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Jeferson é nome fictício escolhido por ele mesmo. Sua história é verdadeira, porém triste. Abandonado pela mãe aos 8 meses de vida, começou a "dar trabalho" aos 5 anos. Aos 10 foi iniciado no crack pelo pai. Aos 11 passou a assaltar e arrombar carros. Só reviu a mãe aos 12, num caixão, atropelada por um ônibus. Na época, já era "vapor" do tráfico, vendendo pedras nas praças Tiradentes, Carlos Gomes, Santos Andrade. Não sabe ler nem escrever, a experiência escolar acabou logo na primeira série. Hoje, aos 15, está na 15.ª passagem pelo Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente Infrator (Ciaadi) de Curitiba.

A vida de Jeferson cabe num parágrafo, igual a dos 1.965 jovens que, por algum deslize, caíram pela primeira vez nas mãos da polícia no ano passado. Outros 375 eram reincidentes. De forma direta ou indireta (como "vapor" ou usuário), o tráfico responde pelo desvio de conduta de pelo menos 90% deles. Os números de novatos e "veteranos" repetem os de 2004. Ou seja, a cada ano mais de 1.700 jovens são fichados em Curitiba na Delegacia do Adolescente Infrator por envolvimento com o narcotráfico. Muitos já pagaram a "pena" e ganharam as ruas outra vez. Mas a sorte não acompanhou a todos. Para alguns, a liberdade virou sentença de morte.

Só nos últimos sete meses, 37 dos 113 jovens assassinados em Curitiba haviam passado pelo Ciaadi e cumprido medidas socioeducativas do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Jeferson é um dos egressos sobreviventes. O traficante não costuma perdoar os "vacilões". A morte é a pena capital para o devedor, o alcagüete, o concorrente ou aquele que representa algum risco para o seu establishment. Quem cai muitas vezes é um dedo-duro em potencial. A punição é particularmente exemplar, sem economia de balas e escrúpulos. Execuções com mais de dez tiros são comuns. Tanta violência fica no inconsciente desses adolescentes.

O ingresso de novatos no Ciaadi em 2005 foi igual ao de 2004, mas há mudanças. Antes, eles eram pegos nas ruas com facas ou estiletes, agora chegam com revólveres e até armas mais pesadas, diz o diretor do Serviço de Atendimento Social (SAS), o sociólogo Francesco Serale. "Estão cada vez mais violentos", constata. As psicólogas do núcleo de apoio da Vara de Adolescentes Infratores observam, ainda, mudanças na idade e na classe social. Eles estão cometendo infrações cada vez mais cedo, com um crescimento de casos entre jovens da classe média. O tráfico de drogas, aponta Serale, é o maior responsável.

Uma vez dentro, duplicam-se os riscos. A constatação está não só nas estatísticas do CIAADI, mas também na voz de quem acompanha todos os dias o drama desses meninos e meninas. "Se sai ou se descumpre as regras, morre", diz o sociólogo. Não chega a 5% o número de adolescentes sem família, morando na rua ou em instituições. Os demais têm algum tipo de relação familiar com o pai, com a mãe, irmãos ou algum parente. Muitos se sujeitam às regras rígidas do tráfico para ganhar o próprio dinheiro, ou simplesmente para fugir do inferno doméstico, retratado por um pai violento ou uma mãe negligente.

"O traficante acaba fazendo o papel de pai, de provedor da favela", diz a diretora-presidente do Instituto de Ação Social do Paraná (Iasp), Thelma Alvez de Oliveira. Ele é o patrão, está no topo da hierarquia do tráfico e se mantém ali pela força. Assim funciona o organograma desse negócio de três personagens e raras mudanças. O "vapor" é o soldadinho raso, está na base da pirâmide, encarregado da venda ao consumidor final, seguido pelo distribuidor, que faz a ponte com o patrão, dono da boca e responsável pela compra da droga direto dos produtores ou cartéis internacionais. Os lucros do negócio são maiores para quem está à frente, e subir nessa hierarquia só mesmo matando quem está acima. Essa ambição contribui para aumentar a sangria no tráfico de drogas.

Clique no link para ler e ouvir a entrevista completa com Jeferson.

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