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Em 1976, o hoje escritor Paulo Venturelli andava às voltas com seu primeiro livro de poesia quando, em meio a uma chuvarada, cortou caminho pela Rua Luiz Leão, no Centro de Curitiba, e viu um menino ensopado, encolhido num canto. Esse encontro modificaria sua vida. O garoto, então entre 7 e 8 anos, foi adotado por um Paulo bastante assustado. Ganhou o nome de Gigio – numa homenagem a um ícone da infância da década de 60, o ratinho de brinquedo Toppo Gigio.

Venturelli fazia o tipo hippie, morava na Casa do Estudante Universitário (CEU), trabalhava à noite num centro de processamento de dados e, para ajudar, estava decidido a rejeitar todos os códigos burgueses – como casa, casamento "e até mobília". Mas com Gigio para criar não poderia seguir os planos à risca. Quando o garoto começou a lhe dar trabalho, bem que tentou deixá-lo na casa da família, mas ele voltava, como gato. Foi caminho sem volta, formando uma daquelas histórias dignas de serem contadas num filme de Natal.

"Eu tinha uma ideologia. Era de esquerda. Queria provar ser possível recuperar uma criança que viveu na rua e experimentou o abandono", lembra Paulo bem na frente da confirmação de que estava certo. Hoje, Gigio é antes de tudo um homem livre. Há poucos meses, tocava cavaquinho na Europa e esteve na África como voluntário da Cruz Vermelha Internacional. De volta à cidade, retomou suas atividades na Fundação Cultural de Curitiba. Músico, dançarino, cinéfilo, já deu aulas de cinema para crianças da periferia e hoje trabalha com musicalização na Casa Hoffmann. "Nem é preciso dizer o quanto o Paulo é importante para mim."

Tão importante que Gigio abdicou de suas andanças na Europa para ficar junto do pai e da mãe, Líbera – com quem Venturelli se casou cinco anos depois da adoção. Nada mais natural. Às voltas com problemas de saúde, Paulo precisa mais do que nunca da família. O filho – que também é esportista – já o mandou se despedir dos remédios e adotar a caminhada como estilo de vida. Sem chance. A última estratégia é provocar no pai um sonho de viagem. Gigio – tão falante quanto o garoto que Paulo encontrou na chuva – quer levá-lo a um dos três lugares que cresceu ouvindo falar: Rússia, Cuba ou os kibutz de Israel. "Vamos juntos?", pergunta.

Não agora – Paulo está bem confortável, na poltrona, às voltas com o episódio mais marcante de toda sua vida. Lembra de ter escondido Gigio na CEU, com a ajuda do hoje vice-governador Orlando Pessuti. Dos amigos que tentaram demovê-lo da idéia da adoção – mas que quebraram muitos galhos abrigando o garoto. E principalmente do primeiro livro infanto-juvenil que escreveu, Admirável ovo novo, inspirado em Gigio. O garoto uma vez lhe disse que não via a hora de ficar adulto como o pai e ter tudo resolvido. Paulo encasquetou com aquilo. Em resposta, escreveu uma história para falar de que as dúvidas permanecem e que cada ovo é um ovo novo, não importa quando.

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