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Depois de unificar várias áreas de sua economia, a Europa também resolveu criar parâmetros comuns par seu ensino superior. Desde 1999, o Processo de Bolonha, que envolve reuniões periódicas de todos os países-membros para decidir as diretrizes universitárias, vem transformando aos poucos o ensino na Europa e outras nações que aderiram ao processo. Entre as determinações estão o ensino em três ciclos (licenciatura – correspondente à nossa graduação –, mestrado e doutorado) e, com as estruturas harmonizadas, os estudantes podem circular com mais facilidade pelas universidades, podendo começar o curso em uma escola e terminá-lo em outra. O professor português António Gomes Ferreira, da Universidade de Coimbra, participou recentemente em Curitiba de um seminário sobre o assunto, realizado pela UniBrasil.

Veja os principais trechos da entrevista concedida à Gazeta do Povo.

O que é o Processo de Bolonha?

O processo foi aprovado em 1999, com a participação inicial de 29 países europeus, mas hoje já tem 45 adesões, inclusive de países da Ásia e da África. Seu objetivo é criar uma comunidade de ensino superior que facilite a mobilidade de professores e estudantes e o reconhecimento de diplomas, de forma que as pessoas tenham um leque mais amplo de possibilidades, de buscar um conhecimento que não existe no seu local de origem. Isso consolida conhecimentos e favorece o desenvolvimento tanto dos países europeus quanto das outras nações que aderirem a esse processo. A mobilidade será possível se os sistemas de ensino superior forem configurados nas mesmas bases.

Os currículos serão iguais em todas as escolas?

Não se trata de unificar os currículos – justamente porque um dos objetivos de fomentar a mobilidade é levar o estudante a buscar aquilo que não encontra na instituição de origem. É preciso respeitar as particularidades de cada universidade, mas vamos estruturar os cursos de modo a facilitar a mobilidade. Isso será feito por meio de um sistema unificado de unidades de crédito, que podem ser convertidas de acordo com o plano de estudos de cada instituição. A princípio, está definido que o primeiro ciclo do ensino superior, a graduação, deverá ter pelo menos 180 dessas unidades de crédito, que levam em conta não o número de horas-aula, mas o esforço total realizado pelo aluno. É um critério mais rigoroso e mais transparente. Assim, em qualquer país que faz parte do Processo, quem avalia os créditos de um aluno de outra instituição sabe exatamente o que ele já aprendeu. Até 2007 as faculdades estarão pelo menos com o primeiro ano da graduação dentro desse sistema.

Quantos anos durarão os cursos?

O mais importante não será definir os cursos em termos de anos, mas em unidades de crédito. Estima-se que uma graduação de 180 créditos dure três anos. Teoricamente, o aluno até pode cumprir esta carga em menos tempo, mas, como ela leva em conta o esforço total do estudante dentro e fora da instituição, não é tão fácil adiantar a conclusão do curso – a não ser que ele pare de dormir. Ele não vai poder fazer muito mais do que o previsto para aquele ano. O número de créditos necessários vai variar de acordo com o curso. Em Psicologia, por exemplo, está mais ou menos definido que, para se tornar psicólogo, o aluno precisará de créditos que equivalem a cinco anos, em dois ciclos. Terminando apenas o primeiro ciclo, ele poderá exercer algumas atividades na área, mas ainda não será um psicólogo propriamente dito.

A adesão ao Processo de Bolonha cria que obrigações?

A estrutura criada pelo processo será flexível. Por exemplo, duas universidades diferentes até podem oferecer um mesmo curso com número diferente de créditos. Isso cria uma questão de competitividade. Entre uma faculdade que permite terminar o curso em três anos e outra que faz isso em quatroanos, qual será a preferida? Mas, por outro lado, será que é possível aprender tudo que é necessário naquela faculdade que oferece o curso mais curto? Tudo isso terá de ser levado em consideração pelas faculdades quando elaborarem seus planos de estudo. O Processo de Bolonha ainda prevê que os cursos passem a ser certificados. Essa certificação será feita por entidades nacionais ou transnacionais, externas às universidades. Até 2010 essa certificação deve estar sendo feita. Mas não há nenhuma exigência de que todas as faculdades em um certo país sigam as exigências do Processo de Bolonha. No entanto, duvido que seja bom optar por não segui-las, porque isso significará ficar de fora desse espaço comum de ensino superior. É uma autoexclusão que deixará aquela instituição isolada, sem credibilidade, e no fim os alunos não vão querer estudar lá.

Qual o cenário atual da mobilidade nas universidades da Europa?

O fenômeno da mobilidade dentro da Europa já é considerável. Existem vários programas de intercâmbio entre estudantes de graduação, dos quais o mais famoso é o Erasmus. Além disso, as próprias faculdades criam suas parcerias. Minha universidade, por exemplo, tem programas com o Brasil. Ter uma idéia da dimensão da mobilidade entre professores é um pouco mais difícil.

O Brasil pode se juntar ao Processo de Bolonha?

Não existe nenhuma negociação nesse sentido. De qualquer modo, o cenário brasileiro apresenta duas dificuldades: a dimensão continental do Brasil e o caráter de líder regional que o país possui. Por outro lado, o Brasil é uma nação muito voltada para o exterior e, por isso, vai acabar precisando dialogar para a construção de espaços comuns de ensino superior. Assim, ou o país se associa, ou se estrutura para construir interfaces e poder tirar mais proveito da situação. Certamente dentro do Brasil há instituições muito interessadas em se vincular a um espaço comum de ensino superior das dimensões deste que o Processo de Bolonha está criando.

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