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O fato de as menores serem prostitutas havia sido utilizado pelo tribunal para negar o abuso sexual | Albari Rosa/ Gazeta do Povo
O fato de as menores serem prostitutas havia sido utilizado pelo tribunal para negar o abuso sexual| Foto: Albari Rosa/ Gazeta do Povo

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) suspendeu a própria decisão que relativizava a presunção de estupro no caso de sexo com menores de 14 anos. O novo posicionamento, anunciado nesta quinta-feira, faz parte do julgamento de um homem que teria praticado sexo com três meninas de 12 anos e não obriga os demais tribunais a seguirem o mesmo entendimento. Em março, o STJ havia defendido, no mesmo caso, que a prática de sexo com crianças e adolescentes nem sempre seria considerada crime.

Várias instituições de proteção da infância, da mulher e dos direitos humanos comemoraram a nova decisão. De acordo com o promotor e vice-presidente da Comissão Especial da Criança e do Adolescente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ariel de Castro Alves, o posicionamento anterior do STJ – o segundo maior tribunal do país e que baliza decisões de vários outros tribunais e varas de justiça – abria um grave e perigoso precedente ao dar carta branca à livre exploração e abuso sexual de crianças e adolescentes.

"Aquele era um posicionamento muito perigoso e ia contra a todo o trabalho de conscientização que vem se desenvolvendo no Brasil, um país ainda bastante atrasado em relação ao que se considera crime sexual, em especial no Norte e Nordeste, onde o sexo com crianças e adolescente é tratado como componente cultural", observa Alves, lembrando que conforme prevê o Código Penal e a Lei do Estupro (12.015/09), sendo a violência praticada ou apenas ameaçada, qualquer relação sexual com menores de 14 anos é tida como estupro.

A ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário, também elogiou a postura da 3ª Seção do STJ e destacou que, embora a decisão tenha sido tomada a partir de critérios técnicos (relativos a prazos processuais perdidos pela defesa do acusado), ela contribui para que não se forme uma jurisprudência no país que fragilize os direitos das crianças. Ela espera ainda que prevaleça nos tribunais brasileiros a consciência de que a vítima dos abusos sexuais não é responsável por esses atos.

Polêmica

Na época, a posição do STJ ao tratar do caso e justificar que as meninas com quem o acusado havia praticado relações sexuais eram prostitutas, gerou uma repercussão negativa também internacionalmente. Na Europa, nos Estados Unidos e no Japão, por exemplo, as leis para punir quem comete este tipo de crime, elencado entre os mais graves, são extremamente severas, aponta o antropólogo e consultor da Unicef, braço da Organização das Nações Unidas para a Proteção da Infância, Benedito dos Santos. "Isso tem um importante efeito de inibição."

Para a relatora do caso, ministra Maria Thereza de Assis Moura, apesar de buscar a proteção do ente mais desfavorecido, o magistrado não pode ignorar a realidade. "O direito não é estático, tem de se amoldar às mudanças sociais", afirmou na decisão. O processo corre em segredo de Justiça.

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