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O Tribunal Superior do Trabalho (TST) deve tomar até o próximo mês uma decisão sobre processo aberto pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) contra a Souza Cruz, em favor dos provadores de cigarros da empresa. O MPT quer que a companhia pague uma multa e seja obrigada a custear por 30 anos o tratamento médico de todos os funcionários que foram usados nos últimos anos como provadores. Além disso, no ponto mais polêmico da ação, o Ministério Público pede que a companhia acabe com esse tipo de atividade dentro da empresa. De um lado, o MPT alega que é preciso defender a saúde dos trabalhadores. Do outro, a Souza Cruz diz que o Judiciário não pode proibir uma atividade lícita alegando que ela é perigosa.

"É um produto com uma nocividade muito alta e irreversível, que gera muitas vezes mortes prematuras de trabalhadores e aposentadorias precoces. Então a nossa preocupação é pensando no bem maior dos trabalhadores, que é a saúde", argumentou a procuradora do Trabalho Adriane Reis.

"Pode o Poder Judiciário proibir que eu, como empregado, faça, realize uma atividade de alto risco, que não é nem o caso do tabagismo? Pode o Judiciário proibir essa atividade, porque ela é de risco? Essa é a tese jurídica. Obviamente não pode. Se é um produto lícito, uma atividade lícita, insere na autonomia individual (do empregado) e o Judiciário não pode proibir", rebateu o advogado da Souza Cruz, Victor Russomano.

O julgamento foi interrompido na última quarta-feira (3), após pedido de vista do presidente do TST, ministro João Dalazen. Ele alegou que o tema é de alta relevância e merece uma reflexão maior, mas garantiu que o recurso será julgado até novembro. Depois de julgado pelo TST, o caso pode chegar ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Até o momento, três ministros do TST foram favoráveis ao MPT e um deu razão à Souza Cruz. Outro ministro, Vieira de Mello Filho, tentou o meio termo. Em seu voto, ele sugeriu que os provadores trabalhem por seis meses, com uma semana de intervalo a cada três semanas. Ao fim dos seis meses, eles ficariam afastados por outros três, quando teriam a opção de retornar ou não à atividade.

A ação civil pública foi proposta em 2003 pelo MPT da 1ª Região (Rio de Janeiro) a partir de ação individual movida por Marcos Ribeiro da Costa, um ex-empregado da Souza Cruz que trabalhou no "painel de avaliação sensorial" da empresa entre 1979 e 1989. A 15ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro acatou os três pedidos da ação, condenando a empresa a deixar de contratar provadores, a prestar assistência médica por 30 anos e a pagar indenização. O Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região manteve a decisão.

A Souza Cruz recorreu ao TST e obteve a suspensão da condenação até a decisão final. A Sétima Turma do tribunal manteve a proibição da atividade, mas liberou a empresa de pagar uma indenização de R$ 1 milhão ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Por fim, tanto a Souza Cruz quanto o MPT recorreram à Seção de Dissídios Individuais do TST: a empresa pedindo que a atividade não seja proibida, e o Ministério Público querendo a volta da multa.

O fato de a Souza Cruz não ter recorrido da decisão de obrigá-la a custear o tratamento é outro ponto de divergência com o MPT. Para Adriane Reis, isso significa que a empresa está obrigada a pagar as despesas médicas desde já. Mas o advogado da companhia, Victor Russomano, discorda.

"Se por acaso prevalecer a tese de que a atividade é lícita, todos os elementos (da ação) estão compreendidos. Significa improcedência total da ação civil pública".

Ex-provador diz que empresa alegava que não fazia mal

O autor da denúncia que levou o MPT ajuizar a ação, Marcos Ribeiro da Costa, começou a trabalhar na empresa em 1976 aos 15 anos. Quando completou 18, ele diz que foi convidado para ser provador, mas não tinha ideia dos riscos. Eram dez provadores numa única sala. Ao todo, eles fumavam 420 cigarros em duas horas, sendo ao mesmo tempo "provadores ativos e passivos". Marcos reclama que, devido aos dez anos que passou como provador de cigarros, desenvolveu sequelas pulmonares, dentárias, estomacais, renais e mentais. Hoje ele está aposentado por invalidez.

"Eu entrei lá muito novo. E aquela época era um outra época. Inclusive nem fumava. Eu era atleta, jogava pela Souza Cruz, era da associação atlética (da Souza Cruz). Eu até estranhei, falei: eu não fumo. Eles disseram: mas isso não faz mal não, não tem problema nenhum", diz Marcos Ribeiro, hoje com 52 anos.

Segundo o ex-provador, ao apresentar os primeiros problemas de saúde, ele ia aos médicos da empresa. Somente em 1989, ao crescer dentro da firma, ele pôde ir a um médico particular renomado, que o alertou para a gravidade de sua situação. Os problemas de saúde o obrigaram a se licenciar. Depois de algum tempo fora do trabalho, ele voltou para a empresa em 1998. No dia seguinte, afirma Marcos, foi despedido e recebeu uma ajuda para o tratamento, mas "tão insignificante que não durou meses".

O advogado da Souza Cruz rebate e nega que os problemas de saúde de Marcos tenha relação com o cigarro. Segundo ele, a versão do ex-funcionário é fantasiosa. Acrescentou que, como provador, Marcos Ribeiro sequer tragava.

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