Serraglio, o detetive do Congresso

• 0

Curitiba – Professor de Direito e deputado federal no segundo mandato pelo PMDB, Osmar Serraglio foi alçado à condição de figura exponencial da política brasileira quando assumiu a relatoria da CPI dos Correios. Quem achava que o pouco conhecido parlamentar do Noroeste paranaense seria presa fácil no jogo de bastidores em Brasília mordeu a língua. Do trabalho de Serraglio e seus sub-relatores foram identificadas diversas irregularidades em estatais e uma série de indícios que levam a crer que houve mesmo um fluxo de dinheiro para financiamento de uma base de apoio ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva – o mensalão denunciado pelo ex-deputado Roberto Jefferson, também apelidado de "valerioduto". Abaixo, trechos da entrevista concedida na quinta-feira à Gazeta.

Gazeta do Povo – Existiu mesmo um mensalão, nos moldes do que o ex-deputado Roberto Jefferson denunciou?

Osmar Serraglio – Há pelo menos seis indícios a confirmar isso. Há o testemunho dele, que é alguém que trabalhava dentro do sistema e portanto fala com conhecimento de causa. Tem também a relação do Marcos Valério e da Simone Vasconcelos (diretora financeira da SMPB). Há ainda os saques que foram identificados, a lista de presença no banco, os testemunhos das pessoas mais envolvidas, como Genú (João Cláudio, assessor do PP) e Lamas (Jacinto, tesoureiro do PL). Depois, as renúncias são como uma confirmação. Líderes partidários renunciaram porque reconheciam uma seqüência nisso.

E qual é a origem desse dinheiro?

A versão (do Valério e do PT) é de que a origem estaria nos recursos que o Banco Rural emprestou. Para desmontar isso, nós elencamos uma dezena de argumentos. E depois surgiu o superintendente do Banco Rural Carlos Godinho, que foi ouvido pela CPI. Ele confirmou que eram empréstimos para não serem cobrados. Mas que empréstimo é esse? Você dá 50 milhões para alguém que não dá garantia e nem paga? Os outros empréstimos do Marcos Valério foram todos pagos, nas épocas certas, só esses não. Não estavam nem contabilizados. Depois eles fizeram isso, mas embaralharam os documentos. E fizeram constar referências legais que nem existiam na época. A certa altura, eles citam artigos do novo Código Civil, que nem estava em vigor na época.

E qual era a contrapartida para o Rural?

A Kátia Rebello, que era presidente do banco, disse que Marcos Valério era um facilitador para as coisas que ela queria no governo. É claro que ela não revelou em quais operações ele atuou como facilitador. A gente supõe que ele serviu de intermediário. Mas ela não é boba de revelar em quais negócios.

O publicitário Marcos Valério contou tudo que sabe? Se não contou, por quê?

Não contou tudo. Se ele se julga credor de R$ 100 milhões, evidentemente ele não pode abrir todo jogo. Ele quer que as coisas se acomodem, senão vai quebrar.

Pela denúncia do deputado Roberto Jefferson, vários deputados receberiam os recursos. Mas na lista de sacadores, apareceram apenas lideranças. Na visão da CPI, esses líderes repassavam os recursos para sua bancada?

A visão é essa. Eles, de certo modo, serviram de guarda-chuva para proteger o grupo.

Qual era a participação do deputado José Dirceu? Ele era o mentor do esquema?

Não sei se o mentor. Mas era alguém muito importante nas negociações. O Jefferson falou da participação dele, o Palmieri (Emerson, tesoureiro do PTB) falou, a esposa do Valério (Renilda). O Valério esteve várias vezes no Palácio do Planalto com o Zé Dirceu, levando gente do BMG, do Rural, do Banco do Espírito Santo.

E o que a gente pode esperar da CPI daqui para a frente?

A idéia é em final de fevereiro terminar tudo, menos a parte dos fundos de pensão, porque as quebras de sigilo nessa área estão começando agora. O levantamento dos fundos deve terminar em abril.

Investigando o mensalão, o senhor não vê uns olhares meio estranhos dos colegas, nos corredores da Câmara?

Vejo. Mas fazer o quê?

O que o senhor planeja para 2006 em termos eleitorais?

A reeleição para deputado federal.

Alguma disposição para disputar cargo executivo?

É difícil. Temos figuras exponenciais no estado.

E o Senado?

Meu candidato é o (Orlando) Pessuti. Se ele sair novamente de vice do Requião, posso até pensar.