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Risco de condenação de até 17 anos

STF agenda julgamento de mãe presa por pichar estátua da Justiça com batom no 8/1

Débora Rodrigues dos Santos é mãe de duas crianças e está presa desde 17 de março de 2023, por ordem do ministro Alexandre de Moraes
Débora Rodrigues dos Santos é mãe de duas crianças e está presa desde 17 de março de 2023, por ordem do ministro Alexandre de Moraes (Foto: Arquivo Pessoal/Cláudia Silva Rodrigues)

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Depois de dois anos de prisão, a cabeleireira acusada de escrever com batom a frase “Perdeu Mané” na estátua “A Justiça” será julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Débora Rodrigues dos Santos é mãe de duas crianças e está presa desde 17 de março de 2023, por ordem do ministro Alexandre de Moraes. O julgamento foi marcado para 21 a 28 de março, de forma virtual.

No entanto, a defesa da cabeleireira solicitou ao STF nesta quarta-feira (12) que a ré seja julgada presencialmente, e aguarda análise do pedido. De acordo com os advogados Hélio Garcia Ortiz Junior e Taniele Telles, a mudança é necessária para “o pleno exercício da ampla defesa e do contraditório”, pois permitirá sustentação oral em tempo real, enquanto, no plenário online, os advogados apenas enviam um vídeo.

Na petição, a defesa destaca ainda que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) já solicitou ao STF que os julgamentos do 8/1 sejam retirados do plenário virtual. O ofício citado foi encaminhado pela OAB à Corte em setembro de 2023, apontando a importância da sustentação oral na defesa dos réus.

“Diante da relevância e excepcionalidade das ações penais ora em análise por essa Corte, o julgamento presencial reveste-se de um valor inestimável”, afirmou a OAB no documento. Portanto, “a prestigiada tradição do STF em promover julgamentos presenciais, nos quais é possível o debate e a interação direta entre os Ministros e advogados, contribui para a transparência, a justiça e a eficácia das decisões”, continuou.

No pedido, a Ordem citava também ser favorável à realização de plenários virtuais, desde que tenham o consentimento das partes envolvidas no processo. Por isso, os advogados de defesa da cabeleireira entraram em contato com a entidade para solicitar manifestação da Ordem nesse caso e em situações similares.

"A prerrogativa de fazer uso da palavra, sustentar oralmente e estabelecer contato direto entre a advocacia e a magistratura é essencial para a prestação jurisdicional, especialmente nos casos de instância única como este", afirmam os advogados no documento, em referência ao fato de os julgamentos do 8/1 ocorrerem diretamente no STF, que não permite reavaliação das decisões.

Em 2024, a OAB também defendeu que casos do 8 de janeiro fossem para a justiça comum, com chance de julgamento em primeira e segunda instância, como prevê a lei.

A Gazeta do Povo entrou em contato com a Ordem dos Advogados do Brasil questionando se a entidade se manifestará a respeito, e o espaço segue aberto para resposta. A reportagem também tentou contato com o STF, e aguarda retorno.

Débora passou mais de um ano sem denúncia e defesa aponta “acusações genéricas”

Moradora de Paulínia, em São Paulo, Débora foi presa em 17 de março de 2023, alvo da oitava fase da Operação Lesa Pátria, deflagrada pela Polícia Federal (PF). Ela passou mais de 400 dias na prisão sem denúncia — quase 12 vezes mais que o prazo estabelecido em lei —, e seus advogados garantem que as acusações contra ela são “genéricas”.

Segundo a defesa, a única infração cometida pela mulher foi escrever, com batom, a frase “Perdeu Mané” na estátua “A Justiça” localizada em frente ao STF. A pichação foi removida com sabão neutro após os atos do 8/1, mas Débora foi acusada de associação criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, deterioração de patrimônio tombado, e dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União. A expectativa é que receba pena de até 17 anos pela acusação desproporcional.

Em junho de 2024, o jurista Rodrigo Chemim, doutor em Direito de Estado, afirmou à Gazeta do Povo que indivíduos que picham, grafitam ou sujam algum monumento costumam ser punidos com pagamento de cestas básicas, pois se trata de “crime de menor potencial ofensivo”.

No entanto, a Justiça estaria jogando “um caminhão de crimes em cima da mulher sem seguir técnicas jurídicas que qualquer aluno de 3º ano de Direito aprende”, apontou o professor de Processo Penal, ao explicar, por exemplo, que qualquer pessoa que tentasse dar um golpe em um Estado Democrático de Direito estaria, ao mesmo tempo, tentando abolir esse Estado Democrático de Direito.

“Seriam crimes simultâneos, contados como um único crime, e não dois, devido ao princípio da subsidiariedade em que o crime mais grave absolve o menos grave”, esclareceu.

Lei estabelece que mães de crianças podem aguardar sentença em casa

Além disso, Chemim informou na reportagem de 2024 que Débora poderia aguardar sentença em casa, com seus filhos, pois o artigo 318 do Código de Processo Penal estabelece que o juiz pode substituir a prisão preventiva por domiciliar para mulheres com filho de até 12 anos de idade. “Inclusive, em 2018, o STF concedeu Habeas Corpus coletivo [143641/SP] para favorecer todas as mulheres presas que se encontravam nessa situação”, recordou o jurista.

No documento citado, a Segunda Turma do STF aceitou por unanimidade prisão domiciliar para todas as presas grávidas, com bebês ou com filhos de até 12 anos “nos termos do Art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)”. A exceção seria para casos de “violência ou grave ameaça, contra seus descendentes” ou em situações “excepcionalíssimas devidamente fundamentadas pelos juízes".

A paulista completa 2 anos de prisão no dia 17 de março

Débora, no entanto, completará dois anos de prisão na próxima segunda-feira (17), e seus filhos, que hoje estão com 7 e 10 anos, crescem sem a presença da mãe. A mulher chegou a escrever uma carta de próprio punho pedindo desculpas ao ministro Alexandre de Moraes, mas, de acordo com a defesa, as solicitações de soltura encaminhadas após a carta também foram negadas.

“Ele indeferiu com o fundamento de que a concessão da liberdade gera grave risco à ordem pública, mesmo a Debora sendo ré primária, tendo ocupação lícita, domicílio fixo e dois filhos menores de 12 anos”, disse a advogada Taniéli Telles.

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