risco de explodir o número de extorsão mediante seqüestro e financiar as ações do crime organizado", diz o delegado-titular do Grupo Tigre, Riad Braga Farhat.

Para o perito criminal da Polícia Federal Ângelo Salignac, a criação do seguro é um absurdo. "Vão garantir o sustento do bandido. Eu não consigo entender a lógica que está por trás disso. Enquanto alguns países estão proibindo o pagamento de resgate, o Brasil está andando na contramão."

Com a experiência negociadoe em diversos casos, o perito conta que percebeu os segredos e a especialização das quadrilhas de seqüestradores. Embora não fale nomes, ele negociou, por exemplo, o resgate de Wellington Camargo, irmão dos cantores Zezé di Camargo e Luciano, na década de 90.

"Todo o trabalho é feito por células. Normalmente, a pessoa que conversa com a família não sabe onde está o refém. Além disso, os bandidos costumam alugar armas e podem até terceirizar o cativeiro, tudo para evitar a localização da vítima", explica.

De acordo com Salignac, a investigação de uma extorsão mediante seqüestro é caríssima. "Precisa de muita gente, muitos equipamentos, autorizações judiciais para fazer interceptação telefônica", diz.

Ele defende que a família deve sempre procurar a polícia. "Nesses casos, negociar é muito complicado. Qualquer erro, perde-se uma vida. O ideal é entregar o caso à polícia", aconselha.

A estrutura da polícia e da Justiça é fator determinante para conter esse tipo de crime, opina Salignac. Para ele, seqüestro é coisa de terceiro mundo, onde há polícia corrupta. "É crime que só acontece em países pobres ou que têm ligação com o crime organizado." Ele diz que, à medida que a polícia se estrutura melhor, aproximando-se do Ministério Público, e o Poder Judiciário tem mecanismos de ação rápida, o crime diminui. "Nos Estados Unidos ele é raro porque eles têm uma estrutura que desestimula esse tipo de delito."

Seguro é legal

Apesar de todas as críticas, o seguro-resgate é perfeito aos olhos das leis brasileiras, pois o negócio das seguradoras é atuar em cima de riscos. "Do ponto de vista jurídico não existe nenhum obstáculo. Do ponto de vista criminal ainda não há dados suficientes para formular hipóteses do que pode acontecer no futuro", afirma Juarez Cirino dos Santos, especialista em Criminologia e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

O promotor de Justiça Fábio Guaragni, professor de Direito Penal, diz que o medo é o vetor desse novo produto. "Estamos vivendo num universo social em que o medo virou uma mercadoria. Parece-me uma pura exploração do medo. É uma aventura capitalista extrema", completa.

Enquanto os especialistas tentam decifrar os possíveis efeitos do seguro-resgate, alguns dos principais interessados estão calados. A Susep não comenta o assunto, muito menos o Sindicato dos Corretores de Seguros e de Capitalização do Paraná, Sincor-PR.

A empresa inglesa de segurança Control Risks, multinacional especializada em atender seguradoras e negociar resgastes em diversos países, também não quis comentar. Diz que "a publicidade pode aumentar a proliferação deste tipo de crime". Para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o seguro-resgate é fruto da grande insegurança pública que toma conta do país.

Entre 2004 e 2006, o Brasil registrou 1.274 extorsões mediante seqüestro. As regiões Centro-Oeste e Sudeste foram as campeãs. No Paraná, o Grupo Tigre, especializado em ações anti-seqüestro, conseguiu resolver os 28 casos registrados nos últimos cinco anos. Todos acabaram com a prisão dos envolvidos, sem entrega de dinheiro ou atendimento de exigências para realizar os resgates.

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