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Com a chegada de Haydée, as consultas agora são diárias | André Luís Rodrigues/Gazeta do Povo
Com a chegada de Haydée, as consultas agora são diárias| Foto: André Luís Rodrigues/Gazeta do Povo

Recepção

Atenciosa, médica cubana cai nas graças da população

Morando perto da unidade de saúde, a médica Haydée Rodriguez caminha todos os dias até o trabalho. Sem muita opção de lazer, passa as horas vagas estudando e vendo tevê. A comunicação com a família é feita pela internet ou com o telefone emprestado pela dona do hotel onde mora. A simpatia do povo, conta ela, foi importante para a adaptação ao local. "As pessoas são legais, acolhedoras."

A língua também não tem sido barreira, já que o português de Haydée é bastante claro. "Às vezes, eu é que não entendo. Então, peço para falarem mais devagar." O jeito simples e atencioso da médica conquistou a população. "Ela conversa bastante, procura saber o que a gente tem. Vou fazer os exames de sangue e voltar", conta o operador de caldeira Josué Sousa Prestes, 44 anos, que se consultou com a cubana pela primeira vez por causa de fortes dores de cabeça.

Boa impressão

Com exames nas mãos, feitos após uma internação devido a pedras na vesícula, Tatiele Dias Ribeiro, 17 anos, foi recebida no consultório – uma sala pequena, com mesa, cadeira e maca – com um sorriso e a pergunta: "O que acontece?". Após ser sabatinada e ter todas as informações dos exames cuidadosamente anotadas no prontuário, a jovem foi examinada por Haydée. Só depois, recebeu o encaminhamento a um especialista em Curitiba e uma receita com analgésicos. Todo o trabalho é feito à mão, com letra caprichada e auxílio de papel carbono.

"Ela é detalhista, pergunta tudo, anota. Um prontuário detalhado é ótimo. Nos atendimentos domiciliares, ela põe a mão na massa, pede para deixá-la com o paciente, quer medir a pressão ela mesma. É ela e o paciente", conta a enfermeira Maria Elisabete Israel. "O povo daqui é humilde, gente sofrida. Tudo o que é bom, eles acolhem."

Faltam cinco minutos para as 13 horas de uma quinta-feira quando uma senhora chega à Unidade de Amparo à Saúde da Família, em Tunas do Paraná (a 70 quilômetros de Curitiba), perguntando se ainda há vaga para consultar com o médico. Recebe a senha número seis e senta-se junto a um pequeno grupo de pessoas que aguardam atendimento.

Em seguida, entra uma mulher simpática e de roupas simples, desejando "boa tarde" em um português com leve sotaque estrangeiro. É a médica Haydée Benitez Rodriguez, integrante do grupo de cubanos do programa Mais Médicos que está atendendo no Paraná.

A exemplo dos conterrâneos, Haydée foi destacada para passar três anos em uma cidade que não despertou interesse dos brasileiros. Economicamente centrada na produção de madeira e mármore, com uma população de quase 7 mil habitantes, Tunas tem um dos piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do país – em 2010, ocupava a colocação 3.884 entre 5.565 municípios brasileiros.

O difícil acesso, a baixa qualidade de vida e a falta de opções de lazer são alguns dos motivos que tornam o local pouquíssimo atrativo a médicos brasileiros. "Nem mesmo o ex-prefeito, que era médico, morava aqui", comenta o secretário de Administração, Marco Antônio Baldão.

Com a chegada da cubana, o movimento cresceu na unidade de saúde, construída em 2010. Até outubro, os atendimentos com clínico geral só ocorriam nas manhãs de segunda e quinta-feira. Hoje, são diários e nos dois períodos – exceto às quartas ou sextas, quando Haydée tira oito horas para fazer uma especialização virtual sobre o sistema de saúde brasileiro. A rotina envolve uma média de 20 consultas/dia, além de visitas aos cerca de 150 pacientes acamados da cidade.

Experiência

Filha de agricultores da zona rural de Santiago de Cuba, Haydée se formou em Medicina pelo Instituto Superior de Ciências Médicas da cidade natal, em 1992. "Escolhi esse curso porque é bonito ajudar as pessoas que necessitam de atenção e saúde", resume. Com 20 anos de experiência e especialização em saúde da família, ela já atuou na Venezuela. Aos 45 anos, deixou o filho de 14 e o marido, agricultor e soldador, para um novo desafio: ajudar o povo brasileiro. "Todo médico cubano sonha com uma missão internacional", conta.

A maneira de tratar a medicina como missão e não profissão bem paga – Haydee recebe US$ 400 por mês, mais US$ 600 que são depositados para sua família em Cuba – torna os cubanos malvistos por médicos brasileiros. "Eles são tratados como alguém que rouba a demanda, como profissionais explorados", afirma Baldão.

Custo-benefício é compensador, diz secretário

Com um orçamento anual de R$ 13 milhões, a cidade aplica 24,6% na saúde. Os médicos que atuam em Tunas são terceirizados de Curitiba e atendem num só dia várias cidades da região metropolitana. A prefeitura tem um contrato de 720 horas/mês para clínicos gerais, com um valor de R$ 86,6 mil. "Um médico recebe quase R$ 3 mil por dia para passar cerca de três horas aqui. E ainda temos que buscá-lo em Bocaiúva, porque ninguém quer vir de carro próprio", explica o secretário de Administração de Tunas, Marco Antônio Baldão.

Os gastos com a médica cubana são bem mais modestos: R$ 1,8 mil mensais, aplicados em alimentação e moradia no Hotel Straub – estabelecimento que oferece quartos a partir de R$ 50. "É um excelente custo benefício. Ter um médico morando na cidade é fantástico. Estamos confiantes que isso vai nos ajudar a melhorar o IDH."

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