
Com quantas pessoas se faz uma UPS? Desde o dia 1.º do mês passado, quando 515 policiais ocuparam 12 comunidades do bairro Uberaba, em Curitiba, as formas de tentar medir o sucesso dessa operação têm se alternado. Nenhuma delas, porém, foi capaz de apontar se o projeto caminha para o sucesso ou para a morte por inanição. O efetivo do primeiro dia foi cortado à décima parte, e hoje 60 policiais se revezam no patrulhamento da região. Mas os homicídios também caíram. Era um por semana, ao menos até janeiro passado, segundo dados da Polícia Civil. Em março, depois da UPS, foi registrada apenas uma ocorrência com morte.
As múltiplas ações sociais prometidas por governo estadual e prefeitura ainda não apareceram, mas os serviços públicos instalados anteriormente agora podem operar sem controle externo ou represálias. Um mês depois do empurrão inicial, os resultados começam a aparecer sobretudo em áreas fora do poder de mensuração das planilhas e gráficos. A Unidade do Paraná Seguro é uma obra em progresso.
Mudança de hábito
O visitante de fora mal percebe a diferença ao trafegar pelas quadras sempre movimentadas do Uberaba. A vida comunitária apenas ganhou intensidade em um dos poucos lugares de Curitiba em que o pedestre é a força dominante, e onde o fator medo nunca esteve tão em baixa. Pessoas como Anaísa Maria da Conceição, proprietária de uma mercearia na Vila Audi/União, deixaram de prestar atenção em grupinhos parados na esquina. "Antes tinha que fechar assim que começava a escurecer. Agora dá para trabalhar até mais tarde", diz a mulher de 48 anos.
O representante comercial Anadir Ribeiro Barbosa, que havia acabado de chegar para entregar uma remessa de cartões telefônicos, ensaia uma explicação para o alívio na tensão psicológica: "É só pôr a farda na rua que o pessoal mal-intencionado foge. A presença da polícia assusta", avalia ele, que costumava visitar os clientes em dias e horários diferentes para despistar possíveis assaltantes. "Eles parecem cair de paraquedas. Aparecem do nada já com a arma na mão", descreve.
Mais além
O Uberaba é uma amostra clara de que em uma comunidade com múltiplas carências, a satisfação por ter um problema resolvido é rapidamente afogada pelos novos desafios. O catador de papel Servino Fernandes dos Santos, de 68 anos, responde a uma pergunta sobre a presença dos policiais descrevendo a situação da rua de terra em dias de chuva. O mesmo problema já havia sido apontado por Anaísa, que mora algumas quadras acima.
Lindomar Boneti, professor de Sociologia na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), lembra que o Estado somente é capaz de conquistar um espaço a partir da união de forças capazes de promover a cidadania. "A retomada do Uberaba ocorrerá quando o controle policial estiver associado a investimentos sociais. É necessário bastante tempo para que isso seja implantado, mas, pelo que percebo, pouco tem sido feito até agora", analisa.
Aos poucos, as novas demandas dessa comunidade ganharão corpo até se transformar em consenso. A estudante da 7ª série Aline Pertile, de 12 anos, é um exemplo do novo Uberaba que surge. Quase todos os dias, ela tem a responsabilidade de levar os irmãos menores, primos e sobrinho para a escola. Seus gestos e forma de falar simulam os de um adulto. Ela diz estar satisfeita com a presença da polícia, mas clama mais atenção à escola. "Roubaram computador e micro-ondas. Precisa melhorar a segurança lá", sugere.
Novas políticas públicas são uma incógnita
Um mês após o início da Unidade do Paraná Seguro (UPS), governo estadual e prefeitura ainda não divulgaram em detalhes quais serão as políticas públicas a ser desenvolvidas na comunidade pacificada. Anunciadas desde 1º de março, alguns desses investimentos foram sendo apresentados a conta-gotas ao longo do mês.
O investimento mais alto é a construção de uma nova escola estadual na Vila Audi/União, com capacidade para 1,2 mil alunos. Em entrevista à Gazeta do Povo publicada em 3 de março, o secretário municipal de Planejamento e Gestão, Carlos Homero Giacomini, declarou que a intenção é usar estruturas e programas já existentes, mas que estavam subutilizados por causa da violência no bairro.
"Não tenho dúvidas que a UPS foi instalada na pressa. Nunca vi um projeto relacionado a ela", acentua Pedro Bodê, coordenador do Centro de Estudos em Segurança Pública e Direitos Humanos da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Enquanto isso, porém, o serviço público instalado no Uberaba passou a encontrar um clima mais favorável à sua atuação. Rose Pinheiro Lemes, coordenadora do Centro de Referência de Assistência Social (Cras), relata que o controle da criminalidade cria uma segurança maior para o apoio social às famílias. "Quando teve aquela chacina [em 2009], tivemos que parar o trabalho porque tinha toque de recolher. Ficávamos reféns da organização do crime", lembra. "Agora temos uma sensação de segurança, e isso é importante porque atendemos qualquer pessoa, independente de haver alguma suspeita contra ela".
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