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Mesmo com a redução do efetivo para 60 PMs, um mês depois da criação da primeira Unidade do Paraná Seguro moradores do Uberaba se sentem seguros nas ruas | Henry Milléo/Gazeta do Povo
Mesmo com a redução do efetivo para 60 PMs, um mês depois da criação da primeira Unidade do Paraná Seguro moradores do Uberaba se sentem seguros nas ruas| Foto: Henry Milléo/Gazeta do Povo

Percalços

Implantação da UPS no bairro Uberaba teve questionamentos e polêmicas. Veja o que ocorreu no último mês.

1 de março – Mais de 500 policiais, entre PM, Polícia Civil e Guarda Municipal, ocupam 12 vilas do Uberaba. A operação começou às 6 horas. Três pessoas foram presas.

2 de março – Em entrevista coletiva, o secretário de Segurança Pública do Paraná, Reinaldo de Almeida César, afirma que entre 20 e 25 cidades do estado terão UPS até 2014.

5 de março – Comissão da OAB denuncia caso de tortura cometido por policiais contra morador do Uberaba. Comando da PM reconhece falha e afasta dois soldados.

8 de março – Governador Beto Richa anuncia que Londrina receberá primeira UPS do interior, mas não aponta data.

9 de março – Equipe de ocupação permanente, composta por 60 policiais, entra em operação.

10 de março – Morador do Uberaba é morto a tiros em frente de casa. Foi o único homicídio registrado no mês.

11 de março – Gazeta do Povo publica entrevista em que o secretário Almeida César afirma não ter recurso para as ações de segurança. No dia seguinte, governo nega falta de verba.

21 de março – A família de Ismael da Conceição, vítima de tortura, anuncia que vai processar o Estado por violação dos direitos humanos.

Unidade ganha enfim um local como base fixa

No primeiro dia da UPS, banheiros químicos foram disponibilizados aos policiais da operação. Na segunda semana, os remanescentes foram obrigados a usar sanitários do comércio, o que gerou reclamações entre os soldados. No último dia 10, porém, o policiamento da UPS ganhou um lar à rua Zacarias Gomes de Souza, perto do Armazém da família do Uberaba.

Aos poucos, o imóvel começa a ganhar a cara de uma delegacia policial. Cedido pela prefeitura, a casa ampla de dois andares abrigava até o ano passado o Centro de Referência de Assistência Social (Cras). O novo refeitório dos PMs é composto por duas mesas: uma de plástico, outra de metal enferrujado coberto com uma toalha cuja estampa é o escudo da corporação. "Ainda não trouxemos tudo porque nos próximos dias será feita uma pintura", explica a tenente Caroline Costa, comandante da UPS do Uberaba.

Aos poucos, a população começa a reconhecer no local o ponto de contato com os responsáveis pela operação. Todos que os visitam preenchem uma ficha em que é descrita a solicitação. Vários apontam problemas como falta de luz e rompimento de esgoto. "As reclamações que não são da nossa alçada são repassadas para os órgãos competentes", diz a tenente.

Ela avalia que estão superados os dois momentos mais difíceis do primeiro mês de trabalho, quando o trabalho da PM foi severamente questionado. Dia 5 de março, a OAB apresentou denúncia de tortura cometida por policiais contra Ismael da Conceição, um pedreiro de 19 anos. Dois PMs que faziam parte do destacamento do Cajuru foram afastados. "A população sabe que não foram policiais da UPS, e reconhece a diferença", afirma.

Dia 10 de março, um homem foi morto a tiros na Vila Icaraí, que faz parte da área de proteção. "Foi o nosso primeiro dia de atuação [os policiais da 1ª fase haviam sido substituídos pelo grupamento permanente]. Era um caso que já vinha se desenvolvendo há algum tempo, e essa pessoa tinha envolvimento com a criminalidade", pondera.

É comum ouvir relatos de supostos abusos policiais, que passaram a ganhar ainda mais peso após o caso Ismael. "Não toleramos esse comportamento. Todo funcionário público precisa ser fiscalizado", ressalta a tenente. Ainda não houve caso de policiais da UPS afastados por má-conduta.

  • Servino se queixa das ruas de terra em dias de chuva

Com quantas pessoas se faz uma UPS? Desde o dia 1.º do mês passado, quando 515 policiais ocuparam 12 comunidades do bairro Uberaba, em Curitiba, as formas de tentar medir o sucesso dessa operação têm se alternado. Nenhuma delas, porém, foi capaz de apontar se o projeto caminha para o sucesso ou para a morte por inanição. O efetivo do primeiro dia foi cortado à décima parte, e hoje 60 policiais se revezam no patrulhamento da região. Mas os homicídios também caíram. Era um por semana, ao menos até janeiro passado, segundo dados da Polícia Civil. Em março, depois da UPS, foi registrada apenas uma ocorrência com morte.

As múltiplas ações sociais prometidas por governo estadual e prefeitura ainda não apareceram, mas os serviços públicos instalados anteriormente agora podem operar sem controle externo ou represálias. Um mês depois do empurrão inicial, os resultados começam a aparecer sobretudo em áreas fora do poder de mensuração das planilhas e gráficos. A Unidade do Paraná Seguro é uma obra em progresso.

Mudança de hábito

O visitante de fora mal percebe a diferença ao trafegar pelas quadras sempre movimentadas do Uberaba. A vida comunitária apenas ganhou intensidade em um dos poucos lugares de Curitiba em que o pedestre é a força dominante, e onde o fator medo nunca esteve tão em baixa. Pessoas como Anaísa Maria da Conceição, proprietária de uma mercearia na Vila Audi/União, deixaram de prestar atenção em grupinhos parados na esquina. "Antes tinha que fechar assim que começava a escurecer. Agora dá para trabalhar até mais tarde", diz a mulher de 48 anos.

O representante comer­­cial Anadir Ribeiro Barbosa, que havia acabado de chegar para entregar uma remessa de cartões telefônicos, ensaia uma explicação para o alívio na tensão psicológica: "É só pôr a farda na rua que o pessoal mal-intencionado foge. A presença da polícia assusta", avalia ele, que costumava visitar os clientes em dias e horários diferentes para despistar possíveis assaltantes. "Eles parecem cair de paraquedas. Aparecem do nada já com a arma na mão", descreve.

Mais além

O Uberaba é uma amostra clara de que em uma comunidade com múltiplas carências, a satisfação por ter um problema resolvido é rapidamente afogada pelos novos desafios. O catador de papel Servino Fernandes dos Santos, de 68 anos, responde a uma pergunta sobre a presença dos policiais descrevendo a situação da rua de terra em dias de chuva. O mesmo problema já havia sido apontado por Anaísa, que mora algumas quadras acima.

Lindomar Boneti, professor de Sociologia na Pon­­tifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), lembra que o Estado somente é capaz de conquistar um espaço a partir da união de forças capazes de promover a cidadania. "A retomada do Uberaba ocorrerá quando o controle policial estiver associado a investimentos sociais. É necessário bastante tempo para que isso seja implantado, mas, pelo que percebo, pouco tem sido feito até agora", analisa.

Aos poucos, as novas demandas dessa comunidade ganharão corpo até se transformar em consenso. A estudante da 7ª série Aline Pertile, de 12 anos, é um exemplo do novo Uberaba que surge. Quase todos os dias, ela tem a responsabilidade de levar os irmãos menores, primos e sobrinho para a escola. Seus gestos e forma de falar simulam os de um adulto. Ela diz estar satisfeita com a presença da polícia, mas clama mais atenção à escola. "Roubaram computador e micro-ondas. Precisa melhorar a segurança lá", sugere.

Novas políticas públicas são uma incógnita

Um mês após o início da Unidade do Paraná Seguro (UPS), governo estadual e prefeitura ainda não divulgaram em detalhes quais serão as políticas públicas a ser desenvolvidas na comunidade pacificada. Anunciadas desde 1º de março, alguns desses investimentos foram sendo apresentados a conta-gotas ao longo do mês.

O investimento mais alto é a construção de uma nova escola estadual na Vila Audi/União, com capacidade para 1,2 mil alunos. Em entrevista à Gazeta do Povo publicada em 3 de março, o secretário municipal de Planejamento e Gestão, Carlos Homero Giacomini, declarou que a intenção é usar estruturas e programas já existentes, mas que estavam subutilizados por causa da violência no bairro.

"Não tenho dúvidas que a UPS foi instalada na pressa. Nunca vi um projeto relacionado a ela", acentua Pedro Bodê, coordenador do Centro de Estudos em Segurança Pública e Direitos Humanos da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Enquanto isso, porém, o serviço público instalado no Uberaba passou a encontrar um clima mais favorável à sua atuação. Rose Pinheiro Lemes, coordenadora do Centro de Referência de Assistência Social (Cras), relata que o controle da criminalidade cria uma segurança maior para o apoio social às famílias. "Quando teve aquela chacina [em 2009], tivemos que parar o trabalho porque tinha toque de recolher. Ficávamos reféns da organização do crime", lembra. "Agora temos uma sensação de segurança, e isso é importante porque atendemos qualquer pessoa, independente de haver alguma suspeita contra ela".

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