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O suicídio sempre esteve presente na história da humanidade. Recentemente, o caso mais conhecido do mundo ocidental passou por um revisionismo histórico após a revelação do evangelho segundo Judas Iscariotes, revendo seu papel de traidor e o flagelo na forca conforme Mateus (27,5). Desde Judas, que não teria se matado e sim se exilado num deserto, o ato de tirar a própria vida carrega um estigma que vai além das fronteiras da fé cristã. Costumou-se julgar – e julgar mal – aquele que se mata. A abordagem bíblica do suicídio será um dos temas em debate no próximo sábado no Instituto Ciência e Fé, em Curitiba.

O reverendo Jean Carlos Selleti, um dos palestrantes, lança um olhar menos acusativo sobre aqueles que tiram a própria vida. "Não podemos julgar, só Deus poderá fazer seu juízo", diz. O imaginário coletivo interpreta o suicídio como algo ruim, mas Ele quer ensinar algo aos que ficam, explica. Na interpretação de Selleti, mestre em Teologia, não é porque o sujeito se matou que Deus lhe dará um tratamento diferenciado, pior que aos demais. É tudo especulação, garante o reverendo, que dá um conselho aos críticos dos suicidas: "Seria mais sábio de nossa parte não tentar compreender a mente de Deus nesses casos".

Para o reverendo, há mais razões para viver do que o contrário. Esse é o vértice do ciclo de debates que o Instituto Ciência e Fé promove com o tema Vida: Razões e Desrazões. O Suicídio. Do ponto de vista da bioética o suicídio é aceito, diferentemente das recomendações bíblicas. Uma vez dotado de livre arbítrio, o homem faz o que bem quiser de sua vida. Mas com ressalvas, adverte Selleti. "Ele deve estar ciente de que estará se desfazendo de um dom de Deus". Ainda assim, essa tem sido a escolha de um número cada vez maior de pessoas.

Os suicidas fazem parte de uma estatística que numa proporção inversa cresce junto com a evolução populacional. Os dados oficiais são precários e podem conter erros de registros, mas segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) nas últimas quatro décadas as taxas de suicídio aumentaram 60% em todo o mundo, chegando às atuais 14,5 ocorrências por ano para cada grupo de 100 mil pessoas. Tomando por base a média ponderada da OMS, cerca de 200 pessoas estariam se matando a cada ano em Curitiba.

O Corpo de Bombeiros da capital parou de usar a nomenclatura suicídio nas ocorrências que atende, deixando o laudo para a polícia técnica. Em 2004, quando ainda fazia essa descrição, atendeu 43 ocorrências do gênero. Conseguiu evitar 19 mortes. O número de salvamentos é bem menor do que aquelas ocorrências em que os bombeiros, treinados para lidar com essas circunstâncias, não ficam sabendo a tempo de evitar a morte.

Conforme a OMS, o suicídio é a terceira causa de morte entre pessoas de 15 a 44 anos, em ambos os sexos. As tentativas são 20 vezes mais freqüentes. Por isso, em 1996 a OMS definiu o suicídio como problema de saúde pública, em geral associado a transtornos psiquiátricos ou abuso de drogas. Desde sempre, as causas mais comuns são o desgosto pela vida, a depressão, o insucesso amoroso ou financeiro. Doenças como câncer, aids, úlcera, traumatismo craniano, insuficiência renal e lesão da medula espinhal contribuem para levar uma pessoa a tirar a própria vida.

Para especialistas, a compreensão cultural do suicídio dificulta vê-lo como manifestação de alguma doença psiquiátrica. Prevalece ainda o sentimento rancoroso e a opinião de que o suicida se mata porque quer. Estudos clínicos com pacientes psiquiátricos nos Estados Unidos sugerem que o risco do comportamento suicida aumenta pelo histórico familiar. Entre os depressivos, uns 5% revelam história de suicídio em familiares de primeiro grau e algo entre 30% a 50% daqueles com depressão que têm história familiar positiva tentam, eles próprios, o suicídio.

Enquanto o suicídio permanece freqüentemente escondido, em segredo ou por ser interpretado como vergonhoso pelos familiares, as atitudes em relação a ele têm mudado. Passou a ser percebido como manifestação de forte estresse emocional e, mais freqüentemente, associado com uma forma tratável de depressão, transtorno bipolar ou outro transtorno mental grave, combinado com o abuso de drogas ou álcool. O mau diagnóstico e tratamento inadequado podem contribuir para a elevação do risco.

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