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Frase estampada em barraco resume o sentimento dos moradores da ocupação Primavera | André Rodrigues/Gazeta do Povo
Frase estampada em barraco resume o sentimento dos moradores da ocupação Primavera| Foto: André Rodrigues/Gazeta do Povo

CIC

Primavera começou "no mato" e hoje parece cidade do interior

"Quando moradia é um privilégio, ocupar é um direito". Em letras vermelhas, a frase estampa o primeiro barraco da ocupação Primavera, na CIC, uma das mais recentes favelas de Curitiba. Tomada em outubro do ano passado, às vésperas das eleições municipais, a área demonstra que ocupações irregulares continuam a surgir na capital paranaense.

A Primavera começou com cerca de 30 famílias, vindas de outras vilas do CIC e Uberaba. Hoje, são 380 barracos de madeira, que abrigam cerca de 1,5 mil pessoas. Estas, ainda não entraram nas contas oficiais da Cohab. "Aqui, era só mato. A gente ajeitou tudo para poder morar. Agora, só saímos daqui para a nossa casa definitiva", disse Sérgio Maceno dos Santos, um dos coordenadores da área.

Apesar da precariedade – explicitada pelas ruas barrentas e ligações clandestinas de eletricidade e água (os "gatos") – a ocupação é bem organizada, dividida em sete setores, cada qual com seu coordenador. À tarde, a ocupação ganha tintas de cidade do interior: cães magricelos perambulam pelas vielas, enquanto meninos soltam pipas, sob a batida de um funk.

Gestão

O urbanista Carlos Hardt, coordenador do doutorado em Gestão Urbana da PUCPR, acredita que Curitiba consiga, a médio prazo, realocar as famílias que hoje vivem em ocupações. Para isso, diz, é preciso investimentos para subsidiar imóveis às famílias que vivem na linha da pobreza e que não conseguem se encaixar em programas de financiamento habitacional. "Se houver priorização de investimentos às pessoas de baixíssima renda, me parece possível e viável zerar este déficit", afirma.

  • A Ocupação Primavera é uma das mais novas favelas de Curitiba
  • Em clima tranquilo, moradores tocam a vida na ocupação
  • Garotinho exibe o novo corte de cabelo, na Ocupação Primavera
  • Placa deixa claro que não há vagas na Primavera
  • Morador mostra sua casa, na Ocupação Primavera
  • Avô e neto observam os
  • Uma das coordenadoras da Primavera, Isa Bueno degusta chimarrão à tarde
  • Meninos disputam guerra de pipas na Ocupação Primavera
  • Na Vila Rose, barracos continuam a proliferar às margens do rio
  • Em seu barraco, Íris Cruz conta que o número de habitações não para de crescer na Vila Rose

Um em cada dez curitibanos ainda está longe de viver em condições adequadas de habitação. Pelo menos 170 mil pessoas residem hoje em favelas, loteamentos clandestinos ou assentamentos que aguardam regularização fundiária na capital paranaense, provocando uma demanda de mais de 42 mil casas. Apesar disso, Curitiba vê a chance de minimizar o problema de forma efetiva. A curva de ocupações irregulares começou a cair, após décadas de crescimento contínuo. A Companhia de Habitação Popular (Cohab) se arrisca a estimar que em dez anos o déficit habitacional esteja zerado.

FOTOS: Veja mais imagens da ocupação Primavera

INFOGRÁFICO: Veja as regionais onde estão os 42.395 domicílios

As áreas irregulares proliferam principalmente na periferia. Enquanto mais de 23% dos moradores de bairros da regional CIC (40 mil pessoas, em 10 mil domicílios) e 15,5% da regional Cajuru vivem em ocupações, o índice na regional Matriz é bem menor: 0,4% da população, a maior parte na Vila das Torres.

Um dos levantamentos – realizado pela professora Madianita Nunes da Silva, da Universidade Federal do Paraná (UFPR) – conclui que 74% dos assentamentos da capital são favelas e 26% correspondem a loteamentos clandestinos. Ela também registrou que, ao longo da última década, essas as favelas sofreram um "adensamento populacional", ou seja, mais pessoas passaram a viver um mesmo espaço.

Em algumas ocupações, principalmente em loteamentos mais antigos, os moradores até têm acesso a infraestrutura básica. Na Vila Rose, na CIC, por exemplo, a maioria das ruas é asfaltada, há linhas de ônibus, escolas e postos de saúde. Nas favelas, entretanto, as condições são precárias: ruas de terra, casas sem saneamento, ligações clandestinas, ausência de serviços públicos.

Sob o ponto de vista econômico, as conclusões são óbvias. "Os pobres são empurrados para estas áreas. Nas favelas, uma família chega a viver com menos de um salário mínimo", observa Madianita. Na regional CIC, a renda domiciliar é 44% inferior ao rendimento médio da capital.

Perspectivas

A Cohab, no entanto, traça um prognóstico positivo. Segundo a empresa de economia mista, 13,8 mil domicílios foram realocados de áreas de risco, entre 2005 e 2012: média de quase duas mil famílias por ano. Com isso, pela primeira vez desde que os dados começaram a ser compilados, Curitiba observou a inversão da curva.

A fila deve continuar a diminuir. Até 2016, a companhia tem a meta de reduzir a fila em mais 10 mil moradias. "Eu acredito que em duas gestões, cerca de dez anos, a gente consiga dar conta do déficit habitacional. É preciso aumentar a fiscalização para evitar que fila cresça, senão ficamos ‘enxugando gelo’", diz a assessora técnica da Cohab, Tereza Gomes de Oliveira.

Zerar a fila não sai por menos de R$ 105 mi

A Cohab Curitiba evita estimar quando custaria realocar as famílias que hoje vivem em ocupações na capital paranaense, mas reconhece que a conta é salgada. Só para providenciar a documentação dos 42 mil domicílios que estão em áreas irregulares seriam necessários R$ 105 milhões (R$ 2,5 mil por casa).

Para diretora técnica Tereza Gomes da Silva, é impossível apontar a um valor final, já que a equação incluiria custos em infraestrutura e desapropriações, que acabam diluídos ou que são variáveis. "Depende das características cada área", resume Tereza.

Dados do Plano Diretor de Drenagem, elaborado no ano passado, dão ideia do volume das cifras. Seriam precisos R$ 55 bilhões para realocar 31 mil famílias que vivem em áreas de ocupação localizadas ao longo de bacias hidrográficas – hoje sujeitas a inundações e alagamentos.

A professora de Urbanismo da UFPR, Madianita Nunes da Silva, avalia que a solução da questão passa necessariamente por uma política fundiária que regule o uso e ocupação do solo. Isso forçaria as áreas a cumprirem sua função social e, consequentemente, reduziria o peso da especulação imobiliária.

"Não é só com a construção de novas unidades que vamos enfrentar este problema. Sem essa política que obrigue o cumprimento social da propriedade, será bem difícil solucionar a questão de forma permanente", avalia.

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