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Michels: “Uma sociedade policialesca não é a que se deseja” | Marcelo Elias/Gazeta do Povo
Michels: “Uma sociedade policialesca não é a que se deseja”| Foto: Marcelo Elias/Gazeta do Povo

Conferência reúne propostas

Representantes de organizações não governamentais, sindicatos e entidades de representação da sociedade civil, além de policiais e demais operadores da segurança pública no Paraná, definirão hoje as propostas para a formulação de uma política nacional para o setor. Eles estão reunidos desde ontem na 1ª Conferência Estadual de Segurança Pública, no Centro de Convenções de Curitiba, no centro da cidade. A iniciativa é do Ministério da Justiça, que está promovendo conferências em todos os estados brasileiros. As propostas de todo o país serão debatidas na Conferência Nacional, que será realizada entre os dias 27 e 30 de agosto, em Brasília.

Entre março e maio foram realizados encontros municipais. Eles pautaram as conferências estaduais, que começaram no mês passado. Ao fim da conferência estadual serão eleitos 40 representantes da sociedade civil paranaense e 29 trabalhadores da área, que participarão da conferência nacional.

O sistema prisional brasileiro não cumpre sua missão de recuperar os detentos. A opinião é do diretor do Departamento Penitenciário Nacional, do Ministério da Justiça, Airton Michels, que esteve ontem em Curitiba participando da 1ª Conferência Estadual de Segurança Pública. Nesta entrevista, ele fala sobre os altos índices de criminalidade registrados no país e o objetivo da Conferência Nacional de Segurança Pública, que será realizada no fim de agosto, em Brasília.

Como surgiu a ideia da Conferência Nacional de Segurança Pública?

O Ministério da Justiça provocou essa situação porque o Brasil tem se desenvolvido, mas tem um gargalo em que nós não achamos ainda um norte, que é a questão da segurança pública. Os especialistas que trabalham nessa área sempre dizem que a causa é social. Sem dúvida uma das razões é essa, mas nós temos tido um desenvolvimento na área social, entretanto na segurança pública nós não temos obtido resultados. Na década de 80 tínhamos um índice de três homicídios por 100 mil habitantes, hoje estamos com um índice de 26. Já tivemos 28. É uma diminuição muito tênue se comparada com o restante. Os especialistas têm fornecido conhecimento, mas o problema não tem sido resolvido. Todas as pesquisas realizadas nos últimos tempos com a opinião pública indicam que uma das maiores preocupações, quando não a maior preocupação da sociedade, é a segurança pública. Então, é hora de ouvir a sociedade.

O sistema penitenciário tem cumprido seu papel de preparar o cidadão para voltar à sociedade?

Evidentemente não. O sistema penitenciário não cumpre nem esse papel, nem o mais elementar. E eu falo como gestor do sistema prisional brasileiro, dentro da competência limitada que tem o Departamento Penitenciário, porque a competência constitucional é dos estados. Em 1997 o Brasil tinha 148 mil presos, hoje nós temos 455 mil. É um aumento de 200%, nenhuma demanda de serviço público atingiu tal grau de necessidade. Nós ainda não estamos nem na fase inicial do sistema prisional, que é permitir que as pessoas condenadas cumpram suas penas com dignidade. Temos muitos presídios cuja lotação é o quádruplo ou o quíntuplo de sua capacidade. Em um presídio onde há 400 pessoas e cabem 40 ou 50, o sistema prisional não está cumprindo a sua finalidade. Ele está ainda na pré-história da suas necessidades.

A sensação de insegurança tem levado a medidas restritivas, como o toque de recolher para adolescentes. A possibilidade de um estado policialesco preocupa o governo?

Aí nós temos um paradoxo: temos de diminuir a criminalidade para que essas medidas policialescas não sejam atrativas. Se essas providências, em um primeiro momento, reduzirem a criminalidade, talvez esse seja um caminho importante. Mas uma sociedade policialesca não é a que se deseja. Como nós atingimos altos índices de criminalidade, algumas vezes estamos buscando soluções que não sabemos se de fato vão contribuir para uma sociedade melhor. Talvez seja uma sociedade com menores índices de criminalidade, mas não sei se será uma sociedade melhor. Já temos indícios de alguns dos problemas causados pela falta de segurança. O nosso desenvolvimento urbano, as relações sociais das cidades estão muito limitadas. Hoje as pessoas quase não andam mais à noite nas grandes e médias cidades. Hoje as pessoas vão para o shopping. É um regresso feudal. Temos também os condomínios horizontais, são grupos se fechando. Não é o melhor tipo de sociedade para a convivência das pessoas.

Como o poder público pode trabalhar para reduzir índices e afastar essas medidas?

Temos de diminuir os índices de criminalidade, e drasticamente. Nossos índices são dos piores do mundo. O Brasil, com seus índices de homicídio, está entre o quinto ou o sexto país com o maior índice de violência urbana do mundo. Um exemplo do que os governos podem fazer é essa conferência, na qual vamos buscar o conhecimento da sociedade, que é a usuária dos serviços. Os governos têm consultado geralmente os fornecedores desse serviço, as polícias, o Poder Judiciário, o Ministério Público, e nunca buscaram o usuário.

Qual o seu balanço das unidades prisionais do governo federal?

Temos Catanduvas (PR), Campo Grande (MS), já estão inauguradas em Mossoró (RN) e Porto Velho (RO) e vamos inaugurar a quinta em Brasília. Com as cadeias federais os presos mais perniciosos foram afastados de suas ações, que por exemplo geravam rebeliões sangrentas. Há mais de dois anos não temos mais notícias dessas rebeliões. Esse foi o primeiro objetivo atendido pelas cadeias federais. Estamos trabalhando no aperfeiçoamento.

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