Apesar das conquistas, os moradores do Santa Marta ainda convivem com uma realidade muito aquém do ideal social. A água é clandestina e não é tratada. O serviço de coleta de lixo chega só até as estações do Plano Inclinado no miolo da favela não existem lixeiras, nem limpeza pública. O esgoto escorre em valas negras, por baixo ou ao lado de moradias pequenas e precárias. São centenas de construções dispostas sem qualquer planejamento, que formam um labirinto com corredores estreitos e becos com muita sujeira e pouca iluminação. Com os termômetros batendo os 38 graus, o odor que exala das valas se mistura à maresia, e são poucos os que permanecem no interior das casas.
"A nossa vida melhorou um pouquinho. Mais pessoas sobem o morro pra visitar e conhecer. Mas nunca me incomodei com o tráfico.Eu só tinha medo do confronto com a polícia", afirmou a comerciante Laudenira Alves, 40 anos, que há cerca de um ano abriu uma loja de roupas no morro.
Essa condição de imparcialidade da população do morro em relação à guerra territorial entre polícia e tráfico é comum nas favelas cariocas. Deve-se à experiência de vida dos moradores, que temem o retorno dos traficantes. "Cachorro mordido de cobra tem medo até de linguiça", disse o aposentado Salvador Pinto de Souza, 70 anos, morador há 56 anos na comunidade. "Desde que moro aqui nunca tive problema, seja com polícia, com bandido, com ninguém. Cada um no seu quadrado."
Apesar disso, ele reconhece as transformações na comunidade. "Desde o momento que tem um policial que respeita a comunidade, que não sai por aí dando tiro a tôa, pra mim melhorou. Porque não tinha hora. Sabe aquela história de mirar na porca e acertar no leitão? Acontecia muito aqui."
"Pra mim, mudou muita coisa. Eu tinha medo de tiroteio, troca de tiros. A gente tinha medo de sair, principalmente, com as crianças", disse a aposentada Severina Macedo Rodrigues, 69 anos, que mora há 40 anos na comunidade. "Com a UPP vieram vários serviços públicos. Então, mudou muita coisa. Todos os dias chegam turistas, gente que antes tinha medo de entrar e agora vem tranquilo", completou Severina.
O turismo é considerável no Santa Marta, o crème de la crème das favelas cariocas. Todos os dias turistas de todo o mundo vão à comunidade conhecer o espaço onde Michael Jackson gravou o clipe "They dont care about us". Além de uma vista privilegiada, o espaço tem estátua em bronze do artista plástico Estevan Biandani e mosaico do artista Romero Britto.
Foi na comunidade do Santa Marta também que o programa Caldeirão do Huck construiu uma nova casa para a cabeleireira Raimunda Maria dos Santos da Silva, 32 anos. Nascida do morro e mãe de três filhos, Raimunda participou, em dezembro de 2009, do programa Lar Doce Lar. Em 26 dias construíram uma nova casa para Raimunda.
"Melhoria [com a UPP] teve porque vieram muitos projetos pra cá. A comunidade ficou mais evoluída, mais reconhecida. Hoje tem muita visitação, muitos projetos nas áreas de educação, saúde, esporte. Tem muita coisa hoje dentro da comunidade que a gente não tinha e agora podemos desfrutar e nossos filhos também", disse a cabeleireira.



